E, até agora, não aconteceu nada, absolutamente nada, com o presidente da República.
Não é só que Bolsonaro sofreu menos do que Fernando Collor ou Dilma Rousseff, presidentes que sofreram impeachment. Sofreu muito menos do que qualquer presidente desde a redemocratização. Nos governos Lula e FHC, para ficar nos dois mais bem-sucedidos das últimas décadas, ministros caíam por qualquer denúncia. CPIs eram fatos normais da vida política nacional.
Mesmo antes de discutir impeachment, as instituições poderiam ter dado tiros de advertência para Bolsonaro antes que o desastre se consumasse. Fizeram isso em todos os outros governos. Não fizeram nesse.
Poderiam ter cassado o mandato dos elementos mais extremistas do bolsonarismo. Ao invés disso, a deputada extremista Bia Kicis preside a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.
Em 2020, o filho mais radical do presidente, Eduardo Bolsonaro, disse em uma transmissão online que um golpe de Estado não era questão de “se”, mas de “quando”. Se o Congresso achava demais derrubar Bolsonaro por seu golpismo, podia ter cassado o mandato de seu filho, contra quem as provas eram absolutamente indiscutíveis.
Não fizeram nada. Eduardo Bolsonaro não sofreu qualquer consequência e ainda tem poder de veto na escolha de ministros da Saúde.
O ex-ministro e deputado Osmar Terra alimenta o Planalto com projeções falsas desde o início da pandemia e as divulga impunemente para o público. Depois do próprio Bolsonaro, é o principal responsável pelo desastre. Poderia ter sido cassado no início da pandemia como advertência ao Planalto. Não foi. Continua mentindo nas redes sociais.
Enfim, mesmo se as instituições quisessem evitar o trauma do segundo impeachment em quatro anos –o que já seria covarde, o impeachment em excesso foi o de 2016–, toda essa gente poderia ter sido derrubada como advertência a Bolsonaro. Em todos os governos anteriores, gente muito melhor caiu por muito menos.
Ninguém fez nada, por medo dos militares e por gratidão por Bolsonaro ter matado a Lava Jato.
Há quem diga que Bolsonaro será preso depois de deixar a Presidência em 2023. Não há como ter certeza de que vai perder: a população, inclusive, pode ler a impunidade de Bolsonaro como atestado de que ele não fez nada demais.
O adiamento da prisão de Bolsonaro causou as mortes da segunda onda. Quantos ainda vão morrer por um novo adiamento? Além disso, adiar a prisão para depois da derrota de Bolsonaro torna uma nova ofensiva golpista praticamente inevitável: se Bolsonaro souber que a derrota significa cadeia, terá todo incentivo do mundo para melar o jogo.
É politicamente inviável, e talvez seja errado, tentar prender todos os que, em algum momento, evitaram que Bolsonaro fosse preso. Mas é preciso que haja um limite, um ponto a partir do qual quem não deixar prender tem que ser preso. Proponho que seja agora.
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