quarta-feira, 8 de maio de 2019

Brasil vermelho de novo


Fardados caem na armadilha que montaram

O imbróglio envolvendo os militares e a ala ideológica do governo Jair Bolsonaro retrata à perfeição a armadilha na qual as Forças Armadas caíram ao associarem-se ao capitão reformado.

Mesmo sem fazer campanha aberta ou sustentar a campanha, como a esquerda diz ter ocorrido, as Forças Armadas se viram irrefutavelmente ligadas ao então polêmico presidenciável.

Menos pela origem militar de Bolsonaro, que deixou o Exército com fama de indisciplinado, e mais pela crescente aproximação entre ele e os fardados de 2017 em frente.


Naquele ano, generais e outros oficiais da reserva, comandos por Augusto Heleno, abraçaram a candidatura. Previram com razão que ocupariam espaços importantes na administração, estruturaram ações de governo.

Até aí, é o que acontece em sociedades mais avançadas, como os Estados Unidos, onde quadros qualificados trocam fardas por roupas civis sem grandes constrangimentos.

As forças da ativa mantiveram uma distância desconfiada do movimento, temendo perder o capital de confiabilidade que amealharam após anos do que consideram humilhação pública durante a redemocratização pós-1985.

Quando ficou claro que Bolsonaro era a alternativa viável contra o PT, partido que se afastou dos militares após decisões desastrosas durante o governo Dilma Rousseff, a ativa obviamente não fez campanha, mas consolidou a bênção a Bolsonaro.

O capitão rebelde dos anos 1980 estava reabilitado, ainda que mesmo após a eleição comentários sobre sua falta de preparo como risco à imagem da instituição tomaram corpo. Foram enfim vocalizados em uma entrevista à Folha em novembro de 2018 pelo general Eduardo Villas Bôas, o então comandante do Exército.

Ali Villas Bôas tentou colocar uma linha separando as Forças do governo Bolsonaro. Tentou, pois mesmo lá já admitia a associação inevitável. Como ele disse ao jornal O Estado de S. Paulo nesta terça (7): a fatura de uma má gestão cairá no colo dos militares, ainda que em parte.

Começa o governo e o espraiamento dos fardados se dá como previsto. O antes contestado Hamilton Mourão acabou tornando-se um norte na cadeira de vice, por ser indemissível, embora ainda seja visto com reservas por oficiais das três Forças.

E formou-se a famosa ala militar, que na verdade são várias, inclusive aí a poderosa ativa encarnada em sua instância mais forte, o Alto Comando do Exército. Heleno sempre reclama do termo porque ele mesmo é uma ala em si, trabalhando de forma a mediar conflitos.

O insondável para os militares era o poder da ala ideológica —ou antiestablishment, como a nomeou o assessor de Bolsonaro Filipe Martins.

Ela tem no governo o Itamaraty e o Ministério da Educação, mas sua força real reside em 2 dos 3 filhos políticos do presidente, o deputado Eduardo e o vereador Carlos.

E eles fizeram emergir o escritor Olavo de Carvalho, que da relativa obscuridade de seu retiro norte-americano foi alçado com as conhecidas táticas de guerrilha digital capitaneadas por Carlos ao posto de antagonista-mor dos militares em torno de Bolsonaro.

O vereador carioca fez sua parte no conflito, mirando especificamente Mourão, a quem acusa de ser um traidor à espera da hora de agir. Enquanto isso, Olavo fazia suas diatribes em rede social, irritando fardados e os fazendo cobrar o presidente por algum tipo de enquadramento do escritor e de seu filho.

Não conseguiram nada além de uma nota lida pelo general porta-voz de Bolsonaro, que ainda assim só reclamava levemente de Olavo. Nada sobre o filho. A crise só se agravou, culminando com a volta de Villas Bôas, dando um recado duro contra o escritor —que era direcionado, ao fim, ao grupo da família presidencial.

Bolsonaro deu de ombros e, no Twitter, defendeu Olavo na manhã desta terça. Fez o mesmo à tarde. O escritor, nesse sentido, virou um espantalho útil: incomoda os militares sem obrigá-los a criticar os filhos do presidente, se não ele próprio.

O ponto mais nevrálgico é a política externa, na qual os militares já intervieram para evitar que o alinhamento ao governo de Donald Trump faça maiores estragos.

Ainda assim, com limites: na véspera do último capítulo da crise venezuelana, o chanceler indicado por Olavo esteve em consultas com seus amigos em Washington.

Pela natureza destrutiva desse núcleo duro do bolsonarismo, retroalimentada por estratégias em redes sociais, restou a oficiais da ativa demonstrarem desconforto com a presença no governo que abraçaram.

