quarta-feira, 13 de abril de 2022

A felicidade não se compra

Esse é o título em português do filme de Frank Capra “It’s a wonderful life”, obra que consolida o cinema como capaz de competir com a melhor literatura. Capra confessa em sua autobiografia, “The name above the title” (“O nome acima do título”), que investiu nele “tudo o que era e tudo o que sabia”.

No fim da Segunda Guerra Mundial — ele serviu no Departamento de Propaganda —, Capra estava afastado do ambiente ultracompetitivo de Holywood e, perto dos 50 anos, apostou na história “The greatest gift” (“O maior presente”), um conto de Van Doren Stern inspirado num sonho e, em 1943, rejeitado por revistas e divulgado pelo autor em 200 cartões de Natal. Foi assim que virou filme a história do pai de família quebrado, como muitos neste Brasil de 2022, que tenta se matar, mas a quem um anjo, enviado pelas preces dos seus entes queridos, realiza o milagre de fazer ver a falta que sua existência faria caso não tivesse nascido e vivido — nosso maior presente.


O filme é enquadrado pela visão americana do Natal, mas vai muito além. É, sobretudo, uma crítica aos dois lados do capitalismo. O do banqueiro egoísta, preso a uma cadeira de rodas, símbolo da mais-valia de todos os que amam o poder pelo poder; e a do herói, herdeiro sem querer de uma frágil cooperativa que socializa o dinheiro financiando casas para trabalhadores e imigrantes (Capra foi um imigrante paupérrimo). A cooperativa opera como nossos “bancos de habitação”, sempre canibalizados pelos populismos de direita e esquerda.

O filme também especula sobre um intrigante problema filosófico. A questão de ver o mundo em que se viveu sem nele ter nascido. Um exercício que, inconscientemente, praticamos. Um olhar duplo. No primeiro, o real; no segundo (graças ao milagre da imaginação), as mesmas pessoas, mas sem nossa presença. Essa possibilidade de assistir a uma impossível saída da vida que vivemos é a melhor prova do poder do cinema que jamais vi no cinema. Seu clímax ocorre quando o herói — prestes a se suicidar — revê milagrosamente sua existência e a implora de volta. Precisamente porque compreende que todos somos fabricados por sofrimentos e dificuldades.

É quando Capra prova quanto tocamos em inúmeras outras vidas. “A felicidade não se compra” é um filme revelador de que ser é melhor do que ter.

O que tem isso a ver com “nosso Brasil”, em plena ebulição de venda de felicidade eleitoral, em que, nós, pessoas comuns, somos obrigados a ver, ouvir e eventualmente “comprar” uma entrada (ou voto) nesse filme de politicagem, encontros e desencontros que tipificam essas transições de poder político e institucional?

Arrisco-me a dizer que o filme é um contraponto a essa busca eleitoreira obviamente marcada pela falsidade, porque ilusória e repetitiva, em que vidas duplicadas e contrárias a seus propalados ideais polarizam-se como resultado de um populismo estrutural que só pode levar à insinceridade e ao engodo — um autoengano.

Vejam os heróis-candidatos e como eles retornam a suas “primeiras” vidas, tentando refilmá-las como se elas fossem coerentes com o que fizeram e fazem numa viagem de cinema... Pois, tanto de um lado quanto do outro, houve uma cilada em colocar em prática os ideais que pregavam e prometiam praticar.

Aliás, eles não se opõem, mas se completam, pois, sem a corrupção lulopetista, não haveria nenhuma chance para esse bolsonarismo, cujas marcas são a confusão, a violência, o caos e a negação.

Filme é filme, realidade é realidade. Mas existem princípios morais que comandam a prática política? Ou só vale fazer tudo para ganhar e “tomar o poder”? Há coerência na vida social, ou somos todos tão presos a nossos interesses quanto os candidatos que — sem dúvida e com as devidas, mas cada vez mais raras, exceções — se aventuram a disputar papéis muito acima de seus talentos?

