sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Política não é profissão

A cláusula de barreira volta a ser discutida. Não por se ter reconhecido que a proliferação de partidos desfigurou o sistema político, em vez de torná-lo mais representativo. O que precisa ser feito, simploriamente, poderá ser concretizado por um motivo pouco nobre: o insaciável apetite dos políticos por dinheiro. Em bom português popular, “farinha pouca, meu pirão primeiro” é a razão pela qual o Congresso vai agir: o Fundo Partidário míngua toda vez que surge um novo partido...

O cardápio da reforma é extenso: cláusula de barreira, fim das coligações proporcionais, inclusão do voto distrital ou misto, fim da reeleição do Executivo. Mas será suficiente para produzir parlamentares éticos, competentes, comprometidos com a causa pública, e não com interesses pessoais ou familiares? Ou, ainda, para evitar a figura do político profissional? Provavelmente, não.

Apoie o fim do político profissional - Leia no blog Sem medo da verdade http://amorimsanguenovo.blogspot.com.br/2015/02/fim-do-politico-profissional.html:
A política fabrica regras direcionadas a garantir mandatos sucessivos. Consequência do pânico de perder uma eleição. Afinal, como pagar as contas depois de tanto tempo longe da profissão? Essas regras produzem, então, jovens eleitos porque integram dinastias políticas, sem nenhuma experiência fora da atividade parlamentar. Ou pessoas de origem humilde que veem na política a possibilidade de ascensão social. Difícil, então, abrir mão dos privilégios que os mandatos concedem, extensivos a parentes e amigos. Isto também acaba induzindo o advogado, o médico, o engenheiro, o comerciante, os autônomos, e todos os outros profissionais, a abandonar bancas, clínicas, lojas e clientes. E, claro, existem os que não podem abrir mão de um mandato simplesmente porque o objetivo único é torná-lo um profícuo e eterno ganha-pão.

Político — é preciso insistir — não é profissão. Quando, recém-eleita vereadora, propus ao prefeito consulta aos moradores antes de indicar o representante numa região, ouvi dele: “A eleição acabou. Agora você pertence ao mundo da política”. Ou seja, tinha de dar um tchau à sociedade civil. Anos depois, um deputado federal se qualificou como parlamentar, como se fosse sua profissão, e teve sua petição devolvida. Entre muitas outras surpresas, ouvi de um colega que, com a segunda reeleição, ele estaria financeiramente independente para atuar com liberdade... Foi assassinado logo depois.

Observem o que acontece agora nas eleições no Rio de Janeiro, retrato do que se passa Brasil afora. Dos dez candidatos a prefeito, oito são parlamentares estaduais ou federais que, não importa o resultado do pleito, não arriscam seus mandatos. Sem entrar no mérito individual, constata-se que campanhas para prefeito, independentemente das chances de vitória, servem, no fundo, para alavancar candidaturas às eleições seguintes.

Como tornar menos atraente a “carreira” política, ou seja, como incentivar os que querem servir ao público por um período, em vez de se servir dele para sempre? Aí vão algumas ideias:

1 — apenas uma reeleição para o mesmo cargo no Legislativo e o fim da reeleição para o Executivo;

2 — perda definitiva do mandato para o parlamentar que optar por atuar no Executivo;

3 — renúncia ao mandato parlamentar para disputar cargo no Executivo;


4 — reforma do regimento interno das casas legislativas, reduzindo o poder ditatorial do presidente sobre os demais parlamentares.

Os políticos rejeitam amarras, mas é preciso enfatizar, sempre, que a busca por uma atividade bem remunerada, pela ascensão social e econômica, pela solução de um interesse pontual e particular não pode ser o indutor da vida política. Infelizmente, é assim que tem sido, com honrosas exceções. Mas o fato é: quem não pode perder uma eleição, não se candidate.

Andrea Gouvêa Vieira 

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