Alguns falam que os nomes da reserva deviam deixar o governo, proposição antes impensável e que abriria a "fatura" citada por Villas Bôas.

Os caminhos para os fardados hoje são essa ruptura, um acordo patrocinado por Bolsonaro com os ideológicos ou aceitar que são vistos como adversários pelo círculo íntimo do presidente.

Populistas matam democracia

Todos os populistas afirmam que a razão de nossos problemas é uma elite política corrupta que não se importa com o povo. Eles se apresentam como os únicos representantes morais do povo. Dizem que, se eleitos, trarão soluções, porque compartilham do bom senso do homem comum. Populistas são perigosos porque para eles a discordância política não faz parte da normalidade democrática, mas é um indício de corrupção moral.

Quem discorda do populista é inimigo do povo. Toda oposição é traidora. Tribunais independentes são golpistas. No fim, Trump, Orbán, Chávez e Bolsonaro são surpreendentemente parecidos. Populistas, de esquerda e de direita, danificam a democracia 
Yascha Mounk cientista político alemão  autor de O povo contra a democracia: por que nossa liberdade corre perigo e como salvá-la 

Decreto do porte de arma que Bolsonaro baixou é ridiculamente inconstitucional

Em sua alocução-relâmpago na tarde desta terça-feira, o presidente Jair Bolsonaro, sempre com o seu feroz tom de voz e ritmo oratório como se estivesse se dirigindo a uma tropa de comandados seus, comentou, superficialmente, sobre o decreto que assinou sobre porte de armas de fogo e que somente hoje, quarta-feira, seria publicado no Diário Oficial da União.

Sem tornar público o texto do decreto, nem qual o seu número, Bolsonaro fez questão de enfatizar que “tudo foi feito no limite da lei”. E falou e repetiu tanto sobre o “limite da lei” (ele se reportava, embora sem dizer, ao Estatuto do Desarmamento, Lei nº 10.826, de 22/12/2003) que a insistência levantou suspeita e uma indagação: teria sido mesmo “no limite da lei”?

 Sim, porque decreto “como ato administrativo, está sempre em situação inferior à lei e, por isso mesmo, não a pode contrariar, a ela nada acrescentar e serve apenas para regulamentá-la”, como ensina Hely Lopes Meirelles (“Direito Administrativo Brasileiro”, página 162, 19ª edição, Malheiros Editores).

E a suspeita era procedente. “No limite da lei” coisa nenhuma. Lá está no Diário Oficial, edição desta qu,arta-feira, a íntegra do Decreto nº 9.785 de 7 de Maio de 2019. Quase tudo está fora “do limite da lei”. A começar que este tal decreto, que diz que “regulamenta a Lei nº 10.826, de 22.12.2003…”, contém 67 artigos. Isso mesmo, 67 artigos, quase o dobro dos artigos da lei que o decreto diz que “regulamenta”, e que somam apenas 37 artigos! E são inúmeras as inovações e situações que o decreto acrescentou para o porte de arma e que não estão contempladas pelo Estatuto do Desarmamento.

Inovou, portanto. Legislou, sem dúvida. Praticamente, criou, por decreto, um novo Estatuto do Desarmamento. Se este tal decreto for levado ao Judiciário para aferir sua constitucionalidade, muitos artigos serão considerados em acréscimo à lei, e, portanto, declarados inconstitucionais.

Não há espaço aqui neste artigo para abordar todas as ilegalidades que mancham o decreto, porque são muitas. Vamos apenas mostrar estas que mais chamam a atenção e que absolutamente não estão “no limite da lei”.

No Capítulo IV, que trata “Do porte de Arma de Fogo”, dentre muitos homens e mulheres que doravante podem portar arma de fogo, está a pessoa “que exerça a profissão de advogado” ( artigo 20. parágrafo 3º, letra “h” )!. E ainda: quem for “profissional de imprensa que atue na cobertura policial” (item VI)!. Tem mais: quem seja “conselheiro tutelar (item VII)”, e ainda “motoristas de empresas e transportadores autônomos de cargas”(item IX)!

Mas o que é isso, Bolsonaro? O senhor está muito mal assessorado. Parece estar cercado de leigos na ciência do Direito. O despreparo para governar não é só individual. É coletivo, também. A Lei nº 10.826 (Estatuto do Desarmamento), no Capítulo III que trata “Do Porte” é rígida, exaustiva (que não admite acréscimo ou exclusão) e não contempla os que exercem aquelas profissões que o seu decreto acrescentou, sem forma e sem figura de lei;

Nem aquelas nem muitas outras que este artigo não encontra espaço para comentar. Seu decreto não regulamenta a lei. Seu decreto altera substancialmente a lei. E tanto, por não ser permitido, é absolutamente inconstitucional. Agora, após ter sido tornado público com a publicação no Diário Oficial da União, se constata porque o senhor foi tão evasivo nesta terça-feira, quando ao lado de Paulo Guedes, falou rápida e sincopadamente, sobre o tal decreto, enfatizando que o mesmo foi baixado “no limite da lei”.

