Sentado no banco dos réus da opinião pública, o presidente Jair Bolsonaro, conhecido como O Mito, começou a ser julgado. No mesmo dia em que passou com boa nota no teste do coronavírus, o segundo que fez em menos de uma semana, virou alvo do seu primeiro panelaço antes de completar 14 meses de governo.
Bolsonaro parece ter vindo ao mundo para destacar-se em todos os rankings. Como soldado raso, batia os colegas em exercícios físicos – daí o apelido de Cavalão. Foi o primeiro sindicalista militar a planejar atentados terroristas contra quartéis. E, por isso, acabou afastado do Exército, acusado de conduta antiética.
Em quase três décadas na Câmara, Bolsonaro apresentou 171 projetos de lei, de lei complementar, de decreto de legislativo e propostas de emenda à Constituição. Só conseguiu aprovar dois. No Congresso, foi um dos precursores da rachadinha – a apropriação indébita de parte dos salários dos seus servidores.
Apesar de sua irrelevância, chegou onde está sem fazer escala em nenhum outro lugar para, poucos meses depois, tornar-se o presidente com o menor grau de aprovação no seu primeiro ano de mandato. Nunca antes um presidente ouviu tão precocemente o barulho das panelas e o grito de “fora”. Ele ouviu.
Há outro panelaço marcado para esta noite. Uma coisa dessas sabe-se como começa, mas nunca se sabe como termina. Da redemocratização do país para cá, só Dilma Rousseff ouviu, e deu no que deu. Fernando Collor viu multidões vestidas de preto quando ele recomendara que se vestissem de verde e amarelo.
Bolsonaro já garantiu seu lugar na História. Enquanto Garrastazu Médici, o terceiro general-presidente da ditadura militar de 64, reconhecia que a economia ia bem, mas o povo ia mal, o ex-capitão indisciplinado está mais preocupado com a economia do que com o povo em meio a uma pandemia que mete medo.
Não só por isso será lembrado. Qual presidente seria capaz de sabotar o ministro mais festejado do seu governo pelo menos no momento – o da Saúde? O que inspira maior confiança? Qual presidente, numa hora dessas, seria capaz de instruir um ministro para que negue ajuda a governadores que lhe pedem ajuda?
Por seus méritos, não por seus defeitos, Luiz Henrique Mandetta entrou na alça de mira de Bolsonaro, dos seus filhos e da extrema-direita mais ensandecida que os apoia. Demiti-lo já, seria impensável – embora de Bolsonaro se possa esperar qualquer coisa. Vencida a pandemia, serão outros quinhentos réis.
Bolsonaro conta com mais um militar, da sua confiança enquanto ela dure, para suceder Mandetta – o atual presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, o contra-almirante Antônio Barra Torres. Foi a única autoridade que apareceu ao lado de Bolsonaro no encontro com manifestantes do último domingo.
Barros Torres é da estirpe ideológica de um Abraham Weintraub, ministro da Educação, embora mais discreto. E se não o é por origem, está pronto para sê-lo, alinhando-se incondicionalmente a quem lhe deu emprego e pronto para satisfazer todas as suas vontades – inclusive a de ser filmado em êxtase.
Mandetta é deputado e à Câmara voltaria – como voltou Osmar Terra, desalojado do Ministério da Cidadania para dar lugar a Onyx Lorenzoni, por sua vez removido da Casa Civil e substituído por mais um general, Braga Neto, justo quando o general Luiz Eduardo Ramos balança, balança, mas não cai.
Um presidente movido a ódio e barulhento como Bolsonaro faz por merecer o barulho das panelas anônimas que voltou a ser ouvido.
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