segunda-feira, 9 de setembro de 2024

A leveza do ser já era

Como o silêncio não entra na prioridade das políticas públicas, os ônibus continuam fazendo seu barulho metálico nas ruas. Aliás, quais seriam essas prioridades? Ninguém discute. O que vemos por aí são candidatos vestidos da antipolítica agarrados a um humor de baixo nível, o que parece fundamental para angariar votos. Saudades do macaco Tião, voto de protesto, sim, mas incapaz de entregar a coroa aos patifes que a querem só para si.


Atualmente, novos patifes. Ou canalhas. Gosto tanto desta palavra. Salve Nelson Rodrigues, um de seus cultuadores. Volto ao raciocínio. Os novos canalhas não querem apenas roubar o erário, mas, em nome – e só em nome – de não roubar, anseiam destruir o que é público. E por razão nenhuma. Quer dizer, alguns candidatos não têm a menor ideia do que querem. São eficientes em manipular o mundo virtual, embora ideologicamente não passem de títeres em mãos para lá de gananciosas e poderosas. E só. O presidente anterior foi o que foi, um desastre. Mas isso não parece depor contra ele e seus seguidores amestrados. A cidade de São Paulo corre o risco de ser entregue a um sujeito que, na pele de um coach, meteu seus seguidores numa fria, perdidos na floresta. Não fosse o corpo de bombeiro. Mas ele, se chegar à prefeitura, acabará com o corpo de bombeiro. Quer dizer, acabaria, caso fosse de sua alçada. É a turma do incêndio. Dos que aumentarão o subsídio aos que investirem no barulho metálico dos ônibus e promoverão o fim das campanhas de vacinação. Dos que permitirão a volta dos cigarros em ambientes públicos fechados. Tudo em nome de Deus, contra o qual, desconfio, lutam, pois, não sendo nem ateus nem agnósticos, estão na trincheira do diabo.

Disse a uma amiga que sou um cara leve. É verdade, as coisas estão ruindo – pessoal ou socialmente – e estou fazendo graça, fiel à ironia. Aprendi a ser assim. Meu pai e o mundo em torno dele eram assim. Paciência. Mas ultimamente transpus a fronteira. Piso agora o solo do pessimismo (não ainda o do mau humor). Os ônibus continuarão a fazer seu barulho metálico, às nove da manhã, às três da tarde, às dez da noite e, quando passam, em plena madrugada. Que se dane o sono dos justos e dos injustos. O meu, antes tão profundo, hoje com o pé na insônia, não é interrompido pelos ônibus, pelos tiros nas comunidades mais ou menos perto – nas quais, devo confessar, os conflitos não têm sido tão comuns –, pela saída noturna do filho, pela cirurgia que a prima fez, pelos perrengues dos amigos e os meus. O meu sono picotado responde ao fato de minha leveza ter ido para o vinagre, e com ela lá vai indo minha saúde (não se assustem, por enquanto é uma metáfora).

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