A foto estampada na matéria publicada ontem pelo Estado sobre a decisão de Dilma ilustra à perfeição a farsa encenada como derradeiro recurso para impedir que a rejeição das contas do governo pelo TCU resulte na abertura de um processo de impeachment no Congresso. Tendo ao fundo uma foto oficial com a imagem desbotada da presidente da República, o protagonista da pantomima, Luís Inácio Adams, de olhos arregalados e dedo em riste, verbera contra a “politização” do processo que corre no TCU. A seu lado esquerdo, com a expressão de alheamento de quem gostaria de estar em outro lugar, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. À direita, com indisfarçado constrangimento, está o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Dilma poderia ter escalado dois avalistas mais convincentes para a performance de Adams.
Augusto Nardes, no entanto, embora tenha de fato deixado transparecer – consequência natural do intenso assédio dos jornalistas – sua tendência pela rejeição das contas do governo, jamais havia explicitado seu voto, que ficou claro quando, atendendo ao Regimento Interno do tribunal, distribuiu para os demais ministros a minuta de seu relatório e do parecer prévio, documentos cujo teor inevitavelmente caiu no domínio público. De resto, é óbvio que o governo jamais se teria dado ao trabalho de questionar como antirregimental e acusar de “politização” o comportamento do juiz relator se ele tivesse alardeado voto pela aprovação das contas.
De qualquer modo, o relator não pode ser acusado de ter tentado obstruir a defesa do governo, até mesmo diante de recursos claramente protelatórios, como os pedidos de ampliação dos prazos para que a Advocacia-Geral da União apresentasse seus argumentos. Luís Inácio Adams teve um tempo extra de 30 dias para expor suas razões numa peça de defesa adicional de mais de mil páginas.
O recurso agora anunciado em desespero de causa pelo governo constitui, além de um escárnio a quem não é idiota, uma afronta à instituição e aos ministros do Tribunal de Contas. Pedir o afastamento de um relator de cuja opinião o Poder Central discorda equivale a sujeitar todos os membros daquela Corte – vinculada ao Poder Legislativo – ao arbítrio político dos donos do poder. Esse é o padrão “bolivariano” imposto em países admirados – e invejados – pelo lulopetismo, como Venezuela, Equador, Bolívia, Argentina. Felizmente, porém, as instituições democráticas, que repousam em fundamentos como a distinção entre Estado e governo e a consequente separação e autonomia dos poderes, têm-se revelado suficientemente sólidas entre nós para impedir o avanço de aventuras autoritárias.
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