Conforme ensinava o Dr. Ulysses, em política o que predomina é “Sua Excelência, o fato”. Muito debate ainda será feito no meio jurídico a respeito da legalidade, ou da correção técnica, da suspensão do sigilo das investigações que envolvem o ex-presidente Lula e, consequentemente, a divulgação do áudio envolvendo a conversa entre ele e Dilma. Porém, não resta dúvida sobre a gravidade dos fatos. Fatos esses que, em uma conjuntura política tão conturbada, de um modo ou de outro, acabam se impondo mesmo por vício ou erro judicial.
Divulgação de escutas telefônicas, legais ou ilegais, não é novidade no Brasil. Durante o governo Fernando Henrique, uma escuta ilegal acabou derrubando um ministro, o presidente do BNDES, e colocou o próprio Fernando Henrique em uma situação constrangedora, pois também havia sido alvo de gravação.
As gravações que revelam as conversas de Lula e Rui Falcão com a presidente da República e altos escalões do governo dão ensejo à continuidade e ao agravamento de um processo de corrupção institucional que vinha sendo posto em prática desde o estouro do escândalo do mensalão. E qual a natureza desse processo de corrupção? Trata-se, como é sabido, de um projeto de hegemonia política na esteira de uma esquerda arcaica que conta com o aval da “intelectualidade orgânica”.
Nota-se que a presidente da República simplesmente abre mão de seu papel de chefe de Estado para atuar como uma militante clandestina que tenta salvar um companheiro de “cair”. Diante disso, caiu por terra toda a cantilena de que a presidente dispõe da legitimidade de 55 milhões de votos.
Em democracias maduras, os chefes de Estado desfrutam de legitimidade enquanto governam para toda a nação. Não é à toa que, encerrada a apuração, os eleitos se dizem “governantes de todos os cidadãos”. A partir desse momento, não cabe ao chefe de Estado utilizar seu cargo em função de seu partido ou grupo político. Evidentemente, estamos aqui diante de uma fronteira tênue, pois não há uma nítida separação entre a legítima ocupação da máquina governamental para a execução de um programa político que conta com o respaldo das urnas e a utilização dessa mesma máquina para objetivos pontuais ou abrangentes do partido governista.
Embora tênue, tal fronteira não permite, entre outras coisas, a tentativa de alterar o livre funcionamento de outros poderes. A substituição da negociação parlamentar pela compra sistemática de apoio político, condenada na Ação Penal 470, e o áudio que flagra a presidente tentando enviar para Lula o termo de posse para “ser usado em caso de necessidade” demonstram o modus operandi do projeto hegemônico do PT. Para além da controvérsia jurídica, um processo político irreversível está deflagrado. A nação está diante de Sua Excelência, o fato.
Gustavo Müller
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