Portanto, quando o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, em entrevista ao jornal O Globo (10/02), declara que o "impeachment foi desencadeado por vingança de Cunha", sei que estou diante de uma flagrante mentira, de uma notável desonestidade intelectual. E desonestidade intelectual, desonestidade é. Existem políticos tão pouco afeitos à verdade que não a reconheceriam mesmo se pingada em seus olhos como colírio. Em março de 2015, poucos dentre aqueles milhões de brasileiros que saíram às ruas sabiam o nome do presidente da Câmara dos Deputados. Raros, mais bem informados, tinham conhecimento de que ele chegara ao posto contra a vontade do Planalto. Raríssimos estavam cientes de que o sujeito não era trigo limpo. Confundir impeachment com Cunha não é esperteza. É mistificação e velhacaria.
Em fins de março de 2014, três dezenas de requerimentos pedindo a instauração do processo contra a presidente Dilma estavam empilhados sob a guarda do presidente da Câmara. E o que ele fez? Nada. Diante dessa omissão, o povo voltou às ruas, meio frustrado, no mês de maio. Qual a reação de Eduardo Cunha? Nenhuma. O povo voltou às ruas em agosto. E nada. Em outubro, um acampamento instalou-se, durante semanas, diante do Congresso. E mais uma vez, nada. Até que, em 2 de dezembro(!), Cunha despachou o requerimento que passou a tramitar.
Cabem, então, estas perguntas: durante todo o período descrito, alguém ouviu um discurso de Eduardo Cunha a favor do impeachment? Concedeu ele uma entrevista favorável? Emitiu qualquer gesto de apoio, ao longo desses oito meses? Eduardo Cunha, leitores, atrapalhou o processo o quanto pode, isto sim. Usou-o para maquinações de interesse pessoal. E permitiu que ele se contaminasse com as revelações surgidas em torno de seu nome. Rindo do descosido Cunha, o roto PT tentou desacreditar o sonoro clamor nacional.
Por tudo isso, bem ao contrário da inversão que o ministro Cardozo tenta promover nos fatos para servi-los como lhes convém, não hesito em afirmar que Eduardo Cunha e Luís Roberto Barroso do STF são os dois maiores inimigos do impeachment. Cunha por tudo que não fez. Barroso pelo que fez ao, maliciosamente, confirmar o STF como puxadinho do PT.
Percival Puggina
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