terça-feira, 3 de dezembro de 2024

Jabuti não sobe em árvore. Se está lá, ou foi enchente ou mão de gente


A foto acima é de Fernando Haddad, ministro da Fazenda, à época em que prestou serviço militar? Não, não é.

A foto é de um sósia de Haddad que virou estrela do vídeo polêmico da Marinha que, a pretexto de celebrar o Dia do Marinheiro no próximo dia 13, critica indiretamente a proposta do governo de cortes no orçamento das Forças Armadas.

No próximo dia 13, e a Marinha não tem culpa, militares da ativa e da reserva, os saudosos da ditadura de 64, celebrarão em silêncio a passagem de mais um aniversário do Ato Institucional nº 5. Foi o ato mais violento da ditadura. Seria melhor esquecê-lo, mas não.

Melhor é relembrá-lo para que o passado nunca mais se repita. Em 13 de dezembro de 1968, a ditadura até então envergonhada tirou a máscara e se assumiu como tal, suspendendo todas as liberdades que ainda existiam no país e cassando direitos adquiridos.

O AI-5 deu ao general-presidente Costa e Silva o poder de promover ações arbitrárias e reforçou a censura e a tortura como práticas da ditadura. 500 pessoas perderam seus direitos políticos, e 5 juízes de instância, 95 deputados e 4 senadores seus mandatos.

Não bastasse, personalidades influentes da política, como Carlos Lacerda e o ex-presidente Juscelino Kubitschek, foram presos, e intelectuais e artistas perseguidos. O AI-5 foi revogado dez anos depois no governo do general-presidente Ernesto Geisel.

A ditadura estendeu-se até janeiro de 1985. Nos seus 21 anos, segundo levantamento da Human Rigts Watch, vinte mil pessoas foram torturadas, 434 mortas ou seguem desaparecidas, e 4.841 representantes eleitos pelo povo destituídos de seus cargos.

Com duração de 1 minuto e 16 segundos, o vídeo da Marinha foi exibido no último domingo na Praça dos Três Poderes, em Brasília, para marcar a cerimônia de troca da bandeira do Brasil. Permanece disponível nos canais oficiais da Marinha.

O vídeo mostra civis em atividades de lazer como danças e passeios nas praias, e militares em treinamento, pegando no pesado. Não é de graça que os militares costumam se referir aos civis como “paisanos” e se julgam mais trabalhadores e patriotas do que eles.

São tudo, menos patriotas quando apoiam golpes de Estado. Por um triz, fracassaram as recentes tentativas de golpe em dezembro de 2022 e 8 de janeiro de 2023, capitaneadas por Bolsonaro e seus fiéis escudeiros, civis e militares em grande número.

A Polícia Federal indiciou 24 militares, 16 deles da ativa, entre os quais seis oficiais generais, cinco do Exército e um da Marinha. Ao todo, 62 militares da ativa e da reserva são citados no relatório final das investigações. Mas o que Haddad tem a ver com isso?

O vídeo da Marinha é um sinal da insatisfação das Forças Armadas com o pacote do governo que prevê cortes de gastos. O pacote incluía a medida que prevê a idade mínima de 55 anos para que militares possam ir para a reserva. A regra valeria a partir de 2032.

No pronunciamento que fez em cadeia nacional de rádio e televisão, Haddad disse:

– Para as aposentadorias militares, nós vamos promover mais igualdade com a instituição de uma idade mínima para a reserva e a limitação de transferência de pensões, além de outros ajustes. São mudanças justas e necessárias.

São injustas e desnecessárias, na opinião dos chefes militares, cansados de tanto ouvir que são privilegiados. Em um trecho do vídeo da Marinha, aparece um soldado muito parecido com Haddad, acompanhado da legenda: “Vocês terão que se acostumar”.

O vídeo termina com uma militar perguntando:

– Privilégios? Vem pra Marinha!

Fontes da caserna juram por todos os santos que o vídeo não é uma resposta dos militares ao plano do governo de cortes de gastos, e que o soldado parecido com Haddad não foi escolhido por se parecer com ele. Para os paisanos, a desculpa não convence.

Jabuti não sobe em árvore. Se algum é visto no alto, ou foi enchente, ou foi mão de gente.

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