sábado, 30 de novembro de 2024

Petroleiras são responsabilizadas por crise do lixo plástico

É até difícil de conceber o que 400 milhões de toneladas representam. No entanto, esse é o volume de plástico virgem produzido anualmente – o equivalente ao peso de toda a população humana.

Mesmo com essa pegada gigantesca, o plástico está em vias de ocupar ainda mais espaço no mundo. Projeções atuais sugerem que a produção praticamente triplicará até 2060. Estima-se que 20 milhões de toneladas de plástico acabem no meio ambiente a cada ano, enquanto as taxas anuais de reciclagem global são de apenas 9%.

Há anos, especialistas e grupos da sociedade civil têm alertado sobre a impossibilidade de resolver o problema das crescentes montanhas de resíduos plásticos apenas por meio da reciclagem. Um limite para a produção tem sido sugerido no lugar, na contramão do que vem acontecendo na prática.

Em uma era de expansão das fontes de energia renováveis, o aumento do volume de produção de plástico virgem tem muito a ver com os setores de petróleo e gás, já que a grande maioria desse material é produzida a partir de combustíveis fósseis.

Cavalo em meio a lixo plástico no reservatório de Cerron Grande (El Salvador)

"Atualmente, as empresas de combustíveis fósseis não dependem da venda de gasolina ou combustível para energia ou transporte como forma de se manterem vivas", disse Delphine Levi Alvares, gerente da campanha global de petroquímicos do Centro de Direito Ambiental Internacional (CIEL), em um comunicado. "Elas estão dependendo cada vez mais da produção de produtos petroquímicos."

Em outras palavras, as empresas que tradicionalmente vendiam combustível para o mundo agora estão investindo cada vez mais na produção de plástico. Na ordem de dezenas de bilhões de dólares.

A redução da produção surgiu como uma questão polêmica durante dois anos de negociações para chegar a um tratado global sobre plásticos. Ainda não se sabe se a rodada final, em andamento na Coreia do Sul, chegará a um acordo sobre esse ponto.

Mas há outros movimentos significativos em curso para forçar mudanças, como a queixa legal apresentada no início deste ano pelo estado americano da Califórnia contra a ExxonMobil, grande empresa de petróleo e gás.

Na ação judicial, o procurador-geral da Califórnia, Rob Bonta, alega que a ExxonMobil, a maior produtora de plásticos de uso único do mundo, "promoveu agressivamente o desenvolvimento de produtos plásticos baseados em combustíveis fósseis e fez campanha para minimizar a compreensão do público sobre as consequências prejudiciais desses produtos".

Dessa forma, a empresa "enganou os californianos por quase meio século ao prometer que a reciclagem poderia e resolveria a crescente crise do lixo plástico", sustenta a procuradoria.

Mark James, diretor interino do Instituto de Energia e Meio Ambiente da Faculdade de Direito de Vermont, disse que, embora a ExxonMobil não venda diretamente aos consumidores, as empresas de petróleo e gás têm sido muito intencionais na criação de mercados para os produtos plásticos que vão para a cesta de compras.

"Definitivamente, houve marketing da reciclabilidade dos plásticos para esses usuários finais", disse ele. "Mas essa é uma criação do setor e, quando sabemos disso, podemos entender tudo o que eles têm feito para manter essa falsa sensação de reciclabilidade de seus produtos."

Em resposta, a ExxonMobil argumentou que as autoridades da Califórnia "sabiam que seu sistema de reciclagem não era eficaz" e não agiram. Procurada pela DW, a empresa não comentou o assunto.

Levi Alvares vê a ação judicial da Califórnia como um passo fundamental para unir os pontos que o público em geral nem sempre vê – o elo entre a produção de plástico e as empresas de combustíveis fósseis.

"Esse tipo de ação judicial realmente consolida na mente das pessoas essa tendência de que muitos não estão conectando o impacto que essas empresas têm sobre a crise climática ao impacto que elas têm em outros setores."
"Reciclagem avançada" seria a solução?

Apesar da taxa historicamente baixa de reciclagem global – apenas 10% de todo plástico já produzido foi transformado em outra coisa – e da realidade de que muitos produtos não podem ser facilmente transformados em outros bens, a ExxonMobil está apostando na "reciclagem avançada". Essa tecnologia, segundo a empresa, "converte os resíduos plásticos de volta em blocos de construção molecular", o que significa que eles se tornam a matéria-prima para novos produtos.

A empresa afirma ter usado a reciclagem avançada para "processar mais de 60 milhões de libras [aproximadamente 27 mil toneladas] de resíduos plásticos em matérias-primas utilizáveis, mantendo-os fora dos aterros sanitários". E poucas semanas depois que a Califórnia entrou com a ação, a ExxonMobil anunciou que estava expandindo sua capacidade.

Mas a denúncia da procuradoria californiana, que se baseia em dois anos de investigação, diz que mesmo no "melhor cenário possível" da ExxonMobil, a reciclagem avançada será responsável por uma pequena fração do plástico que a empresa continua a produzir. E, portanto, "nada mais é do que um golpe de relações públicas destinado a incentivar o público a continuar comprando plásticos de uso único que estão alimentando a crise da poluição por plásticos".

Adam Herriott, especialista sênior da ONG de ação ambiental global WRAP, afirma que, devido à sua posição no início da cadeia de suprimentos de plástico, as empresas de combustíveis fósseis "afetam significativamente o volume de plástico que entra no mercado" e que "ao participar ativamente dos esforços para reduzir a produção de plástico virgem, elas podem ajudar a promover mudanças sistêmicas".

No entanto, assim como outras importantes empresas de combustíveis fósseis, petroquímicas e de bens de consumo de alta rotatividade, a ExxonMobil é membro da Alliance to End Plastic Waste (AEPW), uma organização global independente e sem fins lucrativos, que trabalha para lidar com o plástico depois que ele se torna resíduo, em vez de abordar o problema por meio da redução da produção.

Em um e-mail enviado à DW, Louise Lam, gerente de comunicações corporativas da AEPW, disse que seu mandato se concentra principalmente no desenvolvimento de "soluções que apoiem a coleta, a classificação e a reciclagem de resíduos plásticos para promover uma economia circular para o plástico". Lam acrescentou que a AEPW acredita que "é a soma do trabalho das várias partes interessadas – de soluções 'upstream' a 'downstream' – que ajudará a resolver o desafio".

Há muita coisa em jogo no caso da Califórnia contra a ExxonMobil. Além de definir se a empresa será condenada a atender às exigências da procuradoria, que incluem reparações financeiras, e se deixará de fazer alegações enganosas, o processo pode criar precedente e levar outras empresas de combustíveis fósseis para os tribunais.

Patrick Boyle, advogado de responsabilidade corporativa da CIEL, diz que espera ver mais casos desse tipo nos Estados Unidos, e até mesmo em outros países, porque as provas e os depoimentos apresentados no contexto do processo da Exxon – que provavelmente se desenrolará ao longo de alguns anos – se tornarão registros públicos.

Mesmo que um caso não pareça exatamente com esse litígio contra a Exxon, com essas alegações específicas, as evidências coletadas podem ser aproveitadas no futuro para combater outros casos relacionados a questões como microplásticos, lavagem verde ou licenças para reciclagem avançada, afirma Boyle.

"Portanto, acho que há muitas conversas e 'brainstormings' realmente interessantes a serem realizados e iniciados com parceiros para ver como podemos aproveitar o que obtemos aqui, no contexto internacional."

Enquanto isso, Levi Alvares diz que a queixa contra a Exxon está fortalecendo o entendimento de que os resíduos plásticos são um problema "criado pela indústria".

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