A podridão até a raiz
Faz pena. A gente elege entre trinta mil almas meia dúzia de indivíduos para conviver, e, afinal, chega perto deles a defender uma pureza política, uma pureza profissional, uma pureza sexual, e caem sobre nós mil argumentos dum pragmatismo dúbio, suspeito, que confrange. Longe de se receber estímulo para combater as tentações, encontra-se um escorregadoiro conivente para o abismo delas.
— É o meio — repito de cada vez, a tentar iludir-me. Mas é inútil vendar o olhos. Até o meio geográfico se pode vencer, quanto mais o meio social. Na luta contra as atrações inferiores do ambiente humano é que está precisamente a beleza duma vida. O meio! Eles é que são o meio, assim perdidos, duplos, comprometidos com a podridão até à raiz.
Miguel Torga
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