domingo, 19 de junho de 2016

A vida no bairro milionário da 'prisão' de Machado

Ruas de condomínios fechados e mansões, todas com câmeras e seguranças à espreita. Nas calçadas cercadas por muros altos, passa só um ou outro carro de luxo. Ao redor das quadras milionárias, favelas se acumulam.

O bairro Dunas, em Fortaleza, uma das áreas mais nobres - e desiguais - da cidade, será o cenário da prisão domicilar de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro que em seu acordo de delação premiada na operação Lava Jato acusou mais de 20 políticos dos principais partidos brasileiros.

Machado, que relatou ter passado R$ 100 milhões em recursos ilícitos, vai iniciar nos próximos dias o cumprimento de três anos de pena em sua casa.


O delator passará seus dias em uma mansão com piscina e quadra poliesportiva, construída num terreno de cerca de 3.000 m² e cercada por outras construções de alto padrão. Segundo corretores imobiliários de Fortaleza, imóveis na mesma região, com piscina e metragem semelhante (entre 2.500 m² e 3.000 m² de área total), custam de R$ 10 milhões a R$ 12 milhões.

Entre os vizinhos de Machado está Tasso Jereissati (PSDB-CE), o senador eleito com maior patrimônio declarado ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral): quase R$ 400 milhões.

De acordo com uma moradora do bairro, que não quis se identificar, a vizinhança é composta por "médicos, advogados e muito promotor", "gente de influência, mas muto discreta".

O perfil "nobre", como define a moradora, faz com que boa parte dos que vivem ali tenham segurança particular e evitem andar na rua - entre eles, Sergio Machado. As calçadas ficam vazias na maioria do tempo por causa do medo de assaltos, segundo relatos feitos à BBC Brasil.

Em 2012, uma associação de amigos do bairro planejou pagar por um sistema de monitoramento orçado em R$ 750 mil para garantir a segurança do local.

A poucos metros da Praia do Futuro, ponto turístico da cidade, Dunas faz fronteira com barracos.

"Ninguém tem coragem de ficar andando na rua. Só quem anda são as pessoas da comunidade, onde sabemos que tem muito bandido. Por isso, quem é assaltado são os funcionários", diz a moradora.

Segundo ela, parte dos vizinhos quer a desocupação das favelas, que estariam poluindo uma lagoa próxima. "A gente tentou cercar para que ninguém tivesse acesso à lagoa e parte da cerca foi colocada pelo shopping Rio Mar (próximo ao bairro); não terminaram porque teriam de passar no meio das favelas."

O único momento de reunião dos vizinhos acontece na Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, onde vão, de carro, para a missa. Os membros da família Jereissati são comumente vistos nas celebrações, conta uma funcionária da igreja.

"Na paróquia, é onde o pessoal se encontra. É um bairro de condomínios fechados, não tem gente andando, você só vê os carros. Não tem uma pracinha para socializarem."

A falta de convivência faz com que muitas pessoas da região não saibam que Sérgio Machado tem uma casa ali. Um vendedor de uma loja a três quarteirões da mansão de Machado, na Praia do Futuro, só descobriu pelo jornal quem o delator era.

"Só soube que ele era do Ceará pela televisão. Não se sabe muito de quem mora daquele lado."

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