A Venezuela conta com forte apoio dos seus militares e do eixo euroasiático formado por Rússia, China, Coréia do Norte e Irã, além do apoio de Bolívia, Cuba, Honduras e Nicarágua. Esse sistema de alianças garantirá a sobrevivência do regime venezuelano, mesmo diante do bloqueio econômico que certamente sofrerá dos Estados Unidos e da União Europeia, além de Argentina, Chile, Costa Rica, Panamá, Peru, República Dominicana e Uruguai, países com os quais rompeu relações diplomáticas. Os esforços do Brasil e da Colômbia, que ainda tentam uma saída negociada para a crise venezuelana, estão fracassando.
É uma situação delicada para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que sofre grande desgaste interno em razão de suas relações históricas com o chavismo e uma posição que muitos consideram dúbia, por causa de declarações que contemporizam com Maduro e, de certa forma, teceram o roteiro que o venezuelano pretende seguir para se legitimar perante o Brasil. Lula havia dito que a oposição deve contestar os resultados oficiais na Justiça, como se houvesse independência do Legislativo e do Judiciário na Venezuela. Maduro agarrou a proposta com as duas mãos.
É uma espécie de feitiço contra o feiticeiro. O ativismo diplomático de natureza ideológica de Lula na América Latina, desde a posse, coleciona fracassos, porque não dá conta das contradições e diversidade política da região, ao contrário da nossa tradição de política externa pragmática e independente, que poderia ser mais bem sucedida sem esse viés esquerdista. Todos os setores democráticos que apoiaram Lula contra Jair Bolsonaro, em 2022, para interromper a deriva autoritária em que o país estava, agora cobram seu posicionamento contra a permanência de Maduro no poder. Não foi por falta de aviso.
A possibilidade de o Brasil, a Colômbia e o México serem fiadores de uma solução negociada do impasse subiu no telhado: Maduro precisaria reconhecer a derrota ou convocar novas eleições, sob supervisão internacional. Isso dependeria de uma escalada de endurecimento da posição dos Estados Unidos e de uma fissura interna nas Forças Armadas. Não parece ser o que vai acontecer.
A América Latina passa por uma curva da história, moldada pela presença crescente da China, com investimentos em infraestrutura e recursos vitais, que desafiam a influência dos Estados Unidos na região. A China é um parceiro valioso, principalmente para o Brasil, apesar dos riscos de dependência econômica.
Essa disputa com os Estados Unidos, porém, no caso da Venezuela, tem um ingrediente muito perigoso: o pacto militar com a Rússia, que fornece equipamentos bélicos às Forças Armadas venezuelanas. Os militares ganham mais força e poder durante o governo de Hugo Chávez, entre 1999 e 2013. Sua fidelidade ao governo sustenta-se no poder (ocupam cargos importantes), no dinheiro (controlam petróleo e minérios) e no medo (a dissidência não é tolerada).
A tensão entre Venezuela e Guiana sobre o território do Essequibo, por causa do petróleo, exacerba essa influência militar. A presença dos Estados Unidos na América Latina continua hegemônica, mas precisa oferecer alternativas aos investimentos chineses, manter o equilíbrio geopolítico e respeitar a soberania dos países da região. Diplomacia e cooperação precisam caminhar de mãos dadas com a democracia, os direitos humanos e o desenvolvimento sustentável.
Um ambiente de paz e equilíbrio na região depende muito do posicionamento do Brasil, que tem 1.987.000 militares na ativa, além de 84 milhões de reservistas. O Brasil possui 723 aviões, 255 helicópteros, 1.707 veículos terrestres, 180 lançadores de foguetes, 110 embarcações e cinco submarinos de combate. Em contraste, a Venezuela conta com 280 aviões, 104 helicópteros, 700 veículos terrestres, 52 lançadores de foguetes, 50 embarcações e dois submarinos.
Entretanto, por causa da Venezuela, crescem a instabilidade e o risco de confrontos na região. No caso da Guiana, a presença de ExxonMobil e as ameaças de anexação de Essequibo pela Venezuela farão com que os americanos queiram implantar uma base militar no país vizinho, uma ex-colônia britânica. O foco dos Estados Unidos na América Latina é a garantia dos seus interesses comerciais, políticos e geoestratégicos, e a consolidação de sua posição como liderança em todo o continente americano.
O Brasil precisa ser claro em relação à sua parceria com os Estados Unidos, um aliado estratégico regional para questões de segurança, como na Segunda Guerra Mundial, quando o país se juntou aos aliados no combate ao nazifascismo na Europa. Mas também como um parceiro comercial, pois é o principal destino de nossas exportações industriais, afora o potencial de parcerias nos campos do pré-sal.
Luiz Carlos Azedo
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