terça-feira, 23 de julho de 2024

Deus apoia, nos EUA, um narcisista patológico

Há momentos na história em que se entra numa era negra quase sem se dar por ela. No caso actual, damos de tal maneira por ela que o céu já está todo negro. Parece um filme de terror, é um filme de terror. Com a escuridão vem toda uma série de prodígios maléficos, o principal é ver o Diabo à solta travestido de Deus.

Trump e toda a convenção republicana apresentam-se como os ungidos de Deus, que, pelos vistos, entrou nas eleições americanas para apoiar um narcisista patológico. Que Deus o tenha salvo da bala muito bem, é sua obrigação, mas uma outra coisa é Deus ser agora da equipa MAGA. É por isso que suspeito que, cumprida a obrigação de Deus, entrou em cena o Diabo disfarçado de Deus, de boné MAGA na cabeça, e sentou-se na primeira fila para lançar o mundo no caos e na escuridão. Vem na Bíblia em Coríntios, 2, 12:14, “o próprio Satanás disfarça-se de anjo da Luz”.


Se Trump ganhar as eleições, o mundo vai conhecer uma crise que pode ser daquelas que marcam o fim de uma era. Estou a ser catastrofista? Podem ter a certeza de que sim, estou. E, para mim, pouco valem os argumentos desculpatórios, como o de que a democracia é assim, o povo pode querer votar no Diabo, que se ele for eleito não há volta a dar, é a democracia. Não, não é. Não basta sequer apresentar o precedente de Hitler, porque a democracia não se limita ao voto popular, é o voto popular mais o primado da lei e dos procedimentos democráticos legais. As democracias não se esgotam no voto, podendo os eleitos fazer o que quiserem, sem lei nem limites ao seu poder. Isso não é democracia, mas demagogia.

Trump poderá ter a legitimidade para governar, mas não tem legitimidade para fazer o que quiser, para se substituir à lei e à Constituição, actuar como um ditador pessoal, que está acima da lei, e ser “ditador por um dia”, vingar-se dos seus adversários e entender a sua imunidade como podendo matar alguém em plena 5.ª Avenida como uma vez afirmou. Mas, quando se apresenta um homem como sendo a mão terrestre de Deus, a pressão sobre a democracia é global, porque a vontade do ungido é que é a lei. O que vale a democracia quando é a mão de Deus que está a actuar?

Trump tem os seus fiéis, OK. Mas a força de Trump não vem só daí, ela estende-se por toda uma mancha de minimizadores, que fazem a expressão wishful thinking ganhar um pleno sentido. Nestes dias, ouvi todas as versões de explicações e justificações do tipo que, afinal, há um exagero na avaliação de Trump, ele não vai fazer nada daquilo que diz que vai fazer, a OTAN e a Europa podem estar descansadas, a Ucrânia poderá, no limite, continuar a defender-se, e as instituições americanas são suficientemente fortes para o travar.

Será que se esquecem de um homem que não aceita os resultados eleitorais quando perde, tentou de forma ilegal mudá-los, que impulsionou uma tentativa de golpe de Estado a 6 de Janeiro de 2021, que ameaça com uma guerra civil, que se gaba de ter consigo os americanos que têm armas, que violou e viola todas as leis, comete fraudes como quem respira e acha que tem imunidade para fazer tudo o que quer, pela forma como moldou o Supremo Tribunal e os juízes que escolheu, politizando a justiça sem paralelo no passado, e que mostra claros sinais de desequilíbrio narcisista apresentando-se sempre como o “melhor”, “maior”, o “mais amado”, o “único capaz”, mentindo sobre tudo, dos números do crime e da imigração à sua performance no golfe. Será capaz de querer ser outro, ou de ser outro?

Tudo será grave mal ele ganhe as eleições, começará a vingança interna no minuto seguinte e, na hora seguinte, entregará a Ucrânia a Putin. Há os que dizem que Trump é “transaccional”, ou seja, se os aliados dos EUA pagarem os custos relativos à sua defesa, não haverá mudanças significativas na política americana face à OTAN e à Rússia. Duvido muito. O célebre plano para acabar a guerra na Ucrânia, e de passagem por Gaza, passa por dar a Putin e Netanyahu o que eles querem sem restrições, quando muito um qualquer acto de vassalagem ao génio da política internacional, Trump.

Há um homem que conhece bem Trump: Putin. Sob todos os aspectos. E há outro que conhece a vaidade de Trump, e isso basta: Kim Jong-un. Ambos sabem como manipulálo, embora no caso de Putin possa haver mais do que isso. Ambos querem o mundo a seus pés, a Ucrânia derrotada, a Europa subjugada, toda a terra e mar à volta da Coreia do Norte sob a chantagem nuclear da monarquia cruel iniciada por Kim Il-sung. Ambos sabem que o seu melhor instrumento é um homem, Trump, que acha ele próprio que manda em tudo e que comprou o espelho da Rainha Má a Elon Musk, que fez um espelho muito especial, que lhe responde que é sempre o melhor em tudo. Nestas coisas o Diabo é mesmo bom.

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