P. O senhor recebeu pressão no partido para continuar a obra?O trecho acima é de uma entrevista do ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), ao jornal O Estado de S. Paulo na quinta-feira. Haddad comenta com o repórter o pedido de investigação de sua campanha de 2012, acusada de receber caixa 2 da Odebrecht a pedido de Lula, segundo delatores da empresa. Nas entrelinhas, Haddad disse que, se aconteceu, foi via diretório nacional do PT, ao qual ele não tem controle.
R. Não, mas todo mundo ficou... Sou tratado como um cara exótico.
Antes que comece o festival de relativismo, o argumento aqui não é defender que apenas alguns, seletivamente, ajoelhem no milho. Para ficar apenas entre eminentes políticos com berço na USP, Fernando Henrique Cardoso, o ex-presidente tucano, há semanas lançou que caixa 2 não é um crime como os outros, como quem diz que é preciso separar o joio do joio enquanto seus companheiros de partido, Geraldo Alckmin, José Serra e Aécio Neves protagonizam novas denúncias. Depois que Emilio Odebrecht falou assim, por alto, que houve caixa 2 para sua campanha presidencial, FHC gravou um vídeo pedindo colocar "as cartas na mesa", enquanto a Folha de S. Paulo noticia tratativas, das quais ele faria parte, para um acordão que incluiria anistia do caixa 2 e manter a elegibilidade de Lula.
Pois bem, as cartas estão na mesa e o jogo é desesperador. É tanto cinismo junto que dá uma espécie de vertigem. "Se não for o acordão, serão os aventureiros", é o que gritam os defensores do acerto, em espécie de chantagem. E então desce pesada uma nuvem de desânimo para quem não quer se redimir a esse binarismo barato, mas acredita na clássica máxima política de que não há vácuo de poder.
Nunca antes na história desse país vimos a enxurrada de aulas de corrupção, de business as usual, de didatismo sobre o mecanismo de pressão de grandes doadores na política. A Odebrecht, diga-se, cai em desgraça quando já havia perdido o posto de maior doadora universal - na campanha de 2014, a vencedora foi a “campeã nacional” da carne JBS. Vamos esperar o próximo escândalo? Porque há exemplos de sobra. A Odebrecht, que agora reencarnada como moralizadora-delatora se arvora até mesmo a dar lição de moral na imprensa por se chocar com a corrupção, foi ela mesma protagonista e sobrevivente de vários escândalos, um dos mais célebres o dos Anões do Orçamento em 1992. É especialmente chocante ver que, enquanto o processo do mensalão se desenrolava, o PT e grande parte do sistema político faziam os acertos de sempre para receber contribuições de campanha via caixa 2 e venda de legislação, segundo os delatores. Então, é a Justiça, até agora, para surpresa de muitos, o único Poder livre dos tentáculos da Odebrecht no relato dos delatores, que vai nos salvar? O temor da cadeia, que nem pode vir com os tempos do STF, que vai melhorar as práticas? Não parece verossímil.
Não se quer jogar na lata do lixo a história e os serviços prestados ao país do PT e do PSDB, mas quem neles será capaz de liderar uma ruptura inequívoca com o show de horrores a que estamos assistindo? Fora deles, quem vai para a rua agora exigir regras de transparência que sejam válidas para a eleição de 2018? Não se ouve nada.
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