quarta-feira, 5 de maio de 2021

Pesquisa entre cidades bolsonaristas e não bolsonaristas confirma: negacionismo mata

Já que estamos falando de CPI da Covid, vale a pena entrar nas conclusões da mais nova e profunda pesquisa sobre os efeitos do negacionismo no número de casos e de mortes no Brasil: nos municípios onde o presidente Jair Bolsonaro teve mais de 50% dos votos no segundo turno de 2018, o risco de infecção foi 299% e o de mortes, 415% maior do que nos municípios onde ele perdeu a eleição.

Quando o foco fecha nas cidades mais ferrenhamente bolsonaristas, em que ele obteve mais de 70% no segundo turno, o resultado é ainda mais alarmante: quem vive num desses municípios chegou a ter 567% a mais de chance de se infectar e 647% a mais de risco de morrer do que numa cidade onde ele teve menos de 30% dos votos. Isso equivale a sete vezes mais mortes nas cidades onde Bolsonaro ganhou com ampla margem.

“O estudo joga luzes e mostra, metodologicamente, os efeitos nefastos do negacionismo dos líderes, particularmente sobre seus próprios apoiadores e seguidores”, registraram os autores, professores Sandro Cabral (Insper), Nobuiuki Ito (Ibmec) e Leandro Pongeluppe (Universidade de Toronto, Canadá). (Link).

Eles planejaram e executaram um trabalho ambicioso, que condensou os dados de mortes e casos de, nada mais nada menos, todos os 5.570 municípios brasileiros, durante as primeiras 52 semanas da pandemia, equivalentes a um ano. Todo esse banco gigantesco de dois milhões de dados foi cruzado com as informações do TSE sobre os resultados de 2018 em cada cidade.


É claro que outros fatores influenciam no maior ou menor risco de cidadãos e cidadãs por distribuição geográfica, renda, condições sanitárias, mas o estudo nos leva a uma conclusão lógica: onde as pessoas seguiram as orientações erradas e anticientíficas de Bolsonaro, todos ficaram mais expostos ao coronavírus.

Se o presidente combate ostensivamente o isolamento social e as máscaras – únicas “vacinas” possíveis antes das vacinas reais – as pessoas, particularmente as que votaram nele, passam a se aglomerar, a sair sem máscara, a se arriscar. Logo, a se contaminar e a contaminar os demais, inclusive quem não votou em Bolsonaro. E o risco de morte é maior para todos.

Um dado reforça a tese e é de fácil identificação visual nos gráficos da pesquisa: foi na sétima semana da pandemia, quando Bolsonaro fez o último (último!) pronunciamento oficial sobre a covid, no rádio e na TV, que o risco de infecção e morte aumentou claramente nos municípios com maioria bolsonarista em relação aos não bolsonaristas.

Dez semanas depois (na 17.ª), esse descolamento entre os registros nos dois blocos de cidades passa a ter fortíssima significância estatística. Com um detalhe: a partir da 38.ª semana, o distanciamento dispara. A dedução parece também lógica: ocorreu exatamente a partir das eleições municipais, quando os candidatos alinhados ao Planalto replicaram nos municípios bolsonaristas o discurso tóxico do “mito” no combate à pandemia.

A CPI, que começa quente hoje, com o depoimento do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, tem uma profusão de dados e vários caminhos a percorrer no negacionismo de Bolsonaro e de seu governo, incluindo uma guerra insana contra as vacinas, que levou o chefe da Casa Civil a se vacinar escondido. A pesquisa mostra até onde esse negacionismo levou o País.

Como destacaram os professores na apresentação do trabalho, “o estilo negacionista pode ser desastroso para toda a Nação e para a comunidade internacional”. Sim, o mundo não tem mais fronteiras, muito menos as regiões, Estados e municípios brasileiros. É impossível isolar os que se guiam pela ciência e a medicina dos que seguem cegamente os exemplos e as orientações perversas do presidente. Todos saem perdendo. E o resultado é perturbador.

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