Lula, entre muros partidários, se queixa da paralisia e das trapalhadas da presidente Dilma, atordoada, revelando limitações pessoais que não estavam entre as mais sombrias previsões. Sem rumo, sem metas que não sejam a de propor mais impostos sobre um contribuinte revoltado.
A “criatura” que Lula colocou no Planalto escapou do controle. Falta-lhe traquejo político, isolou-se, intoxicou-se pela bajulação dos incompetentes e medíocres dos quais se cercou. Dilma, depois de reeleita, em 2014, largou as rédeas.
O Lula que “acertava quase tudo”, o ícone, passou a ser uma figura investigada pela polícia judiciária que apura o maior caso de corrupção da história. Seria fácil se sair de vítima não fosse a polícia que o devassou, dependente do ex-ministro da Justiça Eduardo Cardozo, do PT de São Paulo. Isso aniquila a reação. Cardozo não é de outro partido, não é do PSDB.
Logo ele, que, com uma criatura seguindo suas orientações e ensinamentos, lhe possibilitaria descanso num sítio rodeado de florestas? Nada de especial ele queria, apenas uma aposentaria tranquila no fim de uma escalada ao vértice do sucesso.
Porém, Lula pecou. Quis realizar o sonho de uma normal aposentadoria usando, no escuro, empreiteiras para tarefas triviais e mais que razoáveis, para quem tem renda de palestras regiamente pagas. Escolheu um caminho torto que entortou sua biografia espetacular.
Máximo é o constrangimento de quem é conduzido por uma polícia judiciária que responde constitucionalmente ao comando de sua “criatura”. Dilma não conspirou como um Brutus, apenas perdeu o controle político, perdeu a autoridade, perdeu o rumo, e se depara, como Dante, “No meio da senda da minha vida / me perdi numa selva obscura”, que dava acesso ao Inferno.
Para Lula, que entregou a Dilma quatro anos de poder sem limite, e ainda dobrou a dose, deve ser difícil perdoá-la e até de perdoar-se pela escolha. Não há conspiração da oposição, que nunca foi tão ausente e retraída. O problema está dentro de casa, na corrupção fora de controle e na incompetência geral. Sérgio Moro apenas cumpre, como raramente acontece no Brasil, seu dever.
Demonstra a voz de Dilma, em ligação ao seu criador, que quer pessoalmente reparar um erro. Poderia ter escalado um assessor para comunicar o envio de um documento. Fez questão, imprudentemente, de ligar para um telefone sob escuta autorizada: “Seguinte, eu tô mandando o ‘Bessias’ junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!”, nisso Lula responde: “Uhum. Tá bom, tá bom”. E ela: “Só isso, você espera aí, que ele tá indo aí... “Tá bom, eu tô aqui, fico aguardando”.
Nisso, mais que interpretação, há apenas uma constatação a se fazer.
O tom de voz é de quem quer reparar a quebra de uma louça que lhe caiu das mãos. Doutro lado a resposta é seca, de quem teria preferido manter a louça intacta e aceitar uma forma de evitar uma maior fragmentação de sua biografia.
O ex-ministro da Justiça Eduardo Cardozo, que passará à história como o guardião da independência da Polícia Federal (se é que não lhe escapou de controle), deixou que o deus “Brahma” (como o chamavam os empreiteiros ao se referirem a Lula) passasse por uma busca em seu apartamento e por uma condução coercitiva na delegacia, quando poderia ser realizada por hora marcada.
Dilma derrete. Poucas figuras humanas foram mais achincalhadas nas ruas do que ela. Muitos que nunca pensaram no impeachment, e o imaginavam um instrumento descabido, passaram a vê-lo como “legítima defesa” para um Brasil que ameaça explodir.
Isso se deu agora. Não só pelas revelações dos grampos, mas pelo PIB, que caiu 4,4%, produzindo uma média de 220 mil desempregados por mês. Um volume que já seria doloroso de se absorver em um ano.
A queda de arrecadação federal é de 11,5%. Arrebenta os Orçamentos de Estados e municípios. Setores produtivos como a siderurgia, o automotivo e o de bens de consumo duráveis estão se desfazendo. A Bolsa paradoxalmente se valoriza proporcionalmente ao crescimento das possibilidades de impeachment.
Dilma, assim, é vista nitidamente como o cerne do problema, e seu mandato, previsto para durar até 31 de dezembro de 2018, passou a pairar como pesadelo. Mais que uma razão ideológica e política, ou uma conspiração de uma oposição, que é ausente como nunca, são os erros do governo dela, da falta de um dever de casa não feito, que alimentam a crise.
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