Esta foi a abertura do principal editorial do The New York Times do sábado passado. Se parece alarmista, é porque é mesmo; e ainda é pouco diante do que está acontecendo lá em cima.
Eu li e achei que era comigo. Eu sou essa pessoa que está farta, que não aguenta mais o ritmo e o caráter dos acontecimentos, que quer distância do mundo e quer se desligar de tudo — não só do governo Trump e de suas consequências, mas também, e sobretudo, do que acontece no Brasil, onde a cada segundo dia o governo faz alguma coisa para botar mais lenha na fogueira e onde o nível de ódio das redes sociais está chegando ao limite do insuportável.
Aliás: é curioso observar que o ódio, nas redes sociais, atende por hate.
O hate tem um ar de bom moço que o ódio não tem; o hate é chique, o hate permite que os haters possam manter uma distância conveniente do seu próprio veneno e não precisem encarar o fato desabonador de que são pessoas odiosas. Hate dá muito engajamento.
“Eu sou contra linchamento” escrevem os alecrins dourados — e tome hate hate hate, lincha lincha lincha. Essa semana sobrou até para uma xícara da Tania Bulhões, primeiro caso de porcelana cancelada de que tenho notícia.
O New York Times tem razão quando implora aos leitores que não desliguem, porque o mal vence habitualmente pelo cansaço; mas é difícil manter a guarda. Não há Rivotril que baste para quem quer pensar fora da caixa ou remar contra a maré num mundo em que apenas acompanhar o noticiário, em silêncio, já tem um custo emocional tão alto.
Ando com vontade de seguir o ideário do próprio Trump e de construir um muro de todo o tamanho. Não em concreto, óbvio, até porque a decoração da casa não comporta essas coisas, mas um bom muro metafórico à prova de notificações, tuítes, textões e vídeos virais de cinco segundos que são a derrota do iluminismo.
Ou talvez quem sabe a solução seja uma abordagem mais enxuta. Em vez de tentar acompanhar o caos, posso me disciplinar e tentar me dedicar a uma única treta por semana, como quem assina um serviço de streaming, mas só vê uma série de cada vez para não se perder. Uma desgraça por dia, sem maratonas. E, nos fins de semana, só programação leve — um escândalo político do outro lado do mundo, um barraco entre celebridades, uma treta gourmet envolvendo quibe de jaca ou pão de fermentação natural.
Cadê aquela xícara?
Cora Rónai
Nenhum comentário:
Postar um comentário