sábado, 27 de junho de 2015

Lula: Retrato na moldura de Brizola


Meio atirado já às traças do esquecimento, (estranho até em um país desmemoriado) transcorreu, domingo, 21/06, o décimo primeiro aniversário da morte de Leonel Brizola, ex-governador do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul e uma das figuras mais marcantes da política brasileira ao longo de décadas. Goste-se ou não dele, um nome sobre cuja cabeça e memória se encaixam preceitos fundamentais do célebre Decálogo do Estadistas, de Ulysses Guimarães. A começar pela Coragem, primeiro e principal mandamento do homem público. 

Por décadas, o gaúcho de Carazinho foi figura amada e seguida até a devoção por muitos. Temida, traída, atacada e perseguida por outros tantos (com igual intensidade, ou mais). Sempre, porém, legendária personalidade de governante ativo e de administrador capaz em sua geração (protótipo no campo trabalhista - herança da proximidade com Getúlio Vargas; e da Educação, com E maiúsculo -, ao lado de Darcy Ribeiro).

Acima de tudo, Brizola é um nome associado aos maiores e melhores combates políticos, sociais e na defesa de comportamento ético e moral das figuras públicas em geral, e dos governantes em particular .

Um fato inexorável, jornalística e politicamente falando: No redemoinho insano deste junho de 2015, a justa e merecida celebração da data ficou esmaecida. As pautas e os espaços nas editorias de política, geral e de comportamento da grande, média ou pequena imprensa foram tomados por outros acontecimentos.

A saber: a) As mais recentes "tonterias" da presidente Dilma Rousseff (como qualificam os espanhóis e a gente de língua castelhana na América do Sul); b) as manobras do ex-presidente Lula (pós desastroso Congresso Nacional do PT em Salvador), na tentativa, meio óbvia demais, de se desvincular do PT e da atual mandatária do Palácio do Planalto (mesmo que só momentaneamente, nesta tormentosa hora de escárnio e corda no pescoço). Sem tirar os olhos da sucessão presidencial em 2018, diga-se.

Lembrou, com extrema sensibilidade, o jornalista e escritor Juan Arias, na edição brasileira do jornal espanhol El Pais, a charge que corre nas redes sociais, na qual o ex-presidente da República e fundador do PT, aparece (mal) disfarçado no meio de grande manifestação popular de protesto contra o governo, carregando um cartaz com a palavra de ordem: “FORA LULA!” 

Espaços fartos de imprensa foram destinados ainda: c) À troca das mãos pelo pés do empresário Marcelo Odebrecht, autor do arrogante e complicador bilhete capturado pela PF. O principezinho (das colunas sociais e das reportagens laudatórias até recentemente), manda chuva da megaempresa brasileira com braços multinacionais, fundada na Bahia (ora recolhido em uma cela do prédio da Federal em Curitiba), determina aos seus advogados que destruam provas recolhidas pela Operação Lava Jato .

Pepinaço, no linguajar soteropolitano, por mais que os advogados façam ginásticas mentais para negar ou "interpretar" o verdadeiro sentido das palavras do autor); d) a morte trágica e violenta em acidente de carro, no interior de Goiás, e o enterro de superstar em Goiânia, do músico e cantor sertanejo Cristiano Araújo e de sua jovem noiva. O artista regional, de repente guindado, nos principais veículos noticiosos, ao posto de celebridade de primeira grandeza do Brasil.

E estamos de volta a Leonel Brizola, ao relembrar da sua partida há 11 anos. Irônico, talvez, que isso aconteça nestes dias juninos em que o ex-presidente Lula atravessa uma das etapas mais polêmicas, contraditórias e complicadas de sua trajetória de ex-dirigente sindical, fundador do PT, ex-chefe da Nação, e liderança política sob intenso foco de observação nacional e internacional. Mais complicada, ainda, depois da Operação Lava Jato e seus desdobramentos recentes, conduzidos desde Curitiba, pelo juiz Aldo Moro, a "incógnita do futuro do ex-presidente", segundo Arias, no El País.


Mas foi Brizola, sem dúvida, quem, durante anos, traçou sobre a moldura brasileira, o retrato mais expressivo, questionador e polêmico de Lula e seu PT e sobre o significado de ambos na vida e na história das últimas décadas no Brasil. Recordo, antes do ponto final, duas pinceladas marcantes da obra. Nos anos 80, o ex-governador cunhou, talvez, a frase mais definitiva sobre o partido saído das lutas sindicais no ABC paulista: "O PT é a UDN de macacão e tamanco. É como uma galinha que cacareja para a esquerda e põe ovos para a direita".

Sobre Lula, anos mais tarde, um trecho definidor, no vídeo que circula na Internet: "Eu cheguei aqui (do exílio) e fui logo visitar o Lula. Me recebeu como um imperador. Dono do ABC. Nós pensamos diferente. O Lula está dentro do sistema, sua mente está dentro do modelo econômico. Como o Fernando Henrique, só que o Lula vem por baixo e o FHC vem por cima. Os dois se acotovelam para executar o mesmo programa neoliberal". Mais não digo, a não ser: que falta faz Brizola!

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