Depois de milênios de guerra, o Capeta e o Padre Eterno decidiram entender-se, para bem da humanidade. Acertaram implantar uma ponte entre o Céu e o Inferno, de forma a se comunicarem sempre que suas tropas clamassem pelo Armagedon. Cada um construiria metade da obra. Passaram-se meses e quem prestasse atenção veria o perfeito andamento das estruturas que saiam das profundezas e chegavam ao meio do caminho para as alturas. O problema estava em que, de lá de cima, nenhum parafuso e nenhuma pilastra haviam sido assentados para chegar em baixo.
Um vazio completo fazia prever o fracasso da empreitada. Exasperou-se o Capeta e resolveu cobrar de seu oponente o cumprimento do contrato. Atendendo o telefone, o Padre Eterno ficou calado diante das múltiplas reclamações e impropérios. No final, falou: “Como é que você exige que eu faça a Minha parte da ponte, se você levou todos os empreiteiros para o Inferno?”
Assim estão as coisas por aqui. Não há mais um empreiteiro na cadeia. Estão todos livres para continuar celebrando com o governo as mesmas lambanças de sempre, lucrando horrores em obras públicas superfaturadas e até inexistentes. O problema da corrupção, entre nós, está em que enquanto existirem empreiteiras para fazer o trabalho devido ao Estado, o país permanecerá sendo a caverna do Ali Babá.
Descobriu-se por acaso a roubalheira na Petrobras, mas depois de algumas ameaças retóricas, não se cuida mais de investigar o que se passa nos setores elétrico, rodoviário, ferroviário, portuário, bancário, da saúde, da educação e da segurança, entre quantos mais? Tivesse o governo vontade de apurar o quanto de dinheiro escorre por suas mãos e não haveria necessidade do ajuste fiscal. Bastaria, simplesmente, fechar o ralo.
A participação do Congresso na farra das empreiteiras parece um detalhe, apesar de escabroso. O mal está nas regras do jogo. Obras públicas deveriam ser públicas. Não se tem notícia de que tivessem sido privatizadas e superfaturadas as construções do metrô de Moscou, das siderúrgicas nos Urais e de centenas de empreendimentos que culminaram no Sputnik e na viagem de Yuri Gagárin ao espaço. As denúncias sobre a execrável tirania de Stalin revelaram as mais abjetas perseguições políticas, mas jamais a presença de empreiteiras no regime soviético.
Já do outro lado do mundo, o complexo industrial-militar enriqueceu muita gente e levou à apologia de pequenas guerras permanentes para sustentar a economia americana. Enquanto o privado continuar substituindo, dominando e roubando o público, nada mudará. O Padre Eterno permanecerá com suas vastas mãos abanando e o Capeta celebrando a aliança com seus novos auxiliares. O Diabo, com perdão da referência, é que os empreiteiros já dominam o inferno…
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