Pensamento do Dia

 


Bolsonaro consagra o cinismo na política

É difícil ser humano. Estamos meio que condenados a nos equilibrar precariamente entre o apego a princípios e os imperativos da realidade. Se tratamos tudo como um embate moral, o risco é nos tornarmos fanáticos, daqueles que punem o menor deslize com a fogueira. Se consideramos que tudo é negociável, o perigo é nos convertermos em cínicos, daqueles que pregam o relativismo absoluto.

É difícil aqui fugir ao conselho, algo acaciano, de Aristóteles, segundo o qual a virtude está no meio. Não podemos nem ser tão moralistas que não consigamos construir soluções negociadas, nem tão relativistas que não reconheçamos qualquer hierarquia nos valores. O Brasil vem fracassando miseravelmente nessa busca pelo equilíbrio.


Jair Bolsonaro jamais deveria ter sido eleito presidente. O fato de isso ter ocorrido, porém, faz parte dos riscos inafastáveis da democracia. De vez em quando, o eleitorado elege um completo despreparado. Tem até algum efeito didático, já que ensina que, embora votos individuais tenham peso irrisório num pleito, as escolhas coletivas fazem enorme diferença.

Nossa grande falha moral foi não ter submetido Bolsonaro a um impeachment, mesmo depois de ele ter jogado contra o país na pandemia e ter repetidamente ameaçado as instituições. Separadas, cada uma dessas situações já teria justificado a destituição; juntas, num universo decente, elas a tornariam obrigatória. O Congresso, porém, preferiu fechar os olhos para as transgressões do presidente.

Apesar disso, minorias de parlamentares ainda conseguiam esboçar algum tipo de reação. Vimos isso na CPI da Covid. Mas, agora que Bolsonaro se deu para o centrão, a minoria não consegue mais nem criar uma CPI. Assinaturas são, sabe-se lá por quais mecanismos, retiradas. E Bolsonaro ainda mostra fôlego nas pesquisas. Definitivamente, estamos nos tornando um país de cínicos, daqueles que sabem o preço de tudo e o valor de nada.

Democracias sob ameaça

O mundo tem assistido, nos últimos dias, a um verdadeiro assassinato de um país, uma nação, um povo e uma democracia. O responsável é outro país, autocrata, chefiado por um aspirante a ditador, que governa com mãos de ferro há mais de 20 anos, com interesses dos mais espúrios existentes. Vladimir Putin invadiu a Ucrânia e vem destruindo o país, que levará décadas para se reconstruir e gastará bilhões de dólares para isso; porém nada pagará as vidas perdidas. Isso é incalculável.

Na mesma toada da invasão, Putin ameaçou outros países que fazem fronteira com a Rússia e a Ucrânia, caso aderissem à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) ou interferissem na guerra. Ele ameaça também cortar o fornecimento de gás para a União Europeia. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, não se via uma escalada tão grande do perigo de uma grande guerra, incluindo a possibilidade do uso de armas nucleares por parte da Rússia.

A Ucrânia sofreu muito no século passado e vinha tentando se recuperar, após retomar sua independência em 1991, com o fim da União Soviética. O regime ditatorial soviético foi o responsável por duas grandes tragédias no país: o Holodomor matou de fome milhões de ucranianos entre 1932 e 1933. Em 1986, houve o acidente nuclear de Chernobyl — até hoje não se sabe ao certo o tamanho dos estragos ambientais e o número de vítimas. Após vivenciar tudo isso no século passado, o país vinha tentando se reerguer, mas sofre com o assédio de Putin desde 2014, quando houve a invasão da Crimeia, que segue até hoje sob o domínio russo.


Nós, do movimento Democracia sem Fronteiras, desde 2019 chamamos a atenção para as graves ameaças que as democracias vêm sofrendo no mundo. Diversos países retrocederam nas liberdades individuais, religiosas, de imprensa e nos direitos humanos. A Rússia é uma das grandes responsáveis por essas violações. As sanções aplicadas pelos outros países, acertadamente, tentam resolver por via econômica e diplomática a guerra. Acreditamos que elas deveriam se estender aos demais países que hoje violam direitos.

Além da guerra na Ucrânia, temos conflitos na Síria, no Iêmen, no Iraque, no Afeganistão, na Nigéria e em diversas outras partes do mundo. São centenas de milhares de vidas perdidas nesses conflitos, milhões que deixam suas casas para fugir de bombardeios. Sem contar os outros milhões que vivem sob os regimes autoritários. Diante de tudo isso, nos perguntamos: nossas democracias estão em perigo? Estamos seguros? Parece que não. Um conflito dessa magnitude no coração do “mundo civilizado” (Europa) era imaginado?

Devemos ficar vigilantes contra as violações à democracia, às liberdades de imprensa e religiosa e aos direitos humanos e contra o perigo de guerras. Nosso movimento busca chamar a atenção do Brasil e do mundo para isso com ações constantes.

Bolsonaro, um presidente que merece ser mais bem compreendido

Empatia, segundo os dicionários, “é a capacidade psicológica de sentir o que sentiria outra pessoa, caso estivesse na mesma situação vivenciada por ela. É tentar compreender sentimentos e emoções, procurando experimentar o que sente outro indivíduo”.

De Jair Messias Bolsonaro, o 38º presidente do Brasil, diz-se que carece de empatia, e é verdade. Mas para compreender melhor o seu comportamento em determinadas circunstâncias e a forma como toma decisões, é preciso pôr-se no lugar dele.

Por que quando a mancha da corrupção espalha-se por seu governo, Bolsonaro insiste em dizer que o seu é o governo mais honesto da história? Porque acredita nisso, como acredita que empregar funcionários fantasmas em gabinetes é só um pecadilho.

Nem pecadilho seria. Qual o parlamentar que não se valeu do mesmo expediente, ele pergunta. Pergunta, não, pensa. Pecadilho ou pecado deixa de sê-lo se a prática se generaliza. De resto, depois de Deus vem a família, e custa caro provê-la de tudo.


Foi por isso que ainda soldado, e à revelia dos seus superiores, Bolsonaro foi garimpar. Descoberto, foi repreendido. Começava ali a curta carreira daquele que mais tarde seria chamado de um “mal militar” pelo general e ex-presidente Ernesto Geisel.

Bolsonaro destacou-se nos quartéis como um bom corredor de curtas distâncias. Ganhou o apelido de “Cavalão”. Foi elogiado por ter salvado um amigo de morrer afogado. Mas foi por causa do dinheiro curto que ele planejou detonar bombas em quartéis.

Não queria mais dinheiro para si, mas também para seus companheiros de caserna. Acabou excluído do Exército por conduta antiética, coisa que até hoje não consegue entender o que seja. E, para sobreviver, entrou na política. Foi um início difícil.

Elegeu-se vereador no Rio e, em seguida, deputado federal. Foi proibido de frequentar ambientes militares. A punição estendeu-se aos seus filhos. As portas dos colégios militares se fecharam para eles. Por quase 30 anos, foi deputado do baixo clero.

Trocou de partido oito vezes, sempre à procura de algum protagonismo que jamais alcançou, e de vantagens materiais. O que mais se leva da vida, ou se deixa para os filhos? Não foi tão feliz como desejou nos seus casamentos. Traiu e foi traído.

Até que um dia, decidiu bater em retirada da Câmara e desfrutar da pequena fortuna que acumulara. Desejava curtir a nova mulher, Michelle, que lhe dera uma filha. Seu último ato, para alavancar a carreira política dos filhos, seria se candidatar a presidente.

Não contava em se eleger. Tampouco seus colegas na Câmara imaginavam que ele se elegeria. Na noite de sua vitória no segundo turno, depois de ter sido anfitrião de um churrasco em sua casa no Rio e de ter visto os convidados irem embora, chorou muito.

Sabia que não estava pronto para governar, que não tinha com quem governar, que sequer soubera governar seus gabinetes e a própria família repleta de conflitos. Como todas as famílias, não só a dele. Governar é ouvir, compor, tomar decisões e ir em frente.

