Inevitavelmente, estes reveses econômicos e suas consequências sociais terão impactos importantes na política. Em alguns países, a deterioração econômica criará oportunidades bem-vindas para a troca de chefes de Estado e de grupos políticos que estão há mais de uma década no poder. Em outros, a má situação econômica nutrirá o conflito social, a paralisação governamental e uma perniciosa instabilidade que, ao mesmo tempo, proporá importantes incógnitas políticas. E muitas surpresas.
A situação na qual um período de grande apogeu econômico é seguido por uma súbita e dolorosa queda da economia não é uma experiência nova para a América Latina. Ao contrário, é um evento recorrente: estatisticamente, esta é a região mais volátil do mundo. Mas o atual episódio no qual um boom foi suplantado por um período de baixo ou nulo crescimento, desvalorização da moeda, mais desemprego, cortes nos gastos públicos e queda na receita das pessoas tem características novas.
Uma dessas novidades é que o apogeu foi mais pronunciado e teve um impacto mais amplo e benéfico sobre os mais pobres. Segundo José Juan Ruiz, economista-chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o crescimento econômico relativamente alto ocorrido durante o período prodigioso se traduziu em mais avanços sociais do que no passado ou do que em outros países emergentes. Antes, o maior crescimento econômico ajudava a melhorar as condições dos que têm menos, mas nunca tanto quanto recentemente. Desta vez, os benefícios do crescimento se disseminaram muito mais. O resultado não só foi menor pobreza, mas algo sem precedentes: durante este período pela primeira vez foram registradas reduções significativas nos altos índices de desigualdade econômica da América Latina.
Os Governos utilizaram a bonança econômica gerada por um ambiente financeiro externo favorável e o aumento dos preços das exportações de matérias-primas e produtos agrícolas para aumentar os gastos sociais e torná-los mais eficientes. Segundo cálculos do BID, entre 2005 e 2012 o gasto público em políticas sociais aumentou a um ritmo que duplicava a taxa de crescimento econômico da região. O gasto social passou de 5% do tamanho da economia a 19%, um recorde histórico.
Graças a tudo isso, durante o período prodigioso a população em situação de pobreza caiu de 34% para 21% e se formou a classe média mais numerosa que já existiu na América Latina. Atualmente, um terço dos latino-americanos pertence à classe média (em 1990 eram 17%). Esta maravilhosa realidade também propõe grandes riscos: uma porcentagem desta nova, ampla, mas ainda economicamente precária classe média está em perigo de deixar de sê-lo. A má situação econômica pode empurrar milhões de latino-americanos a viver de novo em condições de pobreza.
Politicamente, isso é tão inédito quanto explosivo. A reação desta nova classe média, mais numerosa, empoderada, ativada, conectada e com maior capacidade de organização já está criando desafios enormes para os Governos, que devem responder a essa nova e mais difícil situação econômica.
As expectativas e aspirações destes novos membros da classe média são altas e revolucionárias.
Segundo as pesquisas do Latinobarômetro, 45% dos latino-americanos afirmam pertencer à classe média, o dobro dos que respondiam assim há 15 anos. Surpreendentemente, apenas 20% opinam que seu progresso econômico se deve à melhoria da economia do país. Cerca de 32% acreditam que se deva a seu esforço pessoal. Mas talvez o dado mais explosivo é que 50% dos latino-americanos acredita que a melhoria em suas condições de vida é permanente.
Tristemente, logo muitos descobrirão que o aumento em sua receita não é tão permanente nem irreversível como acreditavam. E que seu esforço pessoal não basta para manter as melhores condições de vida que alcançaram nos anos prodigiosos.
É por isso que a América Latina tem anos perigosos pela frente.
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