Sr. Presidente, o senhor poderia mexer em todo o Estatuto do Desarmamento. Para isso bastava lançar mão de Medida Provisória, caso não optasse pelo projeto de lei alterando o Estatuto do Desarmamento. Por decreto, jamais, senhor presidente.

Os dois Brasis

A reforma da Previdência tem se mostrado o principal prisma por meio do qual se observa a economia brasileira. Se for aprovada sem grande desidratação, significará que o Brasil vai prosperar e entrar num rumo virtuoso em direção ao crescimento e ao emprego.

É luz no fim do túnel capaz de iluminar os caminhos de uma trajetória fiscal mais sadia. Ao menos, é esse o esperado.

Ocorre que o túnel pode desmoronar antes que se alcance a luz — custe ela R$ 1 trilhão, 800 bilhões ou 600 bilhões. É o que mostram três indicadores econômicos divulgados nos últimos dias. O do emprego, o da produção industrial e o da confiança.


No caso do emprego, não é o número de desempregados que é o mais alarmante. É verdade que o desemprego no Brasil cresce ininterruptamente desde 2014. Mas é sazonal que a taxa de desemprego seja alta nos três primeiros meses do ano. Isso se deve ao encerramento dos contratos temporários escalados no final do ano anterior.

O que não é normal é que 28,3 milhões de pessoas em idade ativa estejam ou desempregadas, ou trabalhando menos de 40 horas semanais, ou tenham desistido de procurar trabalho — neste último grupo se enquadram 4,8 milhões de brasileiros que deixaram de buscar emprego em março, o maior número desde a criação da série histórica, em 1995.

Na indústria, a situação é desalentadora. Em outubro de 2018, logo após a vitória de Jair Bolsonaro, o mercado divulgou que esperava crescimento superior a 3,1% para indústria em 2019. Em 26 de abril, a expectativa já havia recuado para 2%.

Os chamados “bens intermediários”, que têm o maior peso no cálculo da produção industrial, caíram em março em todas as comparações possíveis. Com o ano anterior, mês anterior, acumulado trimestral e acumulado em 12 meses. O nível de produção desse tipo de material, que inclui indústria química e têxtil, por exemplo, se equipara à mínima histórica do primeiro trimestre de 2016, pré-impeachment de Dilma Rousseff.

Já no caso da confiança, o índice de incerteza da economia calculado pela FGV chegou, em abril, a seu maior nível desde antes das eleições presidenciais — o que mostra que, mesmo tendo-se um presidente eleito, o cenário incerto perdura tal como se não houvesse ainda um vencedor.

O presidente Jair Bolsonaro foi ao programa do apresentador Silvio Santos para falar sobre a importância da reforma da Previdência. Seu objetivo foi comunicar-se com o cidadão comum sobre um Brasil que precisa desesperadamente da reforma para seguir adiante.

O mercado já precificou que a reforma passará num valor inferior ao estimado pelo governo, considerando as informações presentes até o momento — inclusive a pouca disposição do presidente em liderar a própria reforma.

Resta, portanto, saber como o governo lidará com os indicadores que vão mal a despeito das expectativas sobre a Previdência, levando-se em conta que a aprovação da reforma não significará a criação imediata de postos de trabalho.

Há algum plano para o emprego?

Considerando que as concessões que ocorrem hoje são do governo Temer, há planos de conceder projetos do governo Bolsonaro para estimular o fluxo de capitais vindos de fora ainda em 2019?

As privatizações vão ocorrer ainda neste ano para injetar recursos na economia? Há editais prontos? Estudos de viabilidade? Não, até onde se sabe.

Ao longo das últimas semanas, a agenda ideológica do presidente tem se sobreposto a qualquer outro plano de seu governo. De tuítes malparados a conspirações, passando por ministros mostrando cicatrizes em vídeos na internet e críticas subjetivas ao ensino superior, a impressão que se tem é que, na melhor das hipóteses, os números do IBGE e da FGV não chegaram ao Palácio do Planalto por algum estranho problema de comunicação — problema este que só atinge os dados do IBGE e nada mais.

Gente fora do mapa

Michael S. Williamson

Os sabotadores

Neste circo em que se transformou o governo Bolsonaro (com pedido de perdão aos circos, ícones da infância mas aqui referidos como símbolos da fuzarca), onde têm espaço nobre o globo da morte, o engolidor de fogo, vamos reservar em banho-maria, por alguns momentos, Olavo, Carlos, Eduardo, Ernesto, Vélez, Weintraub e tantos outros personagens que invadiram a política brasileira e os escalões do serviço público, de armas e bagagem. Especialmente de armas, insultos, prepotência e outros ruídos nos quatro primeiros meses do ano.

É o presidente da República Jair Bolsonaro, e não eles, o principal responsável por tudo o que se passa: a disputa violenta de poder do grupo tuiteiro que liderou sua campanha; a paralisia da administração pública; a dissintonia com o Congresso; as crises pré-fabricadas uma após outra, com os mesmos ingredientes; a falta de comando.


Portanto, Bolsonaro não é vítima desse esquema de sabotagem ao governo formulado por Olavo de Carvalho e executado pelos filhos do presidente. É coautor. É agente ativo e, com sua frouxidão, participa do processo de humilhação impingido aos militares e ministros do núcleo de poder presidencial, atacados pelos que estão sob a proteção da distância virtual.

E por que os generais convidados por Bolsonaro a integrar o governo se submetem a isso? Aí estaria uma boa resposta para elucidar muito do que pensa o grupo sobre sua missão neste governo.

Na verdade, já havia notícias: os militares estavam cheios, pelo pescoço, elocubrando sobre rumo coletivo, mas os ataques que sofreram no último mês foram tão violentos e gratuitos, e o presidente ficou tão inerte, que até fortaleceram seus laços corporativos.

Até o general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, considerado o conselheiro mais onipresente e próximo do presidente da República, já parecia entediado com a falta de impulso do governo e com a falta de pulso do presidente para lidar com as crises pré-fabricadas por Olavo Carvalho e Carlos Bolsonaro. A expectativa até a semana passada, quando o general foi fotografado de olhos fechados em duas solenidades, era que a perda de interesse tinha chegado ao seu ponto máximo, o enfado.

Parecem agora revigorados. Para isso contribuiu muito a reação do general Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército, que à falta de presidente assumiu a defesa dos militares e, portanto, do governo, partindo para a ofensiva contra Olavo.

Bolsonaro, porém, não assumiu nada explicitamente, nem o governo, e continua adulando o grupo de rebelados sem causa. Deu ao expoente da direita que ministra cursos na internet a maior condecoração que o governo poderia dar, no auge da violência verbal escatológica contra os ministros militares. Seu filho vereador vangloria-se das frituras que promoveu com sucesso. E o governo inteiro fica estático, assistindo ao espetáculo.

Os sabotadores não têm porque parar: fritaram Gustavo Bebianno, ele caiu: fritaram Ricardo Vélez, do seu grupo mas perdendo o controle do poder sobre a Educação, caiu e foi substituído por outro da estirpe; fritaram dois presidentes da Apex, que caíram; tentaram o impeachment do vice-presidente Hamilton Mourão pelas mãos do amigo de Olavo, deputado e pastor Marco Feliciano, mas a decisão era do presidente da Câmara, que engavetou. E agora concentram sua força na derrubada do ministro da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz.

O desgaste levou à perda de poder do grupo com cargos no Planalto e à insegurança com relação ao destino do governo. Mas não enfraqueceu só os militares. Reduziu o governo Bolsonaro a uma briga de baixo nível e desmoralizou a própria tropa olavista pela incapacidade de ter compostura numa disputa a sério.

É fácil ofender, insultar pela rede social. O professor da internet não consegue condensar em frases curtas exigidas pelo Twitter toda a sua vã filosofia. Parte para a ignorância, o murro, o soco. A galera da arquibancada bolsonarista gosta, bate palma e pede bis. Mas o governo não põe a cabeça fora dágua. A desproporção torna tudo muito irreal e a impressão é que isso não deve durar muito tempo mais, algo terá que acontecer, de bom ou de ruim. Pois a fábrica de crises continua de pé: Olavo inventa um alvo, um tema, e Carlos Bolsonaro executa. Com o pai impedido de agir abertamente, o irmão sempre aparece para socorrê-los.

O presidente concorda com o que faz o grupo, senão já teria seu governo profissionalizado com o afastamento dos que estão brincando de clube do tiro.

As notícias que saem do Planalto para o Congresso preocupam os partidos. Muitos acham que o caminho tomado pelo presidente está meio sem volta, já não tem conserto. Ninguém governa o presidente nem se nomeia conselheiro. Ele é senhor de sua atuação.

