Injustiça! Muito dinheiro trocou de mãos, mas civilizadamente, sem que até agora alguém tenha sido apanhado em flagrante, como o senhor ridículo que corria com a mala na rua. Uma transferência contábil – como a do Refis, em que o Governo deixará de faturar pouco mais de R$ 2 bilhões, em favor de Suas Excelências – não é tão inconveniente. Os de sempre são beneficiados e transferem parte dos ganhos a seus parlamentares de estimação, sem que bons amigos do presidente tenham de rechear e entregar pacotes com suas próprias mãos. É, convenhamos, mais chique. O efeito é o mesmo, garantir ao presidente os votos de que precisa para garantir aos amigos, e aos amigos dos amigos, que a garantia continua. É algo sólido: nada de la garantía soy yo. Emendas parlamentares de R$ 15 milhões, cada? Dinheirinho para pequenas obras. É uma boa economia: só se distribui a parte de cada um, sem que se gaste um centavo na tal obra.
O caro leitor pode ficar tranquilo: Temer ultrapassa mais essa denúncia, que deve ser votada hoje. Mas, se o resultado é certo e sabido, por que tanta gentileza com os senhores deputados? Porque não ficaria bem, para Temer, derrubar a denúncia com menos votos do que teve ao derrubar a denúncia anterior. Para evitar que ele se mantenha no cargo dando a impressão de que perdeu apoio, fez-se a Grande Queima Pré-Natalina de Votos. Sabe como é, se prevalece a impressão de que o presidente se enfraqueceu, vários parlamentares passarão a exigir ainda mais por seu apoio. Evita-se então o vexame pagando adiantado para o presidente parecer forte. Muda algo? Muda: o dinheiro, por exemplo, muda do Tesouro para bolsos ávidos.
É claro que, aparentemente, é mais fino oferecer favores transformáveis em dinheiro do que dinheiro propriamente dito. Nem é preciso, por mais substanciosas que sejam as quantias transferidas, alugar apartamentos-cofre com um geddel de área construída para abrigar a fila de caixotes de notas novinhas. Mas, por maior que seja a tolerância com que se observe o mafuá das Excelências, o que está ocorrendo ultrapassa largamente a fronteira do decoro: o PMDB, por exemplo, partido de Temer, liberou seus deputados para apoiá-lo ou não. Traduzindo, o apoio ao presidente é negociado voto por voto com seus correligionários, mesmo sabendo-se que Temer foi presidente do PMDB, seu candidato em aliança com Lula e Dilma, e é a única possibilidade que o partido tem de permanecer no poder. Como esta é a última chance de derrubar o presidente, cada deputado exige o que pode. O Governo não se preocupa com isso: afinal, nós é que pagamos.
Na luta contra a denúncia, Michel Temer já convenceu todos os que poderia ter convencido (a oposição, convencida da derrota, decidiu tentar impedir o início da sessão, negando o número necessário de deputados). Mas há uma luta que Temer ainda terá de lutar, e com amplas chances de ser derrotado: as centrais sindicais não aceitam a reforma trabalhista. O motivo é o de sempre: com a extinção do Imposto Sindical, hoje cobrado de todo assalariado do país, seja ou não sindicalizado, e entregue aos sindicatos, só terá receita quem prestar serviços aos associados. Receber, sim; trabalhar para ter sócios contribuintes é outra coisa, dá trabalho. Centrais sindicais e sindicatos programam manifestações em todo o pais em 10 de novembro, véspera da entrada em vigor da reforma trabalhista. Só voltam atrás se o Governo lhes der outra receita no lugar desta.
E não se fale mal apenas de centrais e sindicatos de assalariados. Centrais e sindicatos patronais também estão pendurados no imposto.
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