segunda-feira, 18 de abril de 2016

Brasileiros à beira de um ataque de nervos

Os almoços de família já não são mais os mesmos: as constrangedoras conversas sobre relacionamentos há tempos deram lugar a longas discussões políticas à mesa. Chega a dar saudades da tediosa época em que a grande questão do dia, nos papos de elevador, era "será que vai chover?", não "será que a Dilma cai?". Com um Governo na berlinda e um cenário econômico desanimador, a tensão que pesa sobre o ombro do brasileiro virou questão de saúde pública. Sem saber para onde caminha o Brasil, cresce nos consultórios o número de casos de pessoas com transtornos ligados a estresse, ansiedade e angústia. Irritabilidade, preocupação, fadiga, falta de sono são algumas das queixas mais comuns. Soa familiar?

Mestre em saúde pública, o psicólogo e professor universitário Ricardo Sebastiani, do Nêmeton Centro de Estudo e Pesquisa em Psicologia e Saúde, coordena uma equipe de 38 profissionais que atuam em 16 unidades da cidade de São Paulo. No primeiro trimestre de 2016, ele e a equipe observaram um fenômeno inédito: nos primeiros três meses do ano, quando o movimento tradicionalmente costuma ser menor, a procura por terapia aumentou. Neste mesmo período, as queixas ligadas a transtornos de ansiedade cresceu 20%, dentro de um universo de cerca de 1.500 consultas por mês.
Nas sessões de terapia, a crise política ou econômica tem sido tema das divagações de ao menos 6 em cada 10 pacientes, o que também não era habitual. Mas em semanas de acontecimentos mais quentes, como quando ocorreram as manifestações contra e a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff, em março, a proporção chegou a 9 em cada 10. As reclamações têm uma razão real: qualquer que seja o desfecho do processo, o resultado afeta diretamente as vidas da população. "As pessoas estão vivendo um estado permanente de ansiedade e tensão, que às levam aos limites da suas capacidades de resistir e se adaptar. Isso deixa o corpo e a saúde emocional no limite também", diz Sebastiani, psicólogo há mais de 30 anos.


Alguns dos efeitos disso sobre o corpo são: a queda na imunidade (que deixa as pessoas mais suscetíveis a viroses e infecções), sintomas psicossomáticos (diarreias, alergias de pele, dores de cabeça e dores musculares, por exemplo), episódios de crise de ansiedade (ataques de pânico), instabilidade de humor e maior intolerância (o tal pavio curto), além da sensação de cansaço permanente e, em casos mais graves, a depressão.

Entre os que demonstram maior preocupação estão os adultos em fase produtiva, sobretudo pelo temor em relação ao trabalho e ao sustento familiar. Segundo o levantamento feito por Sebastiani com colegas da área, entre os profissionais que mais demonstram sofrer com a crise estão: jornalistas (sim, é verdade), professores, profissionais da saúde e advogados.

"O estresse, agravado pela situação atual de instabilidade política e de crise econômica, age no sentido de incrementar os conflitos internos das pessoas, que ficam mais ansiosas. A sensação de insegurança e indefinição desperta uma profunda angústia que faz com que as pessoas se alterem muito. E isso, somado ao acúmulo de outras situações de tensão, tem provocado um aumento de queixas [no consultório] nesse sentido e uma busca maior por ajuda", explica o médico psiquiatra e psicanalista José Roberto de Campos de Oliveira, de São Paulo, que atende pacientes há 37 anos.

Alguns dos efeitos sobre o corpo são a queda na imunidade, transtornos psicossomáticos , ataques de pânico, instabilidade de humor e fadiga

"É um sentimento de constante insegurança. O maior temor é o de perder o emprego e não ter como pagar as contas. Há também um sentimento de descontinuidade: projetos suspensos por falta de dinheiro, mudanças de hábito que diminuem as opções de válvula de escape da população... E quanto maior o conhecimento sobre o que está acontecendo, maior a preocupação quanto à indefinição do cenário político", completa Ricardo Sebastiani.

Leia mais a reportagem de Mariana Novaes

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