A paralisia do Executivo e do Congresso dão a impressão que ainda não houve posse. O Ministério da Economia, para onde corre Bolsonaro quando se vê sem chão, anda em círculos, anunciando medidas que se repetem e, no mês seguinte, se repetem de novo, e de novo.

O que está na cabeça de Bolsonaro não se consegue decifrar. Será que sabe onde isso vai parar? Será que acha que será obedecido quando der ordem aos generais para aguentarem tudo calados? Ele apoia Olavo cada vez mais, acaba de fazer a condecoração maior do governo a ele, no dia do ataque mais pesado aos generais. Apoia Fabio Wajngarten, representante dos filhos no comando da propaganda do governo subordinada ao general Santos Cruz; apoia Abraham Weintraub, o novo ministro da Educação que chegou barbarizando tanto quanto seu guru. Quando pressionado a se manifestar sobre o escárnio instalado sob seus olhos, sai-se por debaixo do braço de quem o acuou perguntando se o que querem é que rompa com seus filhos. A ignorância é vasta.

Como os políticos do governo Bolsonaro não existem e os líderes que têm poder não se dão com o ministro da Casa Civil, o caminho por essa via está impedido.

A situação é terrivelmente clara: Os militares não têm, neste momento, a metade da força que tiveram na transição e no início do governo Bolsonaro. A agenda do principal general do governo é fraca, Houve clara perda de substância.

O presidente escolhe os seus conselheiros, e escolhe de acordo com suas convicções, suas crenças, seus valores, com o que acha que é certo e errado. Afasta uns e aproxima outros. Bolsonaro aproximou-se dos sabotadores.

Todo cuidado é pouco

Ninguém lê disparates impunemente
Victor Hugo

Surge sob Bolsonaro a oposição extraparlamentar

Às voltas com dificuldades para formar algo que se pareça com uma base parlamentar de apoio ao governo, Jair Bolsonaro conseguiu a proeza de piorar uma conjuntura política que já é demasiadamente adversa. Graças ao presidente e à ala piromaníaca do seu governo, ressurgiu na cena política brasileira um fenômeno que andava anestesiado: a oposição extraparlamentar.

O governo do capitão mal entrou no seu quinto mês e já enfrenta os dois primeiros focos de contestação social. O corte orçamentário que o MEC impôs às universidades —sem discussão prévia nem explicação convincente— levou alunos e professores às ruas. Simultaneamente, o desmonte do aparato de fiscalização ambiental, o descaso com a Amazônia e o desapreço pelos índios produziu uma articulação inédita de oito ex-ministros do Meio Ambiente.

Os dois movimentos têm coisas em comum: nasceram à margem dos partidos e reúnem personagens de diferentes tendências ideológicas. O torniquete ideológico-financeiro do MEC empurrou para dentro das mesmas manifestações a esquerda e a direita universitária. A ruína ambiental juntou numa mesma sala de reunião ex-ministros de todos os governos anteriores —de Fernando Collor a Michel Temer.

Os protestos que brotam das universidades devem durar enquanto sobreviverem os cortes. A reunião dos ex-ministros do Meio Ambiente, marcada para esta quarta-feira, na USP, deve resultar num manifesto conjunto com potencial para reverberar no exterior. Os partidos de oposição virão a reboque, na sequência. Bolsonaro ainda não percebeu. Mas seu governo entrou num processo de autocombustão.

Um estranho estado de ânimo

O mundo está adquirindo outra feição. A forte preferência política pela distração impôs a regra: todos viram, ninguém viu. A impressão que dá é que se alguém despertar tudo pode evaporar. Há algum tempo andorinhas não governam. Não é falha da razão, nem resultado da pobreza da curta experiência democrática. É um subproduto do fato de as atitudes predominantes na vida das pessoas se terem tornado cópias de comportamentos digitais. A moral moderna ainda não está codificada, mas seus memorandos presentes na navegação online, com a universalização de informações, ressentimentos diversos e a desatualização periódica de todos os sistemas de intermediação e valores, indicam uma formatação futura onde não haverá quem testemunhe pela testemunha. A internet é o inconsciente a céu aberto.


Volodymyr Zelenski, de 41 anos, toma posse como presidente da Ucrânia agora em maio. O comediante fez sua campanha nas redes sociais com um discurso sintetizado no último verso do soneto 121 de Shakespeare: o homem é mau e reina na maldade. Ganhou de lavada. A Ucrânia está no centro das disputas que se travam no mundo desde a crise econômica iniciada em 2008. Foi na Ucrânia que a Rússia usou o Exército para mandar um recado à Otan: tirem as botas do Leste Europeu. Em 2014 Moscou anexou a Crimeia, península ucraniana no Mar Negro.

