O público busca assimilar o conjunto das denúncias, que, por sua extensão e abrangência, exigirá mais tempo para articular os fatos e estabelecer uma hierarquia entre os infratores.
Mas o que já revelam – e se trata apenas de uma entre muitas empreiteiras – estabelece uma pá de cal naquilo que ficou conhecido como Nova República, que, por sua vez, representou a restauração do poder civil, depois de duas décadas de regime militar.
Após 32 anos – e 13 de PT -, políticos e política estão no banco dos réus. Não se conhece momento semelhante na história do país, desde o grito do Ipiranga, em 1822.
Mas as instituições estão no chão, os políticos, em graus variados, sem crédito para seja lá o que for. A própria mídia está incluída. O diferencial dessa crise – e que a torna imprevisível – é o advento das redes sociais, que articula a população, à revelia dos canais clássicos – governos, sindicatos, associações, ONGs.
Nenhum desses segmentos, que promoveram mobilizações históricas anteriores, como as diretas já e o impeachment de Collor, influiu sobre as manifestações que tiraram Dilma Roussef do poder. E são, de longe, as maiores de toda a história.
Enquanto a crise tinha o selo de um partido, o PT, parecia mais fácil administrá-la. Era tirá-lo do poder e promover sua substituição até as eleições do ano que vem. As investigações, porém, mostraram um cenário mais complexo, marcado por ampla cumplicidade. Nenhuma legenda escapou.
O governo Temer mostrou-se parte do problema e mesmo a oposição anterior, que atraiu para sua base de apoio, exibe a marca do contágio moral. Abre-se amplo espaço para incursões aventureiras, embora a população exiba um grau sem precedentes de monitoração dos acontecimentos, em condições de imunizar-se.
No curto e no médio prazos (no longo, todos estaremos mortos), há mais perguntas que respostas. No curto: terá o governo Temer condições de empreender as reformas, que, por serem essenciais, são problemáticas, como a previdenciária, a trabalhista, a política? Ninguém tem uma resposta, embora ninguém negue a necessidade imperiosa de fazê-las.
No médio prazo, pergunta-se: o que será dos atuais partidos, os principais, que infringiram a lei que os regula e que pode levá-los à perda do registro? Se depender da população – e por enquanto não depende -, já vão tarde. Mas aí o que será do país?
Não há democracia sem políticos e sem partidos. E a substituição de uma geração que reina há três décadas não se improvisa. O fato de a principal liderança emergente – o prefeito de São Paulo, João Dória – ser um outsider, há apenas quatro meses na cena pública, evidencia a escassez de quadros e perspectivas.
Em tal contexto, começa a prosperar a ideia de uma Assembleia Nacional Constituinte, defendida por juristas respeitáveis, como Modesto Carvalhosa e o ex-presidente nacional da OAB, Reginaldo de Castro. O pacto social da Nova República esgotou-se.
Defendem, no entanto, uma Constituinte diferente de todas as que a precederam na história republicana: exclusiva, sem partidos e que se autodissolveria com a promulgação da Carta.
Se se repetir o padrão das anteriores, de Congresso Constituinte, as distorções da atual Carta, que, em 29 anos de vigência, já tem 95 emendas e mais de mil outras em tramitação, serão apenas renovadas. É o que sustenta Reginaldo:
“O presente modelo, oligarca, corporativista, cartorial, recheado de privilégios de castas, abrigados sob o guarda-chuva estatal, não será removido de modo algum se a nova ordem constitucional derivar mais uma vez de um Congresso-Constituinte.”
A discussão está aberta. Por enquanto, é a única ideia para enfrentar os efeitos da devastação moral que se abateu sobre a República. A alternativa é continuar investindo na pinguela.
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