Imagina-se que Lovren exultou com a manifestação que no início deste mês juntou milhares de pessoas na capital do seu país, Zagreb, num protesto contra as medidas impostas pelas autoridades para combater a propagação do novo coronavírus. “A Covid-19 é uma mentira, não somos todos ‘covidotes’”, ou “Tirem a máscara, apaguem a televisão, vivam plenamente a vossa vida”, lia-se em alguns dos cartazes exibidos pelos participantes, apesar de uma segunda vaga da pandemia ser já, na altura, equacionada na Europa. Dir-se-ia, até, que a satisfação de Lovren chegou ao júbilo: os manifestantes antimáscaras, antidistanciamento e, sobretudo, antivacinas que convergiram de toda a Croácia para Zagreb talvez só tenham sido superados em número pelos cerca de 20 mil correligionários que num domingo de agosto se concentraram para o mesmo protesto em Berlim, organizado pela extrema-direita, que lhe chamou “Dia da Liberdade”, título do filme sobre a Wehrmacht (o exército alemão), de 1935, dirigido por Leni Riefenstahl, a cineasta que trabalhou ao serviço do aparelho de propaganda de Hitler. Ou seja, os manifestantes croatas terão ganho aos colegas de Paris, Madrid, Zurique, Londres e Roma. Na concentração na capital italiana, e só na aparência deslocados, alguns participantes empunhavam bandeiras de apoio a Trump. E, por sinal, uma sondagem feita pela Gallup nos EUA, em julho/agosto, assinalou que 35% dos inquiridos responderam que não tomariam a vacina contra o SARS-CoV 2, mesmo que estivesse aprovada pela FDA (Food and Drug Administration) e fosse gratuita. Aquela percentagem corresponde a mais de 100 milhões de habitantes do país…
O médico João Júlio Cerqueira, criador do projeto SCIMED-Ciência Baseada na Evidência, considera, em declarações à VISÃO, que estamos a assistir a uma “fusão de paranoias” em que “os proponentes de terapias alternativas e de bem-estar se juntam aos apoiantes da extrema-direita” na oposição às medidas oficiais para conter a pandemia. Há “dezenas de estudos” que “demonstram que os doentes seguidos por terapeutas alternativos têm muito maior desconfiança relativamente à vacinação”, acrescenta. E a “fusão de paranoias”, deteta o médico, funciona sob a mesma mensagem: “O vírus é uma desculpa para um enredo de proporções totalitárias, projetado para acabar com a liberdade de movimento, reunião, expressão e – para o horror de alguns na indústria do bem-estar – impor um programa de vacinação em massa.” Estes grupos, resume João Júlio Cerqueira, “são um poço de desinformação” e vão causar estragos na contenção da pandemia.
“É compreensível o receio face a uma ‘vacina feita à pressa’”, diz João Júlio Cerqueira. “Ao contrário de um medicamento, uma vacina é dada a pessoas sem qualquer doença, pelo que a segurança é, de facto, o fator mais relevante”, acrescenta. E a vacina russa alardeada por Putin em nada ajuda. “Foram realizados apenas os ensaios mais precoces – fase 1 e fase 2 -, com uma amostra bastante pequena e usando maioritariamente pessoas jovens, pelo que não sabemos qual será o efeito em outros grupos demográficos e numa amostra de maior dimensão”, explica o criador do SCIMED-Ciência Baseada na Evidência. E o grande perigo é o de, caso corra mal, “a experiência russa colocar em causa a credibilidade das restantes vacinas”.De outra ordem são os receios relativos aos efeitos secundários e à eficácia da vacina para o SARS-CoV 2, que pode vir a estar disponível no final deste ano. E não faltam sondagens recentes a refletir aquelas apreensões. Em agosto foi divulgada uma pesquisa feita pela Ipsos em 27 países (Portugal não incluído), por encomenda do Fórum Económico Mundial, em que 74% dos inquiridos responderam que tomariam a vacina contra o novo coronavírus, se já existisse, mas em que, entre quem disse que não a inocularia, 54% aludiram a receios sobre os efeitos secundários e 29% a dúvidas acerca da sua eficácia. Quanto a um estudo que incluiu Portugal, publicado em junho no European Journal of Health Economics, 21% dos inquiridos mostraram-se indecisos pelas mesmas razões.
A boa notícia, por outro lado, é que “a criação de uma nova vacina começa a ser cada vez menos difícil, graças ao ‘know-how’ e à inovação tecnológica”, diz o médico. Significa isto “não só a criação da vacina em tempo menor, como iniciar os testes com relativa rapidez”. É isso que “está a acontecer com as mais de 100 vacinas que competem entre si para chegar ao mercado, e dar resposta à pandemia do SARS-CoV 2”, verifica o clínico.
Mas há que colocar a hipótese de a vacina falhar ou de demorar demasiado a chegar. Aí, “dificilmente teremos outra hipótese que não passe pela imunidade de grupo”, diz João Júlio Cerqueira. E, nesse campo, “começam a existir alguns sinais que podem ser positivos”, embora com características “preliminares”, nota o médico. Por exemplo, “há pessoas que parecem ser imunes ao SARS-CoV 2 graças ao contacto com outros coronavírus”. E mesmo havendo indivíduos que não produzem anticorpos protetores contra o SARS-CoV 2, após exposição ao coronavírus, “essas pessoas podem ser imunes graças à memória das células T”, que atacam congéneres infetadas por vírus, levando à sua destruição e cessando os processos de replicação viral, “algo que não é estudado nos testes serológicos”, diz o criador do SCIMED-Ciência Baseada na Evidência.
