quarta-feira, 15 de abril de 2015

Depois dos gritos, as propostas

Novamente, no domingo passado, centenas de milhares de pessoas voltaram a rugir em mais de duzentas cidades brasileiras com o grito de protesto contra Dilma Rousseff, e contra o veneno da corrupção política que envergonha o país.

Agora, depois do grito, é urgente a chegada das propostas concretas de mudança.

Foi um grito saudável, ao revelar que os brasileiros, depois de anos de silêncio, perderam o medo do protesto. Exigem que os governantes “lhes devolvam o Brasil” sequestrado, segundo eles, por aqueles que pretendem se eternizar no poder, sem saber mais como fazer para que o país volte a crescer.

Os políticos deste país, pouco acostumados a ver a classe média, melhor informada, sair às ruas, correm o risco de demonizar essas manifestações como golpistas ou da direita. No entanto, como bem disse o vice-presidente da República, o hábil político de centro Michel Temer, as manifestações revelam uma “democracia poderosa” e os políticos têm o dever de escutar esse grito, em vez de condená-lo.

Sem ser pautadas nem organizadas, como no passado, por partidos políticos ou movimentos sociais de esquerda, as novas manifestações brasileiras refletem necessariamente desordem e, ao mesmo tempo, a criatividade de centenas de exigências, às vezes até conflitantes. Por isso agora, depois do grito que liberta e ameaça, chegou a hora de apresentar um programa capaz de transformar positivamente o país, resgatando-o da crise econômica à qual foi arrastado por uma política equivocada de desperdício de dinheiro público, assim como pela corrupção organizada que acaba atingindo os mais pobres.

Como afirmou a este jornal o analista político Thiago Aragão, as manifestações “são um meio, não um fim”. Ao não dar frutos concretos, perdem sua importância, e até acabam fortalecendo o poder que desejavam confrontar.

O perfil não violento dos últimos dois grandes protestos nacionais, e seu espírito lúdico e até festivo, revela que os brasileiros não exigem soluções revolucionárias à margem ou contra a democracia e contra a Constituição, embora saibam que esta última não representa as Tábuas da Lei e pode, às vezes, ter de ser mudada.

O Brasil e seu povo querem viver cada vez melhor. Por isso, têm medo de um retrocesso em sua qualidade de vida. Tremem diante da possibilidade de perder o emprego, de ver sua renda corroída pela inflação ou o Estado saqueado por políticos e partidos corruptos.

Se o pedido insistentemente repetido nas ruas do Brasil foi “Fora Dilma”, não é porque a ex-guerrilheira seja para eles mais ou menos simpática, ou a vejam mais ou menos de esquerda ou de direita. A querem fora da presidência porque a consideram responsável pela crise econômica que ameaça conquistas passadas, por sua pouca habilidade política, e porque carregam a dúvida de que possa ser moralmente responsável pelo escândalo da Petrobras.

Os protestos, organizados através das redes sociais por dezenas de movimentos sem partido político, foram obra dos jovens.

E tiveram uma série de méritos, além de seu caráter pacífico, em um dos países mais violentos do mundo, com altos índices de homicídios que já superam os 60.000 por ano, a maioria de negros e pobres.

Esses jovens têm arrastado um número cada vez maior de pessoas com mais idade, e até senhoras idosas das quais ganharam a confiança. Talvez as mesmas que, por estereótipos, consideram os jovens de hoje incapazes de se comprometer politicamente.

Na manifestação de domingo, foram os jovens que desmentiram a ideia de que os brasileiros se preocupam pouco com a corrupção, já que é tolerada em sua cultura, e continuam sendo eleitos políticos que “roubam, mas fazem”.

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