domingo, 8 de abril de 2018

A eterna aposta do PT no mito

Trinta e oito anos depois de sua fundação, o Partido dos Trabalhadores renova sua aposta em Lula, o ex-operário que chegou à Presidência, hoje um homem condenado à prisão. Em fevereiro de 1980, o partido surgia da convergência entre o sindicalismo emergente, setores progressistas da Igreja católica, intelectuais e militantes de grupos de esquerda derrotados na luta armada contra a ditadura. O sindicalista Luiz Inácio da Silva, o Lula, aparecia como um catalisador da utopia de levar a classe operária ao paraíso. Nascia o mito, criação coletiva desses grupos que projetavam no carismático líder suas aspirações de poder.

Em janeiro de 2003, Lula chegou lá. Com 52.793.364 votos, tomou posse no Planalto. Sobreviveu ao escândalo do mensalão, que começou a ceifar o PT, e foi reeleito em 2006. Deixou o governo em 2011 com a aprovação de 83% dos brasileiros, um recorde histórico. Elegeu e reelegeu sua ministra Dilma Rousseff como sucessora.

Para vencer e governar, suavizou a carranca de sindicalista, aparou a barba, vestiu ternos bem cortados. E uniu-se àqueles que chamava de inimigos, a elite empresarial e os “300 picaretas” no Congresso.

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Em 2016, dois anos após o início da Operação Lava-Jato, os efeitos da descoberta dos sofisticados esquemas de corrupção entre o PT e seus novos aliados foram mortais: o partido elegeu 256 prefeitos, menos da metade dos 630 eleitos em 2012. Lula não escapou às denúncias. Na primeira vez que esteve frente a frente com o juiz Sérgio Moro, em maio do ano passado, indicou como enfrentaria processos em série por corrupção — o confronto com a Justiça, a vitimização e uma nova investida eleitoral.

Radicalizou o discurso e adicionou toques de messianismo: “Pensarei pela cabeça de vocês”; “Andarei pelas pernas de vocês”. Confiou na parcela de 37% dos eleitores que, mesmo depois da condenação do petista em segunda instância, em janeiro, declarou o voto no ex-presidente.

Lula jogou todas as fichas na força de sua imagem. Entrincheirou-se num símbolo de sua trajetória, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Cercou-se de militantes e antigos aliados que fizeram vigília desde que o juiz Moro decretou sua prisão, no fim da tarde de quinta-feira. Resistir foi a palavra de ordem. Mas as manifestações restringiram-se aos companheiros de sempre. Aqueles que historicamente gravitam em torno do PT. Revezaram-se ao microfone enquanto negociava-se o roteiro para o ato da prisão.

O momento da perda da liberdade é precioso para a construção da narrativa eleitoral. O PT quer apresentar ao país um homem preso e vítima de perseguição política como candidato ao Planalto. Pretende sustentar a ideia de que eleição sem Lula é uma fraude.

O enredo petista, no entanto, esbarrará em obstáculos concretos — novas possíveis condenações em outros processos da Lava-Jato, por exemplo. E, sobretudo, a impossibilidade legal de levar o ex-presidente até a urna, depois que a Justiça Eleitoral negar-lhe o registro da candidatura, por força da Lei da Ficha Limpa.

Há quarenta anos Lula é personagem central no país. Cresceu à frente do PT pregando ética e honestidade. O envolvimento com o mensalão e a Lava-Jato desconstruiu esse discurso e igualou os petistas e seu líder aos demais partidos e políticos que combatiam. Refazer as pontes que os levaram ao poder poderá exigir bem mais do que a imagem do mito encarcerado.

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