A ascensão de Zelenski é mais um sintoma de uma baita crise sem solução iniciada pelo manejo econômico centralizado e impulsionada pelo desassossego (in)fértil da internet. É um presságio de que dias piores virão. Tudo começou quando Ben Bernanke, presidente do Banco Central americano (Fed) de 2006 a 2014, quis parecer a pessoa na hora certa, no lugar certo. Estudioso das recessões econômicas, Bernanke afirmou que não estava disposto a permitir uma segunda grande depressão nos EUA. No meio de um mundo em que o Estado, desorientado, briga com o capital, Bernanke tirou da cartola uma ideia chamada afrouxamento quantitativo e inundou o mundo do desejo de se aliviar, sem esforço.

A ideia foi comprada pelos sete países mais ricos. E empurrada garganta abaixo do G-20 como uma generosa decisão de fraternidade internacional. O Brasil não reagiu estrategicamente e saiu comprando carro sem ter garagem. Os bancos centrais dos países ricos passaram de cerca de US$ 3 trilhões de crédito a receber do mercado em 2007 para mais de US$ 14 trilhões em 2018. Operações de empréstimo a juro zero ou mesmo negativo viraram mantra. Quem recebeu o esplendoroso “afrouxamento” foram o sistema financeiro e suas conexões. Bernanke acreditava que inundar os ricos de dinheiro evitaria a estagnação econômica e o empobrecimento da população.

Como a economia não secou, funcionou artificialmente encharcada alguns anos até virar o estopim da crise global que dura até hoje. O vaso da economia mundial se estilhaçou, a política de potências esfarelou-se e a gula do mundo online explodiu, impondo aos jovens duas falácias desestruturantes: 1) basta a posse, deixe a propriedade comigo; 2) derrube tudo, o inimigo é a política. A sociedade embarcou na onda da conspiração abstrata: o real é caro, barato é o virtual. A crise não passa porque o mundo está querendo enfrentar ideias antigas, protecionistas ou antissociais, com mágica, ancorando gratuidade na concentração de renda e fazendo-se servil ao distributivismo digital. Mas a economia, diferente da política, só funciona se não tiver amigos.

Por quê? Porque riqueza não se produz nem de imediato, nem de graça. A globalização produtiva gera trabalho e oportunidade, é coisa real que traz valor, inovação e desenvolvimento. Contra isso os US$ 14 trilhões emprestados ao mercado foram tragados pelo laguinho egoísta do sistema financeiro e dos amigos da gratuidade. Agentes e grupos transnacionais estão intensificando suas brigas dentro de todos os países para impedir a cooperação internacional e o pacto pela nova sustentabilidade produtiva. Sem botar a cara de fora, por trás da santificada rede social, usam seus usuários, de graça, na luta pelo caos improdutivo.

Enquanto isso, o poder real vai aperfeiçoando os sistemas de mísseis, para botar ordem física na bagunça criada pela economia virtual. Anomias que engolem anomias e produzem novas anomias. Estamos vivendo as várias etapas de uma revolução suicida, em que quem ajuda a destruir o primeiro círculo é destruído pela segunda onda, que será então pela terceira, quarta, até chegar ao impasse violento. Tudo isso sem reflexão, a deusa da facilidade, simplesmente porque depois da internet ninguém olha mais para os pés.

Aqui voltamos à Rússia e à Ucrânia, que será governada por um contador de anedotas. O governo russo desde 2008 é o mais estável do mundo, com Putin, o maior apoiador dos movimentos digitais anti-establishment na Europa. Aliás, líderes desestabilizadores e estáveis somente ele e Netanyahu em Israel, outro homem das nuvens. A alemã Merkel balança, mas para manter a Alemanha no topo da Europa não se importa com a destruição da União Europeia. Algo que a aproxima de Trump, poderoso usuário dessa metralhadora online que vem limando a confiança do mundo em suas regras comuns e instituições coletivas.

Em meio à armadilha pelo afrouxamento quantitativo, Moscou vai semeando a discórdia onde pode para abalar as estruturas do disponível homem das redes. Apoia qualquer grupo comprometido com avacalhar e dilapidar o mundo que está aí. Inclusive com a eleição de Zelenski, que recebeu apoio de Israel, inimigo da Síria, aliada da Rússia...

Zelenski é nuvem caótica. Com a simpatia da Otan e o deslumbramento da população, tensiona o que ainda resta dos contornos do mundo das potências. Confusões nada liberais para provocar a inflexão final – quando será? – aproveitando o rastilho de pólvora que queima desde 2008.