Ora, isso não se aprende em quartéis. Por lá, aprende-se a dar ordens e a obedecer. Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Ele nunca teve a oportunidade de dar ordens e foi desobediente para além do tolerável. Nunca foi treinado para o diálogo.

Cercou-se de oficiais para governar porque os conhecia e conhecia seus códigos. Montou um ministério medíocre, com poucas exceções, porque sempre foi um homem medíocre, e ainda por cima desconfiado dos que são muito inteligentes.

Saudoso da ditadura de 64 de que ouvira falar, sem nunca ter lido um livro, nem mesmo o de memórias do torturador Brilhante Ulstra, pobre de ideias além das que lhe sopram, foi surpreendido por uma pandemia que só aqui matou mais de 650 mil pessoas.

Se Paulo Guedes lhe dizia que o importante era salvar a economia para salvar o governo, por que Bolsonaro não lhe daria ouvidos? Se médicos farsantes recomendavam drogas ineficazes contra o vírus, quem era ele para não acreditar? Era o que queria ouvir.

Essa talvez seja a pior doença de que possa padecer um governante: acreditar só naquilo que reforça suas impressões, certas ou erradas. Poucos ousam dizer-lhe a verdade. Poucos ousam contrariá-lo. Os que o contrariam são dispensados.

Notável é que o pior presidente da história do Brasil, que faz o pior governo da história, chega ao fim do mandato com chances de se reeleger. O que explica? Bolsonaro espelha um país conservador por natureza, socialmente injusto e onde o futuro nunca chega.

Em qual político citado abaixo você votaria?

Com a proximidade das eleições, vale pedir ao leitor um exercício: votar em um dos três candidatos cujos perfis estão resumidos abaixo.

O primeiro teve poliomielite e demonstra dificuldade para caminhar, é hipertenso e anêmico, mente quando lhe convém e consulta astrólogos sobre política. Fuma muito e trai a mulher.

O segundo tem sobrepeso, pressão alta, já sofreu dois ataques cardíacos e perdeu três eleições. É difícil trabalhar ao lado dele, porque fuma charutos sem parar. Toda noite toma champanhe, vinho ou uísque e dois calmantes para dormir.

O terceiro é um cabo herói de guerra condecorado que trata bem as mulheres, ama animais, não fuma e só bebe uma cerveja em ocasiões especiais.

Esse exercício de voto foi feito a seus alunos pelo professor Martin, interpretado pelo ator dinamarquês Mads Mikkelsen, no filme “Druk - Mais uma Rodada”, Oscar de melhor filme internacional em 2021. E qual dos três candidatos foi escolhido pelos alunos? Todos disseram que votariam no terceiro. Aí o professor Martin revelou os nomes dos candidatos.

O primeiro nome é do presidente dos EUA entre 1933 e 1945, Franklin Roosevelt, que tirou o país da “grande depressão” e o conduziu à vitória na Segunda Guerra Mundial.

O segundo é Winston Churchill, estadista britânico, um dos políticos mais importantes da história do Reino Unido, prêmio Nobel de Literatura em 1953 pela monumental obra “Memórias da Segunda Guerra Mundial”. Foi o artífice europeu da vitória aliada na guerra.

O terceiro é Adolf Hitler, o líder nazista que levou à morte 60 milhões de pessoas na Segunda Guerra Mundial e que dispensa mais apresentações.

O filme, dirigido pelo dinamarquês Thomas Vinterberg, é polêmico, porque defende, no início, uma teoria que passa longe do “politicamente correto”: manter um nível constante de álcool no sangue melhora a vida e o desempenho das pessoas. Ao longo do filme, porém, os quatro professores que aderiram à prática percebem que nem tudo é tão simples.

O exercício do professor Martin indica o quão difícil é escolher políticos com base em perfis superficiais. Os brasileiros já cometeram vários erros na escolha de presidentes, elegendo incompetentes ou antidemocráticos. De tempos em tempos, um “salvador da pátria”, geralmente com promessas de eliminar a corrupção, é galgado ao comando o país.