Pensa-se que a imunidade de grupo se estabelece numa baliza percentual situada entre 60% e 85% de uma população. Mas também há quem defenda que aquelas percentagens podem ser mais baixas. E existe aqui um forte caso para apresentar: depois de brutalmente afetada pela pandemia, a cidade brasileira de Manaus regista agora uma redução significativa e “inexplicável” do número de infeções, ao mesmo tempo que atingiu uma “imunidade na ordem dos 20%”, anota João Júlio Cerqueira.
Ao contrário do que diz o futebolista internacional croata Lovren, que acredita em vacinas com “microchips de nanotecnologia” para controlar o nosso comportamento, o “jogo” não acabou. E ainda bem.
O médico João Júlio Cerqueira, criador do projeto SCIMED-Ciência Baseada na Evidência, considera, em declarações à VISÃO, que estamos a assistir a uma “fusão de paranoias” em que “os proponentes de terapias alternativas e de bem-estar se juntam aos apoiantes da extrema-direita” na oposição às medidas oficiais para conter a pandemia. Há “dezenas de estudos” que “demonstram que os doentes seguidos por terapeutas alternativos têm muito maior desconfiança relativamente à vacinação”, acrescenta. E a “fusão de paranoias”, deteta o médico, funciona sob a mesma mensagem: “O vírus é uma desculpa para um enredo de proporções totalitárias, projetado para acabar com a liberdade de movimento, reunião, expressão e – para o horror de alguns na indústria do bem-estar – impor um programa de vacinação em massa.” Estes grupos, resume João Júlio Cerqueira, “são um poço de desinformação” e vão causar estragos na contenção da pandemia.
“É compreensível o receio face a uma ‘vacina feita à pressa’”, diz João Júlio Cerqueira. “Ao contrário de um medicamento, uma vacina é dada a pessoas sem qualquer doença, pelo que a segurança é, de facto, o fator mais relevante”, acrescenta. E a vacina russa alardeada por Putin em nada ajuda. “Foram realizados apenas os ensaios mais precoces – fase 1 e fase 2 -, com uma amostra bastante pequena e usando maioritariamente pessoas jovens, pelo que não sabemos qual será o efeito em outros grupos demográficos e numa amostra de maior dimensão”, explica o criador do SCIMED-Ciência Baseada na Evidência. E o grande perigo é o de, caso corra mal, “a experiência russa colocar em causa a credibilidade das restantes vacinas”.De outra ordem são os receios relativos aos efeitos secundários e à eficácia da vacina para o SARS-CoV 2, que pode vir a estar disponível no final deste ano. E não faltam sondagens recentes a refletir aquelas apreensões. Em agosto foi divulgada uma pesquisa feita pela Ipsos em 27 países (Portugal não incluído), por encomenda do Fórum Económico Mundial, em que 74% dos inquiridos responderam que tomariam a vacina contra o novo coronavírus, se já existisse, mas em que, entre quem disse que não a inocularia, 54% aludiram a receios sobre os efeitos secundários e 29% a dúvidas acerca da sua eficácia. Quanto a um estudo que incluiu Portugal, publicado em junho no European Journal of Health Economics, 21% dos inquiridos mostraram-se indecisos pelas mesmas razões.
A boa notícia, por outro lado, é que “a criação de uma nova vacina começa a ser cada vez menos difícil, graças ao ‘know-how’ e à inovação tecnológica”, diz o médico. Significa isto “não só a criação da vacina em tempo menor, como iniciar os testes com relativa rapidez”. É isso que “está a acontecer com as mais de 100 vacinas que competem entre si para chegar ao mercado, e dar resposta à pandemia do SARS-CoV 2”, verifica o clínico.
Mas há que colocar a hipótese de a vacina falhar ou de demorar demasiado a chegar. Aí, “dificilmente teremos outra hipótese que não passe pela imunidade de grupo”, diz João Júlio Cerqueira. E, nesse campo, “começam a existir alguns sinais que podem ser positivos”, embora com características “preliminares”, nota o médico. Por exemplo, “há pessoas que parecem ser imunes ao SARS-CoV 2 graças ao contacto com outros coronavírus”. E mesmo havendo indivíduos que não produzem anticorpos protetores contra o SARS-CoV 2, após exposição ao coronavírus, “essas pessoas podem ser imunes graças à memória das células T”, que atacam congéneres infetadas por vírus, levando à sua destruição e cessando os processos de replicação viral, “algo que não é estudado nos testes serológicos”, diz o criador do SCIMED-Ciência Baseada na Evidência.
Pensa-se que a imunidade de grupo se estabelece numa baliza percentual situada entre 60% e 85% de uma população. Mas também há quem defenda que aquelas percentagens podem ser mais baixas. E existe aqui um forte caso para apresentar: depois de brutalmente afetada pela pandemia, a cidade brasileira de Manaus regista agora uma redução significativa e “inexplicável” do número de infeções, ao mesmo tempo que atingiu uma “imunidade na ordem dos 20%”, anota João Júlio Cerqueira.
Ao contrário do que diz o futebolista internacional croata Lovren, que acredita em vacinas com “microchips de nanotecnologia” para controlar o nosso comportamento, o “jogo” não acabou. E ainda bem.
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