terça-feira, 17 de março de 2020

Como atenuar a crise?

Nos últimos dias me envolvi em intenso debate sobre como o Brasil deve responder à crise econômica proveniente da pandemia global de COVID-19. Primeiramente, esclareço aos leitores: a crise que o mundo atravessa hoje não tem precedentes. Comparações com a crise de 2008 não são pertinentes pois aquela foi uma crise financeira, originada nas instituições que não sabiam como as inovações que haviam criado estavam espalhando risco pelos mercados mundo afora. Apesar da crise de 2008 ter sido extremamente severa e única em muitos sentidos, os economistas sabem o que fazer tanto para apagar o incêndio, quanto para sustentar as economias quando crises financeiras ocorrem. Nosso problema agora é outro.

A crise econômica proveniente da pandemia tem duas manifestações. De um lado, a extrema incerteza atrelada à disseminação de um vírus altamente contagioso e com taxa de mortalidade assustadora. Essa incerteza paralisa investimentores e consumidores. De outro, a resposta das autoridades de saúde pública e de diversos governos mundo afora. Para conter a epidemia, vários países decretaram fechamento de escolas, universidades, bares, restaurantes, museus, fronteiras. A indústria de turismo já sofre baque sem tamanho, as companhias aéreas que o digam. O que isso significa é que há uma paralisia sem precedentes da demanda e da oferta. A insuficiência aguda de demanda exige dos governos medidas urgentes e extraordinárias para impedir a asfixia econômica.


Como fazer isso no Brasil? O país, cuja economia enfrenta essa crise a partir de uma posição fragilizada, precisa reconhecer que o cenário mudou abruptamente. Mudanças de cenário requerem que as prioridades se reorientem. As reformas de médio prazo são importantes, mas não para agora. Para agora o que se precisa é de medidas que deem ao SUS a capacidade de atender milhares de pacientes, às pequenas empresas a liquidez de que necessitam, além de reforçar as redes de proteção social e impulsionar o investimento público. No Brasil, os vulneráveis não são apenas os idosos, mas as pessoas que trabalham na informalidade e que não terão salário se forem obrigadas a ficar em casa, as crianças que dependem das escolas para comer, as mães solteiras que poderão ter de deixar de trabalhar com o fechamento de escolas, as famílias de baixa renda que moram em favelas aglomeradas e se deslocam por meio de transportes lotados por horas a fio. No plano macroeconômico, é preciso atenuar a insuficiência aguda de demanda com investimentos públicos que criem empregos – defendo que esses investimentos sejam feitos em infraestrutura.

A crise será longa, pois a insuficiência de demanda conosco estará durante a epidemia e depois que ela se for. Estamos falando de meses, possivelmente de um ano ou mais. Portanto, urge considerar a seguinte estratégia: de início, isto é, no curtíssimo prazo, a flexibilização da meta fiscal e o uso do crédito extraordinário para liberar os recursos necessários para a saúde e para os mais vulneráveis. Isso, entretanto, poderá ser insuficiente para sustentar a economia brasileira caso a crise seja tão prolongada quanto imagino. Nesse caso, será necessário considerar a flexibilização do teto de gastos, sobretudo para dar o suporte necessário ao SUS.

A ideia de flexibilizar o teto tem gerado muita controvérsia, mas o fato é que ele, hoje, é excessivamente rígido. Muitos economistas não gostam da ideia, mas o teto não é uma vaca sagrada. O país não será castigado se tiver de modificá-lo. Os que tiverem de fazê-lo poderão salvar vidas, e no momento, é isso o que importa.

Livremo-nos das amarras que nos prendem e pensemos em conjunto como ajudar o Brasil, as pessoas. É hora de debate, sim, mas mais importante é reconhecer que é hora de agir. Não agir numa crise dessa envergadura é deixar a população exposta à loteria do vírus.

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