O terremoto tirou o chão do presidente Bolsonaro, que desde então está desvairado, sem controle de si e dos acontecimentos, que se sucedem sem que se possa saber aonde nos levarão.
Mas o aftershock, se não tiver o poder de provocar uma denúncia contra Bolsonaro, pela pouca disposição aparente do Procurador-Geral da República Augusto Aras, tem força política para desgastá-lo mais ainda.
Evidente a intenção de Bolsonaro de controlar a Polícia Federal do Rio, e seria óbvio que a investigação dos procuradores de Aras fosse na direção desses interesses, num Estado que é a base eleitoral dos Bolsonaro e tem sérios problemas de segurança pública, de crime organizado e milícias, público alvo da família presidencial em termos eleitorais.
Se o ex-ministro Moro não acusou Bolsonaro de crimes em seu depoimento, eles estão tão evidentes que o próprio Procurador-Geral os elencou quando pediu a abertura do inquérito. Caberia a ele investigar um a um para ver se ocorreram: obstrução de justiça, falsidade ideológica, coação no curso do processo, advocacia administrativa, prevaricação, corrupção passiva.
Na verdade, o único crime de deveria ser descartado seria o de denunciação caluniosa incluído contra Moro. Mas o depoimento é uma bomba política, que só desmoralizará quem não quiser investigar. O presidente Bolsonaro parece saber exatamente o que pode ser descoberto em uma investigação criteriosa, não apenas nesse inquérito, como nos dois outros que correm no Supremo Tribunal Federal (STF), sobre fake news e manifestações antidemocráticas.
A gritaria com que atacou os jornalistas ontem pela manhã na frente do Palácio da Alvorada mostra uma pessoa completamente desesperada, sem noção do que sejam instituições, nem a real separação de poderes e o papel de cada um deles. Não admite que o STF tenha a palavra final, mas tem. Descontrolado, conta com a leniência de militares inclusive da ativa, que trabalham com ele.
Toda vez que passa dos limites, o ministério da Defesa dá uma nota oficial colocando as coisas no seu devido lugar, mas sendo condescendente com o presidente, considerando que as manifestações são atividades políticas, e a livre expressão tem que ser protegida.
Mas não se pode proteger quem pede o fim da democracia. Isso não é política, é tentativa de golpe. Assim como a lei não deixa defender o nazismo em praça pública, não se pode defender intervenção militar.
Certos grupos militares têm tanto medo do comunismo que aceitam a ideia de que a atuação de Bolsonaro é no sentido de enfrentar comunistas, para não deixar o PT voltar ao poder, e assim vamos indo a uma situação limite.
Vai chegar o dia em que as notas oficiais dos militares serão dispensáveis, por não terem efeito prático no comportamento do presidente Bolsonaro. Não vejo no mundo ambiente para um golpe militar tradicional, mas constato que Bolsonaro está constrangendo os poderes que o limitam, com a compreensão de militares.
Tudo o que o Congresso faz é contra ele, no STF a mesma coisa. A imprensa profissional independente virou saco de pancadas de Bolsonaro e seu acólitos. Temo que Bolsonaro esteja indo para um caminho tipo Chavez na Venezuela, não botando tanque na rua, mas tentando controlar o STF, o Congresso e a imprensa.
Está cooptando o centrão, com métodos que já se mostraram prejudiciais ao país e à democracia, para tentar eleger o próximo presidente da Câmara ano que vem, na substituição de Rodrigo Maia, que tem sido um garantidor da independência da Câmara.
Se conseguir, unindo o centrão e outros que certamente aderirão - porque o poder atrai - pode controlar a Câmara pelos métodos da velha política. O presidente do STF, Dias Toffoli tem uma posição muito conciliadora com ele. Com a desculpa de querer agregar, fazer acordo para preservar a “governabilidade”, vai aceitando os avanços de Bolsonaro, que já cometeu crimes suficientes para ser impedido. Impeachment é solução democrática para evitar um autogolpe.
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