“Eu não vou lá para brigar”, bradou Lula. Seu plano de governo consiste em ajudar a fazer as coisas que precisam ser feitas. “Não vou lá achando que aqueles que não gostam de nós são menos brasileiros do que nós”, afirmou, antes de realçar as características que fazem de “nós” algo bem melhor do que “eles”.
“Eles vestem roupa amarela e verde para dizer que são mais brasileiros do que nós. Corte uma veia deles para ver se o sangue deles é verde e amarelo. É vermelho que nem o nosso, é vermelho como se fosse o sangue de Jesus Cristo.”
Lula prosseguiu: “Eles não são mais brasileiros do que nós, porque, na verdade, eles são um tipo de brasileiro que gostaria de ir para Miami fazer compra todo dia. E nós compramos na 25 de Março. Nós compramos na cidade que a gente mora. E a gente compra fiado. A gente não reclama que o dólar suba, porque fica caro viajar para Miami. Eu viajo para Garanhuns, para o Rio Grande do Norte, para a Bahia…”
“Precisamos recuperar o humor desse país, precisamos recuperar o orgulho de ser brasileiro, precisamos recuperar a auto-estima”, disse Lula a alturas tantas. O orgulho e a auto-estima não serão recuperados facilmente. Mas o humor está de volta.
Deve-se louvar o esforço retórico que o sucessor de Dilma realiza para reaproximar o PT dos brasileiros mais humildes. Não é fácil para Lula esbravejar contra a elite endinheirada. Uma voz incômoda deve soar nos fundões de sua consciência: “Farsante”.
Palestrante milionário, amigo de poderosos que reformam à sua revelia os imóveis que frequenta, Lula deve se divertir sozinho ao verificar, na hora de escovar os dentes toda manhã, que a elite agora mora no espelho da cobertura de São Bernardo.
Uma das caractererísticas fundamentais da deficiência de julgamento de um povo é ter que ouvir uma pessoa durante vários anos para chegar à conclusão de que ela não tem nada dizer. Lula atingiu esse estágio. Seu discurso tornou-se um latifúndio improdutivo. Apenas os devotos que o seguem desejam compartilhar.
Lula já não exibe a pele de jararaca que vestira em 4 de março, quando a Polícia Federal o levou para prestar depoimento, sob vara. “Ao aceitar ir para o governo, veja o que aconteceu comigo: eu virei outra vez o Lulinha Paz e Amor”, disse ele, no miolo de um discurso recheado de ataques.
“Não quero que quem votou no Aécio vote em mim, não quero que ele exija que quem votou na Dilma vote nele. O que eu quero é que a gente aprenda a conviver de forma civilizada com as nossas diferenças.” Civilizadamente, Lula bateu nos rivais: “Faz um ano e três meses que eles estão atrapalhando a presidenta Dilma a governar esse país.”
Habituado a superestimar seus talentos, Lula subestima as deficiências de Dilma. Madame se desgovernou sozinha, sem o auxílio da oposição. Por sorte, Lula, que vinha sendo o poder de fato no Brasil desde que deixou a Presidência, em 2010, aceitou reassumir o trono.
O discurso de Lula na Paulista introduz no cenário político um clima de novidade burlesca. Percebe-se nas entrelinhas que Lula virou a página. Para trás!
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