quarta-feira, 8 de maio de 2019

Os dois Brasis

A reforma da Previdência tem se mostrado o principal prisma por meio do qual se observa a economia brasileira. Se for aprovada sem grande desidratação, significará que o Brasil vai prosperar e entrar num rumo virtuoso em direção ao crescimento e ao emprego.

É luz no fim do túnel capaz de iluminar os caminhos de uma trajetória fiscal mais sadia. Ao menos, é esse o esperado.

Ocorre que o túnel pode desmoronar antes que se alcance a luz — custe ela R$ 1 trilhão, 800 bilhões ou 600 bilhões. É o que mostram três indicadores econômicos divulgados nos últimos dias. O do emprego, o da produção industrial e o da confiança.


No caso do emprego, não é o número de desempregados que é o mais alarmante. É verdade que o desemprego no Brasil cresce ininterruptamente desde 2014. Mas é sazonal que a taxa de desemprego seja alta nos três primeiros meses do ano. Isso se deve ao encerramento dos contratos temporários escalados no final do ano anterior.

O que não é normal é que 28,3 milhões de pessoas em idade ativa estejam ou desempregadas, ou trabalhando menos de 40 horas semanais, ou tenham desistido de procurar trabalho — neste último grupo se enquadram 4,8 milhões de brasileiros que deixaram de buscar emprego em março, o maior número desde a criação da série histórica, em 1995.

Na indústria, a situação é desalentadora. Em outubro de 2018, logo após a vitória de Jair Bolsonaro, o mercado divulgou que esperava crescimento superior a 3,1% para indústria em 2019. Em 26 de abril, a expectativa já havia recuado para 2%.

Os chamados “bens intermediários”, que têm o maior peso no cálculo da produção industrial, caíram em março em todas as comparações possíveis. Com o ano anterior, mês anterior, acumulado trimestral e acumulado em 12 meses. O nível de produção desse tipo de material, que inclui indústria química e têxtil, por exemplo, se equipara à mínima histórica do primeiro trimestre de 2016, pré-impeachment de Dilma Rousseff.

Já no caso da confiança, o índice de incerteza da economia calculado pela FGV chegou, em abril, a seu maior nível desde antes das eleições presidenciais — o que mostra que, mesmo tendo-se um presidente eleito, o cenário incerto perdura tal como se não houvesse ainda um vencedor.

O presidente Jair Bolsonaro foi ao programa do apresentador Silvio Santos para falar sobre a importância da reforma da Previdência. Seu objetivo foi comunicar-se com o cidadão comum sobre um Brasil que precisa desesperadamente da reforma para seguir adiante.

O mercado já precificou que a reforma passará num valor inferior ao estimado pelo governo, considerando as informações presentes até o momento — inclusive a pouca disposição do presidente em liderar a própria reforma.

Resta, portanto, saber como o governo lidará com os indicadores que vão mal a despeito das expectativas sobre a Previdência, levando-se em conta que a aprovação da reforma não significará a criação imediata de postos de trabalho.

Há algum plano para o emprego?

Considerando que as concessões que ocorrem hoje são do governo Temer, há planos de conceder projetos do governo Bolsonaro para estimular o fluxo de capitais vindos de fora ainda em 2019?

As privatizações vão ocorrer ainda neste ano para injetar recursos na economia? Há editais prontos? Estudos de viabilidade? Não, até onde se sabe.

Ao longo das últimas semanas, a agenda ideológica do presidente tem se sobreposto a qualquer outro plano de seu governo. De tuítes malparados a conspirações, passando por ministros mostrando cicatrizes em vídeos na internet e críticas subjetivas ao ensino superior, a impressão que se tem é que, na melhor das hipóteses, os números do IBGE e da FGV não chegaram ao Palácio do Planalto por algum estranho problema de comunicação — problema este que só atinge os dados do IBGE e nada mais.

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