Pensamento do Dia


Deu a louca no governo

O presidente Jair Bolsonaro trabalha afincadamente para dar razão aos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso. Lula disse que este é um governo de malucos. Fernando Henrique, mais contido, que desse jeito não dá.

Não bastasse a quantidade de graves problemas que tem para enfrentar, Bolsonaro decidiu adicionar mais um à sua carregada agenda: dar trela a um doido varrido, no caso o autoproclamado filósofo Olavo de Carvalho, o guru dele e de sua família.


No ócio em que vive a milhares de quilômetros daqui, sustentado à distância por uma legião de devotos que pagam para ouvi-lo dizer qualquer idiotice, Olavo resolveu ocupar-se em jogar pedras no governo, mais precisamente nos militares que o integram.

O que ele pretende? Criar confusão, somente isso. Se der, valer-se da confusão para empregar no governo mais um dos seus discípulos. Talvez Carlos Bolsonaro no lugar do general que comanda a comunicação do governo. Ou outro nome qualquer.

E como reage Bolsonaro às pedras atiradas pelo ex-astrólogo, influenciador digital e doido de Richmond, capital do Estado americano de Virgínia? Mima-o. Faz-lhe todas as vênias. Há uma semana, concedeu-lhe a mais alta condecoração do Itamaraty.

O governo desmorona internamente por obra e graça do doido. Diante da inação de Bolsonaro, o general Villas Bôas, ex-comandante do Exército, lotado no Palácio do Planalto, sentiu-se obrigado a responder aos insultos de Olavo.

Fez mal. Se o doido não pode ser recolhido a um manicômio, devolver-lhe as imprecações lançadas é fazer o jogo dele. É tudo o que Olavo quer. Até porque como doido ele não respeita limites. E sempre será muito mais desbocado do que seus desafetos.

Há doidos suficientes em torno de Bolsonaro para que ele tenha de conviver com mais um. Ou não é doido o ministro que compara Bolsonaro a Jesus, ambos, segundo ele, pedras angulares? Ou não é doido o ministro que já viu Jesus no alto de uma goiabeira?

Não será um ato de insanidade cogitar uma viagem ao Texas para receber um prêmio que Nova Iorque recusou-se a entregar? Haverá ato mais insano do que reduzir verbas para Educação e ao mesmo tempo anunciar que o corte poupará os colégios militares?

Há neste governo ilhas de sanidades capazes de atuar melhor em ambiente de menos balbúrdia, mas até quando elas resistirão sem pedir as contas? Enquanto isso, o vice espera, vigia e ultimamente se finge de morto. Vice não é nada, mas pode um dia ser tudo.

Não passou

Passou?
Minúsculas eternidades
deglutidas por mínimos relógios
ressoam na mente cavernosa.

Não, ninguém morreu, ninguém foi infeliz.
A mão - a tua mão, nossas mãos -
rugosas, têm o antigo calor
de quando éramos vivos. Éramos?

Hoje somos mais vivos do que nunca.
Mentira, estamos sós.
Nada, que eu sinta, passa realmente.
É tudo ilusão de ter passado.
Carlos Drummond de Andrade

O Blocão

Ir para o Blocão era a maior ameaça que pairava sobre os internos do Hospital Psiquiátrico onde um amigo, acometido de deprê, resolveu se internar para tratar de angústia aguda no Brasil dos Bosos.

Ir para o Blocão é o deu ruim. Muito ruim. O Blocão, "assim denominado por ser uma construção de concreto, cinza e lúgubre", é o pedaço prisão do Hospital, com grades, circulação limitada, isolamento, risco de amarras ou camisa de força e o que mais sua imaginação possa supor para conter os dos surtos psicóticos graves.


Isso meu amigo descobriu na primeira manhã no pátio de convivência coletiva dos das maluquices leves, ainda sob controle. Soube também que ali estavam os TM e os DQ. O que significa os do Transtorno Mental e os da Dependência Química.

Soube que era do grupo TM. Onde cabem os da depressão, da ansiedade, do estresse pós-traumático, da somatização, dos transtornos alimentar, bipolar, obsessivo-compulsivo, e da esquizofrenia. Os DQ, aprendeu, são os dependentes químicos, também com N divisões. Um TM não confia num DQ e vice-versa.

O cigarro é liberado para os dois grupos. Bengala segura pra quem está no limite de perder as estribeiras e, pavor, cair no Blocão.

Ali no intramuros da sua crise, o amigo pensou: Isso me remete ao Brasil de agora, com o governo da família Bolso no papel de Blocão – construção rústica, de concreto escuro, com grades, zero jardins, zero verde, sem paisagem na janela, saída limitadíssima, onde estão contidos loucos varridos com todo tipo das síndromes do ramo psiquiátrico.

