terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Todos os livros do presidente

Há três ou quatro anos, na véspera de Natal, fui convidado para autografar exemplares dos meus livros numa pequena livraria independente, em Cascais, próximo de Lisboa. Não havia muitos clientes. A certa altura entrou na livraria o presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa. Vinha sozinho. Sentou-se diante de mim, cumprimentou-me com um vigoroso aperto de mão, e disse-me que naquele Natal iria oferecer livros meus a toda a família. Fiquei duas horas à conversa com ele, enquanto autografava.

Antes de ser eleito pela primeira vez presidente da República, em 2016, Marcelo Rebelo de Sousa era famoso como um comentador político que também recomendava livros. Ter um livro recomendado por Marcelo garantia quase sempre boas vendas. Muita gente ficava espantada com a quantidade de livros, desde romances a densos ensaios de filosofia, que Marcelo recomendava todas as semanas. O segredo, segundo revelou o próprio em diversas entrevistas, tem a ver com o fato de dormir apenas quatro horas. O presidente português dedica o resto da noite à leitura de livros e jornais.


Portugal tem sorte em ter um presidente que dorme pouco — e que gosta de ler. Aliás, os presidentes deveriam ser escolhidos pelos livros que leem. Juntamente com a declaração de rendimentos, cada candidato presidencial teria de apresentar uma lista dos seus vinte livros preferidos. Uma medida como esta evitaria muitas desilusões. Evitaria, sobretudo, alguns grandes e graves desastres, como aquele que está em curso no Brasil.

Jair Bolsonaro não conseguiria sequer escrever tal lista e seria eliminado antes mesmo de começar a corrida. Já Donald Trump, que, por comparação com Bolsonaro, é quase um intelectual, afirma ter lido pelo menos dois livros ao longo da vida — e recomendou-os inúmeras vezes: “A arte da guerra”, de Sun Tzu, e “O príncipe”, de Nicolau Maquiavel. Mais dois bons motivos para ninguém votar nele.

Na lista dos títulos preferidos de Barack Obama encontro vários de que também gosto. Destaco “Garota, mulher, outras” de Bernardine Evaristo, e “Da próxima vez, o fogo”, de James Baldwin. Contudo, há algumas escolhas um pouco inquietantes, como Paula Hawkins (“A garota no trem”) e Paulo Coelho (“As valquírias”).

Nelson Mandela gostava de biografias. Na sua lista de livros preferidos figuravam ainda grandes clássicos da literatura universal, como “Guerra e paz”, de Tolstói, e nomes importantes das letras do seu país, com destaque para Nadine Gordimer, Prêmio Nobel da Literatura em 1991.

Voltando ao Brasil, gostaria de saber mais sobre os livros preferidos dos principais candidatos. Sobre Lula sabemos bastante. Entre os romances que leu (ou releu) na prisão estão alguns dos meus favoritos, como “O amor nos tempos do cólera”, de Gabriel García Márquez, e “Um defeito de cor”, de Ana Maria Gonçalves. Além disso, Lula parece prestar atenção aos novos talentos. Na cadeia, leu, por exemplo, “O sol na cabeça”, de Geovani Martins.

A lista de Lula é, no geral, muito boa. Se o meu sistema estivesse em vigor no Brasil, os restantes candidatos teriam de se esforçar bastante.

Desejo a todos festas felizes — e boas leituras!

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