quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Encalacrados

“Como é que a gente sai dessa?”

Ninguém respondeu.

— Não é apenas uma questão de “tira e põe” — ele insistiu. — Tira a Dilma e põe quem?

No breve silêncio parecia que alguns na sala da livraria, quarta-feira passada, no Rio, recitavam mentalmente a linha sucessória da República. Na ordem constitucional, a primazia é do vice Michel Temer (PMDB). Alinham-se, em sequência, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), e o presidente do Supremo Tribunal Federal (Ricardo Lewandowski, até setembro de 2016, quando será substituído pela ministra Cármen Lúcia).

Não se cogitou sobre coalizão partidária para apear Dilma e entregar o poder ao PMDB dos bons companheiros Temer, Cunha e Calheiros.

Tampouco mencionou-se que os presidentes da Câmara e do Senado estão sob investigação por suspeita de corrupção na Petrobras. E, assim, sequer se discutiu sobre a legitimidade de liderança de um processo de impeachment por alguém com imputações de maracutaias.

O Ministério Público pediu a abertura de processos criminais contra Cunha e Calheiros. Se o STF aceitar a denúncia, abre a porta para o afastamento de ambos do comando do Congresso.

Cunha, Renan e outros 30 envolvidos em supostos crimes contra a Petrobras integram a maior bancada legislativa brasileira: a dos denunciados em inquéritos e ações penais com risco de prescrição no Supremo. Representam mais de um terço dos 594 deputados e senadores.

— Estamos encalacrados — ele quebrou o silêncio. — Qual a saída? E para fazer o quê?

Quando antigas certezas perdem a validade, fazer perguntas certas já é avanço, porque respostas sobre a reconstrução do Estado parecem inviáveis em meio ao estupor com sua quebra.

Mas é na política que se resolvem crises como a que está aí, ele acrescentou:

— Para fazer o que tem de ser feito, da infraestrutura à garantia do pagamento das aposentadorias, você vai ter de convencer a sociedade. Precisamos de mais sociedade. Se quer mudança maior, você vai ter que falar ao país sobre as limitações das capacidades do Estado. Precisa ter liderança para poder explicar e ter apoio, confiança, do país para mudanças. Precisa de um bloco de poder, e não é só de partidos ou de alguns setores da sociedade. Alguém vai ter de fazer isso, senão o Brasil vai desandar...

Sugeriu-se o caminho da “Constituinte exclusiva”, com pessoas eleitas para votar uma nova Constituição, sem ser parlamentares.

— É um pouco artificial — retrucou. — Não há ruptura institucional. E aqueles que iriam lá não conhecem o jogo da máquina pública. Desenhar um novo futuro glorioso para o Brasil no gabinete é fácil, qualquer um faz... Você tem é que convencer o país do caminho. Não tem outro, a não ser pela via constitucional.

Lembrou-se das manifestações de rua em junho de 2013, quando Dilma foi à televisão propor Constituinte específica para a reforma política. Fernando Henrique Cardoso contou que assistiu ao discurso ao lado do ex-ministro do STF Ayres Britto.

— Ele me disse: “Presidente, é o seguinte: a Constituição não dispõe sobre o seu funeral.” Pois é, como a Constituição não prevê a sua morte, não tem outro jeito de fazer as reformas.

José Casado

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