Não há nenhum indício de algum ato que possa justificar qualquer denúncia contra a presidente da República
D. Damasceno, então presidente da CNBB, e cardeal arcebispo de Aparecida (SP), 12/03/2015
Existem normas, regras, para um pedido oficial de impeachment. Creio que não chegamos a esse nível
D. Leonardo, secretário geral da CNBB, 12/03/2015
"A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, reunida em sua 53ª Assembleia Geral, em Aparecida-SP, no período de 15 a 24 de abril de 2015, avaliou, com apreensão, a realidade brasileira, marcada pela profunda e prolongada crise que ameaça as conquistas, a partir da Constituição Cidadã de 1988, e coloca em risco a ordem democrática do País." Palavras iniciais da Nota da CNBB Sobre o Momento Nacional, divulgada no encerramento da Assembleia.
Já mencionei que, como leigo, não tenho dever de acolhimento ou reverência às posições políticas dos senhores bispos. Nas democracias, a política é terreno de contraditórios, antagonismos, diversidade de opiniões. Quem assume posição política não pode, após ser imprudente, erguer o báculo cobrando dos fieis prudência e zelo pela autoridade religiosa que não soube preservar. A CNBB entrou no jogo e foi falar com Dilma. Espontaneamente, disse não ver motivo para impeachment. Certificou à mídia não existir "nenhum indício de algum ato" que possa justificar denúncia contra a presidente (uma certeza que não é compartilhada por muitos no mundo jurídico, por muitos mais no mundo político e por 63% dos brasileiros).
Tais afirmações podem e devem ser contestadas. O que as motiva pode e deve ser objeto de reflexão. Mormente se, no momento seguinte, a CNBB desencadeia campanha de apoio ao projeto de reforma política do PT.
Após tantas adesões, ora veladas ora explícitas à pauta petista, a questão que proponho à reflexão dos leitores, é a seguinte: quem ou o que estaria pondo em risco, na opinião da CNBB, a ordem democrática no Brasil? Formulo a pergunta porque essa conversa sinuosa, melíflua, esse dizer sem ter dito, esse verdadeiro arremedo de nota oficial, pode ser ofensivo se dirigido aos milhões de brasileiros que saíram às ruas pedindo impeachment e exigindo das instituições, civicamente, que cumpram seu dever. E é um primor de circunlóquio, em relação ao alvo para onde deveria apontar: a pessoa da presidente e seu envergonhado governo, enclausurado nas próprias trampolinagens contábeis, mentiras, irresponsabilidades, más companhias e péssimos exemplos, seus black blocs, os exércitos de Stédile, e os incendiários divisionismos de Lula. Afirmar, como D. Damasceno, que "os ânimos se exacerbaram durante a campanha política de 2014" e que "a tensão continua" é dar um torcicolo nos acontecimentos. É fazer coro ao PT quando denuncia um suposto "terceiro turno". É uma pirueta retórica sobre a tensão política que se instalou no país. A vítima, aqui, senhores, é a nação, indignada mas ordeira, que não precisaria estar passando pela crise moral, econômica, fiscal, política, de credibilidade e de inteligência com cujas consequências se defronta. Tudo sob um governo que terceirizou suas atividades essenciais porque não as sabe cumprir.
Percival Puggina
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