sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Oderbrecht e OAS só trabalham de graça para quem está no poder

Numa entrevista a Ranier Bragon, Folha de São Paulo de quinta-feira, o ex-ministro Gilberto Carvalho, que chefiou o gabinete do Palácio do Planalto ao longo dos mandatos de Lula, fez espantosa afirmação de que é a coisa mais natural do mundo empresas como a Odebrecht e OAS fazerem gratuitamente obras em propriedades particulares. Cabe, agora, o esclarecimento complementar por parte das duas empresas, uma vez que, por coincidência, tais obras particulares destinavam-se só a pessoas com influência no jogo do poder. Eram, portanto, restritas.

Casos do sítio de Atibaia e do apartamento triplex do Guarujá. Exemplos singulares de atos de desprendimento empresarial. Gilberto Carvalho, que foi exonerado pela presidente Dilma Rousseff, pouco antes da eleição de 2014, quando dirigiu restrições à sua atuação, colocou mais um argumento no esquema, que serve de ponte entre os contratos de obras públicas e a influência, que pode ser decisiva, do Executivo. Disse que tanto a Odebrecht quanto a OAS, entre as demais empreiteiras, procederam da mesma forma em relação ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Acrescentou a Ranier Bregon que pagaram – e pagam – despesas dos Institutos que levam os nomes dos dois ex-presidentes da República.

Só um ingênuo pode desconhecer os esforços que envolvem a convergência de interesses públicos e privados. Mas considerar normal o fato da execução gratuita de obras é demais. É ultrapassar os limites da percepção humana. Pois quem poderá acreditar na normalidade de tais iniciativas? Falando francamente, ninguém.

Surpreende principalmente Gilberto Carvalho afirmar, como está na matéria da FSP, que Lula não é dono formal da propriedade de Atibaia. Carvalho, com a frase, criou indiretamente a figura jurídica do dono informal de bens. Essa não.

Estabelecer comparações para cotejar o que teriam praticado ex-presidentes da República não diminui em nada o aspecto ético da questão. Gilberto Carvalho buscou esse caminho colocando diante de seu espelho as imagens de Luis Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso. E daí? Significa, isso sim, culpar ambos. Pois não é pelo fato de um ter errado que o outro pode errar. Tal argumento é próprio de discussões entre pessoas de reduzido nível intelectual.

Por isso mesmo, espanta que o argumento também tenha sido apresentado por Élio Gáspari, jornalista de nível elevado, em sua coluna no Globo e na FSP de quarta-feira, cotejando o triplex de Lula, no Guarujá, com o do ex-presidente Juscelino Kubitschek na Avenida Vieira Souto. Mesmo que a origem de ambos tenha sido nebulosa, o primeiro não apaga o segundo erro.

Elio Gáspari, aliás, esqueceu ou não desejou se referir ao triplex de Carlos Lacerda, Praia do Flamengo. Omitiu também o sítio do general João Figueiredo perto de Petrópolis. A fazenda de João Goulart, fronteira Brasil e Uruguai foi recebida por herança. Não estou afirmando com isso que, na sua curta administração, não tenham ocorrido casos de jogos de influência.

Ao contrário de Gilberto Carvalho e Elio Gáspari, não me proponho a apagar um episódio por outro. Quanto a Carlos Lacerda, tanto eu quanto Gáspari podemos lembrar o episódio do perdão da dívida dos exportadores de café pelo porto do Rio.

Além do perdão do débito, ainda reduziu de 4 para 1 % a incidência do ICMS, objeto de julgamento no STF. Foi em 1961.

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