Daniel Kahneman, psicólogo israelense, foi Prêmio Nobel de economia em 2002, por sua teoria (junto com Amos Tversky) sobre o comportamento humano em matéria econômica. A teoria deles era radicalmente contrária ao princípio das expectativas racionais que fundamenta teoricamente a mística da infalibilidade dos mercados financeiros e a defesa de sua completa desregulamentação. Os seres humanos decidem sob influência de vieses e heurísticas (atalhos mentais) que levam a ilusões cognitivas e grandes erros de avaliação. Como a crise de 2008 demonstrou de forma definitiva, o comportamento de manada nos mercados financeiros e a irracionalidade dos agentes econômicos acontecem por erros e ilusões cognitivas.
Amos Tversky faleceu em 2006 e no último dia 27 de março, fez um ano que Daniel Kahneman submeteu-se ao procedimento de suicídio assistido na Suíça aos noventa anos. Seu livro “Rápido e devagar: duas formas de pensar” publicado em 2011, mostra que a forma rápida é intuitiva, automática e emocional. Toma decisão com base em padrões e experiências passadas mas é sujeita a erros de avaliação e ilusões cognitivas. A forma devagar é logica, deliberada e esforçada. Analisa informações com cuidado e precisão. É mais lenta e trabalhosa e menos sujeita a erros.
Kahneman e Tversky trabalharam anos para que sua contestação dos principios psicológicos da teoria econômica fosse ouvida nos fóruns de economia. A história e, principalmente, a crise de 2008 comprovaram que eles tinham razão. A verdade apareceu e a economia comportamental tornou-se um ramo de pesquisa aceito e respeitado.
O debate político no mundo digital, nas redes sociais em particular, em muito se assemelha aos mercados financeiros desregulados. O discurso político populista é elaborado para ser avaliado pelo modo rápido de pensar. Narrativas, exemplos, metáforas e situações hipotéticas são construídas e costuradas para fazer as pessoas se apaixonarem pelos heróis, odiarem os vilões e, principalmente, acreditarem piamente na mitologia populista. Sua força está apenas na verossimilhança e na capacidade de encantamento da narrativa. Conspirações, difamações e mentiras são ingredientes válidos. A realidade é apenas um dos mundos possíveis.
A ascenção do populismo de extrema direita em todo o mundo, tendo Donald Trump e os bilionários das Big Techs `a frente, reforça o paralelo entre os desastres causados por mercados financeiros desregulados e a força política da mensagem populista. No ambiente de vale tudo das redes sociais, as Big Techs resistem `as tentativas de regulação enquanto lucram com o caos. O pensamento humano em modo devagar, fundamental para a ciência e para a evolução da humanidade ficou fora de moda. Sob o Trumpismo ficou quase proibido.
Estou convencido que o populismo vai fracassar mas não sem antes fazer um estrago gigantesco em termos de destruição institucional e de valores civilizatórios. Como na crise financeira de 2008, o mundo poderá pedir ajuda ao Estado e a suas instituições para nos tirar da desordem e da desesperança. Contudo, acho que levará algum tempo.
O Brasil pode chegar nas eleições de 2026 sem os dois lideres populistas que ainda hoje polarizam o país mas que estão perdendo terreno no imaginário da população. Os eleitores de Bolsonaro e Lula estão arrependidos como mostrou a pesquisa da Tendências publicada recentemente no Estadão.
Precisamos nos livrar desta ilusão cognitiva que fez o Brasil andar pra trás.
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