sábado, 16 de julho de 2016

As duas justiças do Brasil: uma prende, a outra solta

Quando o contraventor “Carlinhos Cachoeira” (Carlos Augusto de Almeida Ramos) sentou-se ao lado dos policiais federais no camburão e fez aquela cara de deboche, abrindo um sorriso maroto, o Brasil inteiro desconfiou da prisão. Cachoeiro, que já foi condenado a mais de 30 anos e não se sabe porque diabo continua solto, parecia zombar dos policiais e da cara de todo mundo. E estava certo, dias depois a desembargadora Nizete Lobato, do Tribunal Regional da 2º Região, mandou soltar o criminoso. De lambuja ainda deu liberdade para Fernando Cavendish, o todo poderoso dono da Delta, e os empresários Adir Assad, Cláudio Abreu e Marcelo Abbu.

A liberdade desses senhores do crime só evidencia uma coisa: no Brasil de hoje existem duas justiças: a que prende e a que solta. A de Curitiba, liderada pelo juiz Sérgio Moro, que continua tentando botar o país nos eixos, mesmo sob pressão dos políticos e dos empresários poderosos, prende. A outra justiça, que faz vista grossa para os ladrões do dinheiro público, solta. De acordo com a decisão do ministro Nefi Cordeiro, do Superior Tribunal de Justiça, os presos deveriam deixar o presídio de Bangu com tornozeleiras, mas um simples detalhe impediu que isso acontecesse: o Rio de Janeiro, falido, não tem dinheiro para comprar as peças eletrônicas. É o fim da picada.


Os cinco homens, que deixaram o presídio pela porta da frente, foram presos na operação Saqueador da Polícia Federal que investiga o esquema de lavagem de 320 milhões de reais. Isso mesmo, os caras desviaram 320 milhões dos cofres públicos! Com o alvará de soltura nas mãos, Cachoeiro foi deixado em um flat em Copacabana e Cavendish na Avenida Delfim Moreira, no Leblon, bairro nobre do Rio, onde é dono de um apartamento de andar inteiro com vista para o mar.

Na verdade, o prestígio de Cachoeira é que levou a liberdade dos outros presos. Condenado a mais de trinta anos, ele continua livre. Quando esteve preso em outros escândalos não fez por menos. Contratou o advogado Thomáz Bastos, ex-ministro da Justiça, por 30 milhões de reais para cuidar da sua causa. Demitiu-o depois que teve o primeiro habeas-corpus negado. O contraventor, no Brasil, ainda é o criminoso que mais goza da intimidade da Justiça. No Rio, por exemplo, eles vivem dentro e fora do presídio, na verdade, mais fora do que dentro. A jogatina continua solta pela cidade e os bicheiros trabalham em liberdade, muitos supervisionados pela própria polícia. Não é de se admirar, portanto, que ser preso com um contraventor é garantia de liberdade rápida.

A coragem do juiz Sergio Moro e de alguns abnegados procuradores do Ministério Público é um caso isolado na justiça brasileira, porque a prática é a justiça ser benevolente com os acusados de delitos. Lembra da cara que o Marcelo Odebrecht fez quando depôs em Curitiba para alguns deputados de uma CPI fajuta da Câmara dos Deputados? Foi a mesma do Cachoeira. Debochou dos parlamentares e ironizou alguns deles, quando disse que não era da sua índole fazer delações premiadas.

Soube-se depois que que a sua atitude estava respaldada na ajudinha que o ministro Ribeiro Dantas, do STJ, prometera, concedendo-lhe a liberdade em dezembro de 2015. Segundo Delcídio do Amaral, senador cassado, que participou da trama com a Dilma, o ministro foi nomeado para aquele tribunal pela presidente com a finalidade de soltar o empresário. Descoberta a conspiração, Marcelo foi condenado a 19 anos de cadeia e hoje trabalha na delação premiada para amenizar a sua pena. O ministro denunciado pelo senador perdeu apenas a relatoria do processo. Continua trabalhando sem ser incomodado. É o fim da picada.

Isso prova que a justiça do Sergio Moro não é a mesma justiça do resto do Brasil, normalmente submissa ao poder e a conchavos políticos. A do Moro prende e condena; a outra, solta.

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