Dilma foi dormir, ontem, na condição de presidente da República afastada do cargo para que Lula possa ocupá-lo na prática. E Lula foi dormir sem ter dito a Dilma se assumirá o governo. Ficou de responder hoje.
Lula assumirá, sim. Porque a essa altura, se ele não assumisse, só restaria a Dilma esperar mais alguns meses para ser deposta pelo Congresso, embalado para aprovar o pedido de impeachment.
A demora de Lula em dizer “sim” ao convite de Dilma para ser ministro deveu-se a três motivos, dois deles relevantes. O irrelevante: ele não queria disputar espaço na mídia com a delação de Delcídio do Amaral.
Hoje, ao longo do dia, a delação perderá espaço para o anúncio de que o país terá um novo governo, desta vez comandado por Lula. Ele parecia conformado em voltar ao Palácio do Planalto somente em 2018.
Os motivos relevantes: Lula queria subtrair de Dilma o máximo de poderes que pudesse para governar, e certificar-se durante a madrugada do tamanho do apoio que o PMDB poderá lhe oferecer.
Na conversa de quatro horas com Dilma no Palácio da Alvorada, Lula exigiu carta branca para reformar o ministério se necessário, e para mexer na política econômica.
A carta branca lhe foi dada. É aconselhável que Aloizio Mercadante, Ministro da Educação, peça para sair antes que seja saído. O novo ministro da Justiça foi escolha compartilhada por Dilma e Lula.
Dilma disse que não será obstáculo para que Lula promova na política econômica as correções que ele julga imprescindíveis. Uma delas, ainda genérica: acenar para o “andar de baixo” e retomar o crescimento.
Lula não se arriscará a dar uma guinada forte na economia – primeiro porque sabe que isso aprofundaria a crise, segundo porque não quer trombar com o mercado financeiro.
Pai dos pobres, tudo bem para ele. Mas sem deixar de ser a mãe dos ricos, como foi enquanto governou.
Mas Lula não pode deixar totalmente insatisfeitos o PT e os chamados movimentos sociais, sua principal base de apoio. Não lhe passa pela cabeça repetir o discurso incendiário das últimas semanas. Longe disso.
Não perdeu de vista o mote de sua primeira campanha vitoriosa à presidência – “A esperança vai vencer o medo”. Quer vencer o medo comportando-se como um moderado.
Como fez quando se elegeu em 2002, pretende de novo esvaziar o discurso da oposição ao governo se apoderando dele ou de parte dele. Ou conseguirá pacificar o país ou não será bem-sucedido. É o que tentará.
Está disposto, se for o caso, a se comprometer em não disputar mais eleições presidenciais. O difícil – ou quase impossível – é que os partidos, e o próprio país, acreditem nisso. Nem mesmo o PT acreditará.
O PMDB de Renan Calheiros será sensível aos desejos de Lula. O PMDB de Michel Temer, que aposta no impeachment, não. Os encrencados com a Lava-Jato serão sensíveis também.
Esses haviam abandonado Dilma porque ela já não tinha mais forças para protegê-los. Torcem para que Lula os proteja de Sérgio Moro e do ministro Teori Zavaski, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF).
Se Lula não der o que eles querem, preferirão apostar em um novo governo que decorra do impeachment. Tudo, por enquanto, está em aberto. Resta combinar com Moro e Teori.
Os ministros do STF estão incomodados com a manobra concebida por Lula de se refugiar no governo para escapar de Moro. Ficará a impressão de que Lula imagina contar com a cumplicidade deles.
Novas delações atingirão Lula em cheio. O mensaleiro Pedro Corrêa, ex-presidente do PP e, hoje, entregue aos cuidados de Moro, dirá que recebeu de Lula R$ 11 milhões para apoiar o seu primeiro governo.
A Procuradoria Geral da República examina a hipótese de pedir ao STF para abrir inquéritos contra Lula, Dilma, Aécio Neves, Temer e outros denunciados por Delcídio.
O combate à corrupção, avalizado pela esmagadora maioria dos brasileiros, poderá derrotar a esperança que Lula desejaria representar outra vez.
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