terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Política é missão, não profissão

A política não é um fim em si mesmo, mas um sistema-meio para administrar as necessidades do povo. Logo, é uma missão, não uma profissão. Aristóteles ensina que o cidadão deve servir à polis visando ao bem comum. Ao se afastar dessa meta, dá lugar à corrupção, pois “se desvia do objetivo e passa a governar de acordo com seus interesses”.

Por conseguinte, a política não deve ser escada para promover pessoas ou facilitar negócios. O sistema político desenvolve a capacidade de responder aspirações, transformar expectativas em programas, coordenar comportamentos coletivos e recrutar para a vida pública quem deseja cumprir uma missão social.

Utopia? Pode ser, mas deve servir de inspiração. Infelizmente, entre nós, a política tem sido tratada como bom negócio. Longa tradição. Ao criar e doar 14 capitanias hereditárias a donatários entre 1534 e 1536, d. João III plantava a semente do patrimonialismo. De posse da terra, os donatários podiam até transferi-las para os filhos, mas não vendê-las. Capitania virou possessão, propriedade.


Hoje, parcela dos nossos representantes considera espaços públicos como feudos. Assim a política se transforma num dos melhores negócios da Federação. O caminho: primeiro, conquista-se o mandato; a seguir, a política vira instrumento de intermediação no mercado de 27 Estados (com o DF). São estruturas, cargos e posições nas esferas federal, estadual e municipal.

Um negócio com cerca de 150 milhões de consumidores, o contingente eleitoral. Para chegar até eles, um candidato gasta bons trocados (custo médio hoje entre 12 a 15 reais por eleitor), a depender do cargo, de vereador a presidente da República.

Candidatos ricos bancam suas campanhas. A maior parte recebe recursos do fundo partidário ou doações. Para 2020, o fundo partidário deve ser em torno de R$ 2,5 bilhões. PSL e PT, os dois maiores partidos na Câmara, devem receber as maiores fatias. Numa campanha despende-se entre três a quatro vezes mais do que a quantia apresentada aos Tribunais eleitorais. Poucos se elegem com somas pequenas.

Dessa moldura, surge a pergunta: se a campanha política é tão dispendiosa e se candidatos gastam mais do que ganham, por que o empenho para assumir a sacrificada missão de servir ao povo? Ou há muito desvio entre o espírito cívico de servir e o sentido prático de se servir?

Arriscado inferir sobre o comportamento dos políticos, pois parcela atua de maneira nobre. E acaba sofrendo injustamente críticas por desvios cometidos por alguns.

Onde brota a corrupção? Começa pelo costume do superfaturamento. Obras públicas geralmente recebem um dinheiro a mais, que paga achacadores e engorda campanhas no círculo vicioso do lamaçal, hoje devassado pela Operação Lava Jato. Mas há sempre uma fresta, uma vez que em postos chaves estão os indicados pelos políticos.

Portanto, há um PIB informal formado por recursos extraídos das malhas da administração nas três instâncias federativas. Sanguessugas predadoras escondem-se em parcela do corpo político para sugar as veias do Estado brasileiro.

Dinheiro e poder são as vigas da vida pública, mas começam a soçobrar nesse início de ciclo da ética e da transparência.

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