Dilma tem poucos amigos. Temer, muitos. Dilma não confia em ninguém. Temer confia. Dilma vive sozinha com a mãe. Temer é casado, tem filhos e detesta a solidão.
Dilma concentra poderes. Temer delega. Dilma impõe sua vontade sem discuti-la. Temer constrói a sua ouvindo os outros.
Dilma detesta a política e os políticos. Depois da família, Temer anos ama a política e os políticos acima de tudo.
O que o resultado da votação do impeachment na Câmara teve a ver com as diferenças de temperamento, estilo e modo de vida de Dilma e Temer? Nada e tudo.
Quem derrubou Dilma foram as mentiras que disse para se reeleger e os muitos erros que cometeu desde então. Mas se ela não fosse como é, e Temer o seu oposto, talvez pudesse sobreviver a um processo que ainda está longe do fim.
Pior do que atravessar, insone, a noite de ontem, certamente será para Dilma viver o seu primeiro dia como presidente da República de direito, de fato, não.
Na vida real, o poder transferiu-se do Palácio da Alvorada, onde ela mora, para o Palácio do Jaburú, onde mora Temer.
Poucos quilômetros separam os dois palácios. Um, porém, abriga o passado em eclipse. O futuro começa a ser desenhado no outro.
É remota a chance de o Senado recusar-se a julgar Dilma. A admissão, ali, do pedido de impeachment está prevista para acontecer até o próximo dia 11.
O Senado só levou quatro dias para admitir julgar o ex-presidente Fernando Collor. É possível que em 10 dias aceite julgar Dilma. Nesse caso, ela será obrigada a afastar-se do cargo e terá o seu destino resolvido em um prazo de 180 dias.
O governo Temer começará de imediato. E dado às nuvens pesadas que privam o país de luz, e às desconfianças que cercam Temer, o vice-presidente no exercício do cargo disporá de pouco tempo para mostrar a que veio.
Um novo presidente costuma desfrutar de um mínimo de 100 dias de lua de mel com os seus governados. É da tradição. Temer não terá esse direito. Como Itamar Franco, o vice de Collor, não teve.
Tampouco a Temer será concedido o direito de errar. Ou acerta logo ou será cobrado por eventuais erros à partida, e, de quebra, por ter agido às claras para subtrair a presidência à Dilma.
Ela caminhava teimosamente para cair sozinha. Seu governo deixara de existir de há muito. Mas Temer não se limitou a esperar a queda. Ajudou a provocá-la. Nunca antes na história deste país... Pois é.
Até o golpe militar de 1964, vice e presidente não eram obrigados a ser eleitos na mesma chapa.
João Goulart foi o vice que assumiu com a renúncia de Jânio Quadros, mas os dois haviam sido eleitos em chapas distintas. Deixou de ser assim.
E porque deixou, o vice perdeu importância. Passou a ser visto como um aliado do presidente eleito, alguém, de fato, comprometido com ele e leal a ele.
Uma coisa é o vice divergir do presidente. Natural. Outra bem diferente é passar a opor-se a ele. Outra mais grave é conspirar contra ele.
Dilma sempre tratou Temer com desprezo. Daí a Temer sentir-se à vontade para ajudar a depô-la vai uma distância abissal.
Distância que separa o político sempre correto do político cuja correção depende das circunstâncias e do tamanho de sua ambição.
Temer contribuiu para aumentar os desafios que o aguardam. Além de arcar com uma herança maldita, terá pela frente a hostilidade dos inconformados com o atalho que escolheu para alcançar o poder.
Boa sorte.
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