segunda-feira, 13 de julho de 2015

A corrupção se tornou finalidade


A corrupção é a finalidade. Não pode ser tratada como se fosse um penduricalho em operações com contratos públicos ou privados. Enquanto isso não for percebido pela sociedade, inquéritos não vão esclarecer toda a extensão da enfermidade. Basta que o delito se torne mais discreto para sair da mira da opinião pública, até surgir uns tantos anos depois com mais força.

"Malfeitos" não são de hoje, como lembram os defensores do governo. Mas há uma tendência ao crescimento dos percentuais que é reveladora de que o parasita se tornou dominante.

O exemplo recente mais claro dessa precedência do desvio sobre a norma é a coincidência entre os números de dois investimentos da Petrobrás nos Estados Unidos, a compra da refinaria de Pasadena, e a abortada compra de uma área de produção no Estado de Colorado, tema de reportagem na edição de março da revista "Piauí", chamada "Padrão Petrobrás".

Os dois negócios começam com valores em torno de US$ 40 milhões. Em Pasadena, quando a Petrobras entra na parada, inicia-se uma operação de multiplicação que ao final elevou em 45 vezes o custo pago pela empresa brasileira.

No caso dos poços no Colorado, uma companhia americana pedia pouco mais de US$ 40 milhões por uma área petrolífera. Uma empresa intermediária oferece o negócio à Petrobras por US$ 270 milhões (multiplicação por sete). A negociação avança. Quando analisavam um documento descritivo do negócio que seria levado ao conselho da empresa brasileira, os advogados americanos contratados pela petrolífera brasileira se dão conta de que nesse texto não há referência ao valor original, apenas ao preço maior pedido pelo intermediário. Eles alertam os advogados brasileiros da Petrobras sobre a falta da informação crucial.

A resposta do escritório carioca aos colegas estadunidenses é muito clara: o negócio não seria realizado se não fosse pelo valor maior. Indignados, os americanos denunciaram a irregularidade em correspondência direta para a diretoria da Petrobras, incluindo o então presidente, José Sérgio Gabrielli, e a então diretora e depois presidente Graça Foster. Está tudo documentado em ação na Justiça americana da intermediária contra o vendedor da área petrolífera. E o que aconteceu? O negócio realmente não foi celebrado e nenhum envolvido na operação fraudulenta foi punido.


Esquema semelhante, de produção de oportunidades para a corrupção, pode ser observado nas grandes obras viárias que custam tanto dinheiro em todo o país: se a engenharia de trânsito já provou que elas não evitam os congestionamentos, ao contrário, aumentam-nos, conclui-se que são um fim em si, ou melhor, um meio para privatizar dinheiro público.

Outra realização governamental, tão brasileira quanto a jabuticaba, é a obsessão com as grandes hidrelétricas. Também só faz sentido se a entendermos como parte do sistema de produção da corrupção. Estudos, reconhecidos pelo Tribunal de Contas da União, mostram que o Brasil desperdiça cerca de 30% da energia que produz. As providências para reduzir essa perda custam menos do que construir novas hidrelétricas. Mas não beneficiam as grandes empreiteiras. Não é só mera coincidência portanto que o governo federal desenhe um plano centi-bilionário de construção de hidrelétricas na Amazônia e não avance nada em renovação do parque instalado, redução de consumo ou novas formas de geração de eletricidade.

Enquanto continuarmos a olhar a corrupção como um defeito marginal dos gastos públicos, a sociedade não vai se dar conta de que grandes projetos em verdade são feitos para viabilizar o vício.

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