Os líderes republicanos, que Trump treinou apenas recentemente para denunciar a antiga política externa de expansionismo e internacionalismo de seu partido, rapidamente mudaram de opinião e adotaram a nova linha, e agora estão elogiando a visão grandiosa e o pensamento de Trump. Onde isso vai parar?
Alguns dizem que estamos de volta à “teoria do louco” da política externa, que postula que é bom para o presidente, às vezes, parecer imprevisível, até mesmo irracional, porque isso deixa os adversários desprevenidos. Vale a pena lembrar que Trump tentou essa jogada em seu primeiro mandato, mais obviamente com Kim Jong-un, da Coreia do Norte.
Ele começou ameaçando-o com uma guerra nuclear (“fogo e fúria como este mundo nunca viu antes”) e depois mudou abruptamente para um romance com cartas de amor. Nada disso funcionou. A Coreia do Norte continuou a construir seu arsenal nuclear, a realizar testes de mísseis (após uma breve pausa) e a ameaçar seu vizinho do sul.
O acadêmico Daniel W. Drezner observa que muitas pesquisas concluíram que o criador da teoria do louco, Richard Nixon, não produziu nenhum resultado positivo em seus esforços para se parecer louco e desequilibrado.
A conversa sobre transformar o Canadá em um Estado parece ser trollagem, direcionada ao primeiro-ministro do país, Justin Trudeau, de quem Trump não gosta. Mas isso forçou até mesmo os políticos trumpistas, como Doug Ford, o primeiro-ministro de Ontário, e o líder do Partido Conservador, Pierre Poilievre, a reagir com firmeza.
Durante a campanha de 2016, a retórica desagradável de Trump sobre o México ajudou o candidato mais antiamericano nas próximas eleições daquele país, Andrés Manuel López Obrador, a subir drasticamente nas pesquisas. Da mesma forma, Trump pode incentivar um maior antiamericanismo no Canadá desta vez.
O foco de Trump no Panamá e na Groenlândia tem algum fundamento. O Canal do Panamá é um dos grandes pontos de estrangulamento marítimo do mundo. Mas as autoridades panamenhas o administraram com responsabilidade e profissionalismo e de forma alguma trataram mal os EUA – como até mesmo o conselho editorial do Wall Street Journal reconheceu recentemente.
Também não há nenhuma evidência direta de influência militar chinesa no canal ou na zona do canal, como afirma Trump. A China está aumentando seus laços econômicos com a América Central e a América Latina, mas a maneira mais fácil de ajudar Pequim a expandi-los ainda mais seria Washington fazer um esforço desastrado para colonizar o lugar. Isso levaria a ataques nacionalistas contra os EUA no Panamá e reavivaria os temores do neoimperialismo americano em todo o continente.
A Groenlândia está se transformando em um lugar crucial, em grande parte devido às mudanças climáticas, que ironicamente Trump chamou de “farsa”. O derretimento das calotas polares abrirá novas rotas marítimas oceânicas entre a Europa e a América do Norte, e a Rússia e a China tentarão ativamente ganhar influência nessas novas vias marítimas.
É – e deve ser – política americana impedir os esforços de ambas as nações rivais para expandir sua presença econômica e militar na região. Mas os EUA não precisam adquirir a Groenlândia para fazer isso. O país já tem todo o acesso à ilha que deseja. Washington tinha uma série de bases durante a 2ª Guerra e a Guerra Fria. Uma delas permanece até hoje e é operada pelas Forças Espaciais.
De fato, a Dinamarca tem ajudado ativamente no novo interesse dos EUA na Groenlândia. Há alguns anos, a ilha (que é governada de forma semiautônoma) quase fez um acordo para aceitar o financiamento chinês para um conjunto de novos aeroportos. O Pentágono pediu à Dinamarca que convencesse os groenlandeses a cancelar o acordo. O governo dinamarquês foi bem-sucedido, substituindo grande parte do financiamento chinês pelo seu próprio.
Trabalhar com a Dinamarca tornou os esforços dos EUA mais eficazes. Da mesma forma, empresas americanas, incluindo uma financiada pelo fundo Breakthrough Energy Ventures, apoiado por Bill Gates e Jeff Bezos, dono do Washington Post, estudam se a Groenlândia poderia ser explorada para obter alguns de seus ricos suprimentos minerais. Isso não mudaria em nada caso a ilha fosse americana.
Os EUA têm sido influentes em todo o mundo porque conseguiram persuadir os outros a agir não apenas em seu interesse próprio, mas em nome de valores mais amplos, como paz, estabilidade, regras e normas que ajudam a todos. É por isso que o governo americano conseguiu fazer com que 87 países condenassem imediatamente a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia. É por isso que muitos dos vizinhos da China se aliaram aos EUA.
Na coletiva de imprensa, Trump propôs se livrar da “linha artificialmente traçada” entre o Canadá e os EUA. É claro que isso é exatamente o que o presidente russo, Vladimir Putin, diz sobre a fronteira entre Rússia e Ucrânia. E aquilo que o presidente chinês, Xi Jinping, fala sobre a divisão entre China e Taiwan. Estamos entrando é um mundo que torna a Rússia e a China grandes de novo.