Getúlio Vargas, mesmo após ter sido ditador durante 15 anos, assumiu em 1951 pelo voto e não suportou pressões políticas e acusações de corrupção: suicidou-se em agosto de 1954.

Jânio Quadros encantou o país com sua vassourinha mágica que iria “varrer a bandalheira” e suas falsas caspas no paletó. Renunciou em 1961 por incompetência política, depois de seis meses no cargo e abriu espaço para a posse do vice João Goulart e para o golpe militar que imporia ditadura de 20 anos ao país.

Fernando Collor, desconhecido governador de Alagoas, ganhou o voto popular com suas promessas de caça aos marajás, assumiu em 1990 e sofreu impeachment em 1992, acusado de corrupção.

Dilma Rousseff, reeleita em 2014, também foi afastada em 2016, sob a acusação de irresponsabilidade fiscal (para a esquerda, foi um golpe parlamentar).

Jair Bolsonaro foi eleito em 2018, em meio à avalanche anticorrupção da Lava-Jato. Hoje, segundo pesquisa Datafolha, é rejeitado por 55% dos eleitores. Só no período da pandemia foi acusado de cometer nove crimes por CPI do Senado. Permanece no cargo amparado pelas muralhas da PGR e da presidência da Câmara. Vai tentar a reeleição.

As escolhas equivocadas são um risco inerente à democracia, muito menor, certamente, do que o das autocracias ou ditaduras. As experiências eleitorais brasileiras recentes mostram que erros ocorrem mesmo em casos de candidatos que já tenham exercido cargos executivos. Jânio Quadros e Fernando Collor, por exemplo, haviam sido governadores, mas não tinham maturidade política para ocupar a Presidência. Comportamentos aparentemente conservadores ou progressistas, “politicamente corretos”, não garantem que o candidato venha a ser um bom gestor e, principalmente, um comandante inflexível no comprometimento com a democracia e com a busca do bem-estar dos cidadãos.

Propostas e comportamentos antidemocráticos do passado não podem ser relevados pelo eleitor com desculpa ou esperança de que o candidato mudará de ideia depois de eleito. “De onde menos se espera, daí é que não sai nada”, já ironizava o Barão de Itararé.

Promessas milagrosas, obviamente, nunca são cumpridas. Populistas radicais, à direita e à esquerda, que vendem rigorosa austeridade fiscal (“é proibido gastar”) ou impagáveis benesses sociais, em geral cometem estelionato eleitoral. E centristas “em cima do muro” tendem a ser inoperantes.

Quem ainda sonha com a eleição de um “salvador da pátria”, da primeira, segunda ou terceira via, poderia refletir um pouco sobre o exercício do professor Martin e sobre a surrada frase de Churchill, em 14 de maio de 1940, em plena Segunda Guerra, quando pediu à Câmara dos Comuns um voto de confiança a seu governo: “Nada tenho a oferecer senão sangue, trabalho, suor e lágrimas.”

Essas quatro coisas fazem muita falta ao Brasil e foram escassas nos últimos anos, especialmente as lágrimas governamentais durante a pandemia. O problema não é polarização, mas qualidade e compaixão dos que ocupam os polos.

Saneamento e democracia

Já que estamos juntando cenas de cinema a escolhas democráticas, é oportuno lembrar uma passagem do “Tigre Branco”, filme indiano do diretor Ramin Bahrani, lançado em 2021. Um motorista do interior do país, narrador e protagonista do filme, a certa altura diz: “Se eu governasse a Índia, faria primeiro o saneamento básico e depois a democracia”. É possível entender a opção do motorista, porque a Índia, a maior democracia do mundo, tem deficiências assustadoras na área de saneamento básico.

A Índia, porém, tem uma sociedade considerada cruel principalmente por causa do sistema de castas, não oficial, que na prática impede a ascensão social de grande parte de sua população. Mas não há dúvida de que, com 1,3 bilhão de habitantes, a situação do saneamento seria ainda pior sob ditaduras ou autocracia.