A investigação começou no gabinete do Zero Um, que foi alçado de deputado estadual a senador. Não se sabe onde terminará, e nem se o presidente acabará entre os afogados.
Até aqui, o Ministério Público já afirmou que o escritório parlamentar de Flávio abrigava uma “organização criminosa”, com “clara divisão de tarefas” para desviar dinheiro público.
A ponta mais visível do esquema é a “rachadinha”, o truque de embolsar parte dos salários de assessores. Os dados bancários poderão esclarecer outas suspeitas, como a conexão da família presidencial com as milícias.
O faz-tudo Fabrício Queiroz continua sumido. Foram dele os cheques que abasteceram a conta da primeira-dama com R$ 24 mil. Se não bastassem as transferências para Michelle, o presidente fez questão de trazer o foco do inquérito para si.
“Querem me atingir, venham para cima de mim”, desafiou. Ele reclamou de “esculacho”, mas não explicou a evolução patrimonial do herdeiro. No mesmo dia, recitou a palavra “impeachment”, que ainda não estava na boca dos adversários.
O tsunami não foi a única onda gigante da semana. Na quarta, protestos pela educação se espalharam pelo país. O presidente chamou os manifestantes de “imbecis”, o que deve engrossar novos atos contra o governo.
Na sexta, Bolsonaro divulgou um texto apócrifo, afirmando que o país “é ingovernável” sem os “conchavos” que ele se recusaria a fazer. “Que poder tem, de fato, tem o presidente do Brasil?”, questiona a mensagem.
O texto descreve Bolsonaro como refém das “corporações”, entre elas o Congresso, a Justiça e até as Forças Armadas. No fim, traça um cenário de “ruptura institucional irreversível, com desfecho imprevisível” e recomenda a venda de ativos brasileiros.
O tom apocalíptico lembra a carta-renúncia de Jânio Quadros, outro presidente que chegou ao poder com discurso messiânico. Na campanha, ele brandia uma vassoura com a promessa de limpar a “bandalheira” da política. No poder, perdeu-se em atitudes e medidas excêntricas, como a proibição da briga de galo e do maiô de duas peças.
Em agosto de 1961, Jânio escreveu que desejou “um Brasil para os brasileiros”, mas foi “esmagado” por “forças terríveis”. A renúncia, sete meses depois da posse, foi uma tentativa frustrada de emparedar o Congresso. “Imaginei que o povo iria às ruas, seguido dos militares, e que seria chamado de volta. Deu tudo errado”, ele confessaria, três décadas depois.
<p>Bolsonaro já imitou o antecessor nas cruzadas conservadoras. Censurou a propaganda de um banco público porque não gostou dos figurantes e ofendeu homossexuais ao dizer que o país dispensa o “turismo gay” porque “nós temos famílias”.
Ao flertar com a radicalização, o presidente sugere que o fantasma de Jânio continuará a nos assombrar.Bernardo Mello Franco
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