quarta-feira, 12 de setembro de 2018

De pai para filho: por que sobrenome ainda deve contar nestas eleições

Danielle Dytz Cunha, Flávio Bolsonaro, Marcelo Crivella Filho, João Campos, Fernando James Collor... Em comum, eles têm sobrenomes conhecidos no mundo político e a ambição de seguir os passos dos pais. Contam, além disso, com a "sorte" de poder sonhar alto - dão seus primeiros passos nas urnas já tentando vagas na Câmara e no Senado.

Centenas de filhos, maridos, esposas e netos de políticos registraram suas candidaturas na Justiça Eleitoral até o dia 15 de agosto - a data limite.
Só com avanço econômico, social e cultural é que se passa para uma situação de voto esclarecido

São muitos os estreantes. João Campos (PSB), 24 anos, filho do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos, morto em um desastre aéreo quando concorria à Presidência em 2014, vai encarar sua primeira eleição já como candidato a deputado federal.

Danielle Dytz Cunha, filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que está preso, também não pensou "pequeno" e estreia na política disputando vaga na Câmara dos Deputados pelo MDB do Rio de Janeiro.

Já Marcelo Crivella Filho conta com o apoio do pai, que é prefeito do Rio de Janeiro, para alcançar uma vaga de deputado federal. É a primeira eleição dele.

Eduardo Bolsonaro, filho do candidato à Presidência Jair Bolsonaro, tenta se reeleger como deputado federal.

O irmão mais velho dele, Flávio Bolsonaro, está no grupo dos que tentam alçar voos maiores que em 2014: quer saltar direto de deputado estadual no Rio de Janeiro para senador.

Irajá Abreu, filho da senadora Kátia Abreu, que é vice na chapa de Ciro Gomes à Presidência, vive situação parecida e tenta trocar a Câmara dos Deputados pelo Senado.


Enquanto tenta se eleger governador de Alagoas, o senador Fernando Collor quer garantir um sucessor no Congresso, seu filho Fernando James Collor, candidato a deputado federal.

Os dois vão percorrer o Estado nordestino juntos para tentar derrotar outra dupla de pai e filho com tradição na política: Renan Calheiros (MDB), que tenta a reeleição ao Senado, e Renan Filho, que quer se reeleger governador de Alagoas.

No Pará, outro político tradicional do MDB, Jader Barbalho, candidato ao Senado, percorre o Estado em campanha com o filho Helder Barbalho, que tenta se eleger governador. Os dois lideram as intenções de voto.

E, enquanto o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral segue preso, acusado de comandar um esquema de corrupção, o filho dele, Marco Antônio Cabral, faz campanha para se reeleger deputado federal.

O professor de ciência política Claudio Couto, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), faz um paralelo do fenômeno do "mandato de pai para filho" com famílias que há gerações seguem a mesma profissão.

"A política é uma atividade profissional que precisa ser desempenhada em tempo integral. Assim como em outras profissões em que a gente vê médico filho de médico, advogado filho de advogado, não é diferente na atividade política", diz.

"E, assim como em outras profissões, há uma vantagem em seguir a profissão dos pais: você tem uma rede formada que facilita do ponto de vista de ter aliados, apoiadores, financiadores e um aprendizado que vem desde a infância."

Mas será que, em meio ao clamor por "renovação", o parentesco com políticos tradicionais vai contar a favor nas urnas em outubro?
Sistema político que favorece eleição de parentes

Dados referentes à última eleição indicam que, para a Câmara, o sobrenome contou, e muito, na última disputa. Levantamento feito pelo Transparência Brasil, instituto voltado ao monitoramento de órgãos públicos, revelou que 49% dos deputados eleitos em 2014 eram filhos, netos, esposas ou maridos de políticos com mandato - um aumento de cinco pontos percentuais em relação aos eleitos em 2010.

Entre os deputados federais com até 35 anos, 85% dos eleitos em 2014 são herdeiros de famílias políticas.

Para especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, o sistema político-eleitoral brasileiro continuará a favorecer candidatos que tenham fortes ligações com lideranças partidárias, ainda que haja uma rejeição popular à política e a políticos tradicionais.

Três fatores contam particularmente a favor das candidaturas de parentes de políticos influentes: o fato de o nome ser mais facilmente lembrado pelos eleitores, acesso a financiamento para a campanha e o controle da máquina partidária nos redutos eleitorais, com a mobilização de cabos eleitorais e da militância.

"Da mesma forma que para um parlamentar que já está no poder é mais fácil se reeleger, quem tem um parente na estrutura de poder consegue se eleger mais facilmente", afirmou à BBC News Brasil Juliana Sakai, diretora de operações do Transparência Brasil.

"Além do próprio nome, que torna a pessoa mais conhecida do eleitorado, tem a questão de que o voto é totalmente ligado ao financiamento da campanha."
Um nome para lembrar

Em outubro, a população terá que optar por um candidato a deputado federal, a deputado distrital ou estadual, senador, governador e presidente da República. Só para deputado federal são mais de 8 mil candidatos em todo o Brasil.

Em São Paulo, o eleitor escolherá dentre 1.675 concorrentes. Ou seja, uma das principais tarefas de quem disputa uma eleição é simplesmente conseguir ter o nome lembrado. Os candidatos que têm sobrenomes conhecidos largam com vantagem na corrida eleitoral.

"Para a Câmara, são muitos os candidatos e muitas as vagas para cada Estado para preencher as 513 cadeiras. Portanto, serão mais votados os candidatos mais lembrados. Existe um eleitorado que vai rejeitar políticos com sobrenomes de pessoas investigadas, mas esses políticos acabam, mesmo assim, sendo mais escolhidos que outros mais desconhecidos", avalia Sakai.

"Um dos desafios que os políticos têm é se tornarem conhecidos do eleitorado. Quem já tem o nome conhecido já resolveu esse problema de antemão", reforça Claudio Couto, da FGV.

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