O Blocão Boso ameaça. Mete medo geral. Tá ali, visível a olho nu, um bicho papão da goela grande. Na guarita, Neros 1, 2 e 3, mochila carregada com álcool e pólvora (a preferida), afinam harpa sem corda para incendiar tudo com trilha sonora de Sexta-feira 13. Sem radar, nem lombada. Em velocidade máxima.

OlavoC, o guru do hospício, de longe, comanda o grupo dos DCH – dependentes crônicos de holofotes, onde cabe também o Carlucho. O garoto, que o jornalista Mario Rosa denomina de Nero 2, na verdade tem dupla militância em patologias. É ainda legítimo portador de psicose, doença que pode ser desencadeada na adolescência e seguir vida afora.

Ambos padecem de logorreia, que é a compulsão para falar qualquer M, loquacidade exagerada que se nota em determinados casos de neurose e psicose, como se o paciente, assim, quisesse dar vazão ao grande número de ideias que passam por sua cabeça quaisquer que sejam.

Damares, o ministro das Relações Exteriores e os ministros da Educação – o caído e o atual – são TMGP, de transtorno mental grave e persistente. Os generais são DQD, dependentes químicos da ditadura. Saudosismo que não há cigarro ou tarja preta que aplaque.

Moro é DQL – dependente químico da Lavajato. Sem ela, desandou vitimado de banzo. PGuedes bate ponto ala dos psicopatas, transtorno marcado pela total ausência de empatia. O psicopata é incapaz de perceber sentimentos ou necessidades das pessoas à sua volta. Tem encanto superficial, lábia e sedução, capaz de manipular quem chega perto.

Mourão, o vice, é paciente leve, da ala dos bipolares. Ontem mauzão, hoje bonzinho, amanhã...

O PR, comandante em chefe do país, é elacista, sofre de elação, que é o estado de acentuada exaltação, animação e alegria. Ocorre na mania, sendo também vista ocasionalmente na esquizofrenia e em pacientes com lesão do hipotálamo. Patologia que divide com seu mestre, OlavoC, o único.

Ainda acomodados no pátio da ala light, de susto em susto, estamos nós, os por eles diagnosticados como dependentes químicos da balbúrdia - DQB. No córner, vamos também engrossando o cordão dos TM. Não há psique que aguente. Não há álcool, benzodiazepínico ou fumaça capaz de aliviar as dores advindas dos feitos e desfeitos do povo do Blocão. Tá feia a coisa. Demais da conta.
Tânia Fusco

Wilson Witzel, o governador que queria ser Chuck Norris

Wilson Witzel queria ser Chuck Norris. Como não foi descoberto por Hollywood, candidatou-se ao governo do Rio. Eleito, deixou a administração de lado para brincar de filme de ação.

No sábado, o ex-juiz mobilizou fuzis e helicópteros para bancar o xerife. Policiais civis e militares foram recrutados como figurantes. Um assessor usou o celular para registrar a encenação.

Em traje esporte, Witzel finge comandar uma operação contra o crime em Angra dos Reis. “Acabou a bagunça. Vamos colocar ordem na casa”, anuncia, com cara de mau e olhar fixo na câmera.

Na sequência, ele embarca num “caveirão aéreo” com atiradores munidos de fuzis. O vídeo termina com as armas apontadas para um morro, ao som de rajadas de tiros. Tudo acontece em um minuto, tempo ideal para o compartilhamento nas redes sociais.

Ninguém foi preso, e nenhuma arma foi apreendida. Cumprida a missão caça-likes, o governador foi repousar no Hotel Fasano, com diárias a partir de R$ 1.600. Ele disse ter aceitado a hospedagem como “cortesia”. Alertado de que a prática viola o código de conduta do Estado, mudou a versão.

Na semana passada, Witzel se internou para fazer exames no hospital mais caro do Rio, depois de prometer que só se trataria em unidades públicas. O episódio de Angra é mais grave porque o governador montou um teatro de violência e pôs inocentes em risco para se promover. Dois dias depois, outra operação com helicópteros deixou oito mortos na Maré.

Nos primeiros três meses do governo Witzel, a polícia matou 434 pessoas — quase cinco por dia, um recorde no Estado. O Ministério Público e a OAB estudam medidas para tentar conter o faroeste.

“A política do bangue-bangue não resolve os problemas da segurança”, critica o presidente regional da OAB, Luciano Bandeira. Ele afirma que o uso de helicópteros em operações policiais é proibido por um decreto estadual de 1994. “Em nenhuma hipótese o helicóptero poderá ser usado em confronto armado direto”, diz o texto, ainda em vigor.