Quando conheci Luiza de Paula, estava no Pão de Açúcar, sobre os telhados do Rio de Janeiro. A princípio, não achei muito fácil conversar com ela. A bióloga de 29 anos era treinada para subir pedras lisas de granito sem escorregar e acabar sentada no traseiro – e fez isso bem melhor que, digamos assim, um jornalista alemão. Acima de tudo, ela tinha uma reação estreita com o granito. Em nossa caminhada, conversamos muito sobre placas de pedras. "Na verdade, estas placas estão cheias de vida”, disse Luiza de Paula. Agarrou-se com destreza em um galho, escalou mais um trecho e apontou as fendas e rachaduras entre as rochas. Bromélias! Orquídeas! Cactos! Musgos e algas azuis!
Há pouco tive a oportunidade de rever a bióloga, em Berlim. Luiza de Paula estava terminando de escrever sua tese de doutorado na Universidade de Rostock, e queria estar capacitada a usar novos métodos científicos para o seu grande sonho. Estava se propondo a descobrir muitas espécies de plantas em sua terra, pesquisá-las e catalogá-las da melhor maneira possível. "Brasil é o país mais rico do mundo no que diz respeito à diversidade de espécies de plantas”, me esclareceu. Da Floresta Tropical no Norte até a Mata Atlântica, dos desertos no Nordeste até o Pantanal úmido e quente.
Disse isso orgulhosa – mas parecia triste. O que foi, Luiza? "Hoje em dia estão desaparecendo muitas espécies de plantas no Brasil – e muitas não poderão sequer constar em nosso catálogo, antes de deixarem de existir.”
Os biótopos brasileiros, dizem os botânicos, estão sendo atacados por toda parte. Nas cidades, nas zonas industriais e minerações que se expandem. Na Floresta Amazônica sendo desmatada, em Minas Gerais nas barragens que se rompem e envenenam rios inteiros. Montanhas inteiras vêm sendo escavadas por tratores e, junto com elas, vão-se todas as plantas e os animais. E também suas pedras de granitos que se transformam em placas decorativas para cozinhas e banheiros. O Código Florestal e incontáveis leis de meio ambiente foram enfraquecidas drasticamente nos últimos anos. Áreas de preservação nacional foram invadidas por garimpeiros e madeireiros. Os órgãos oficiais do governo pouco fazem para impedir tudo isso.
Quando Luiza de Paula falava sobre essas coisas, ela não tinha o tom furioso de um ambientalista. Soava mais como uma profissional frustrada, uma cientista que teve seu trabalho interrompido. "Não conseguimos cumprir as metas”, diz a pesquisadora. Sobretudo nas regiões mais distantes do Brasil – na Floresta tropical, mas também em outras áreas do interior – pressupõe-se que existam inúmeras espécies ainda não pesquisadas.
Ela mesma já esteve presente em expedições nas quais famílias inteiras de novas plantas foram encontradas. Uma de suas plantas, recém-descoberta em Minas Gerais, foi até mesmo denominada com o nome da jovem pesquisadora. "Nos anos 1990 até 2006 foram descobertas novas espécies de plantas no Brasil a cada dois dias”, disse. E, mesmo assim, os botânicos presumem que só conheçam uma fração de todas elas.
Tudo bem. Fiz as perguntas desagradáveis. Não foi sempre assim, Luiza, plantas e animais entram em extinção? Não é este o curso da natureza?
"Atualmente a extinção não se dá através da natureza. Ela é antropogênica, provocada pelo homem. E está mais acelerada do que antes."
Mas precisamos de todas essas plantas? Você mesma disse que ninguém as conhece?
"Hoje em dia estamos perdendo tanto conhecimento genético! Nas plantas estão respostas para muitas de nossas perguntas: utilização medicinal, nutrição, e assim por diante”.
Mesmo?
"Quer um exemplo? Meu time de pesquisadores encontrou muitas plantas que quase secam por completo e, apesar disso, sobrevivem. No aquecimento global certamente vamos precisar do mapeamento genético destas plantas. Talvez possamos transferir esse gene para outras plantas, para milho ou soja.”
Talvez, acrescentou, isso possa nos salvar da fome. Luiza de Paula se via, como muitos de seus colegas, em uma corrida contra o tempo: desvendar o conhecimento da natureza brasileira e torná-lo útil ao ser humano, antes de que ele desapareça para sempre. O herbário no qual ela depositava plantas secas era chamado por ela, de brincadeira, de "nosso cemitério”. Mas acreditava que a morte da natureza brasileira não preocupa a maioria das pessoas.
"Hoje em dia estamos muito afastados da natureza”, disse Luiza. "Há pessoas que olham para um prato de arroz, comem dele todos os dias... mas quem ainda tem a noção de que veio de uma planta, e de como é a vida dessa planta?”
Thomas Fischermann
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