Portugal se livrou de seu regime de força em 1974, com a Revolução dos Cravos. O Brasil restabeleceu a liberdade em 1985. Hoje Portugal é uma das democracias mais consolidadas do mundo, com 96 pontos em 100 possíveis na classificação da Freedom House. O Brasil alcança 75. Em 2019, Portugal cravou a 40.ª posição no ranking de desenvolvimento humano, formando no pelotão de frente. O Brasil está em 79.º, no segundo bloco.
Enquanto o Brasil peleja para arrumar suas contas públicas, passo essencial para investir na área social, Portugal fez seu ajuste no início da década, o que permitiu preservar o estado de bem-estar. Veio o coronavírus, e Portugal se tornou referência positiva dentro do padrão europeu. O Brasil é a tragédia que conhecemos. O terceiro país com mais mortos no mundo, recentemente superado pela Índia.
Talvez seja injusto comparar os dois países, dado que a população brasileira é a portuguesa multiplicada por 20, e as circunstâncias – com exceção da língua – são consideravelmente diferentes. Como talvez fosse despropositado comparar o Brasil com a Índia, que tem seis vezes a nossa população. Se continuarmos o exercício, no entanto, veremos que em muitas coisas estamos mais perto da Índia do que de Portugal. Para o bem e para o mal.
Para o bem. Índia e Brasil têm democracias vibrantes, sociedade civil engajada, universidades de excelência, cultura riquíssima e plural. Para o mal. Além de referências negativas no combate ao coronavírus, Índia e Brasil estão entre os países mais desiguais do mundo. A pandemia expôs tais desigualdades de forma dramática. A Índia pré-independência era um país de príncipes e plebeus divididos em castas. No Brasil, os príncipes estão na classe média. São os que podem trabalhar de casa, usando seus laptops, e se proteger da doença que chegou a ceifar mais de mil vidas por dia.
Nesta semana inicio um período de estudos em Política Comparada na Universidade de Lisboa. Para esta coluna, nada muda. Com a tecnologia, é possível acompanhar as notícias do mundo todo em tempo real, e redação e entrevistados estão ao alcance de um zoom. A ideia é continuar dando uma visão moderna da política. A atividade, hoje, não se desenrola apenas nos parlamentos, mas também nas redes e ruas, universidades e organizações cívicas – a tal sociedade civil.
Tudo mudou muito e em muito pouco tempo. A economia mundial cresceu. A distribuição de renda melhorou, embora a concentração tenha aumentado em alguns países. As democracias passaram a dialogar com instituições do mundo globalizado. Surgiram os populismos. Entender como os diferentes países lidam com os desafios do presente é mais esclarecedor, muitas vezes, do que mergulhar nas lições do passado. Num planeta cada vez mais integrado, é válido comparar-se tanto com a Índia quanto com Portugal.
O mote desta coluna é: nas democracias, não se melhora a vida dos cidadãos sem recorrer ao conhecimento. Quem ignora a ciência acaba como o prefeito do filme Tubarão: um político sem votos numa cidade sem banhistas. Estudar é preciso. Bora estudar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário