— É a natureza! — afirmam alguns.
Mas não, não é a natureza. O aquecimento global resulta da ação humana. As mãos criminosas que ateiam incêndios são as mesmas que derrubam florestas, que exploram os recursos até a exaustão, que desregulam a natureza. São as estúpidas mãos da ganância.
Enquanto o Brasil arde, a Europa central, a Ásia e o norte de África enfrentam chuvas torrenciais. No Sudão do Sul quase um milhão de pessoas foram forçadas a abandonar as suas terras, talvez para sempre, pois algumas áreas ficarão submersas por longos anos.
Nenhum lugar do planeta está a salvo. Todos sabemos que a partir de agora cada inverno será mais invernal e cada verão mais infernal. Pior: os dias de inverno podem irromper a qualquer momento, inclusive no pino do verão, e vice-versa.
As diferentes sociedades humanas aprenderam a harmonizar-se com os ciclos da natureza. Nem poderia ser de outra forma. Todas as formas de vida se desenvolveram no rigoroso respeito por esses ciclos.
O caos climático foi criado por nós. Ou conseguimos revertê-lo, ou teremos de nos adaptar. Reverter o aquecimento global será muito difícil, mas podemos pelo menos procurar abrandá-lo enquanto nos adaptamos. O que não pudemos é ignorar o desastre, insistindo na tese de que não passa de um fenômeno natural.
Povos cujas línguas não produziram uma única palavra para exprimir a ideia de tufão ou furacão, agora enfrentam vários todos os anos. Terras que foram sempre férteis e bem irrigadas estão hoje inertes e ressequidas. Florestas que se formaram há centenas de milhares de anos acham-se ameaçadas.
O negacionismo climático não é uma simples e inofensiva divergência política e filosófica; uma teimosia de pessoas desinformadas; um disparate risível, como o terraplanismo. Não: vejo-o como um ato de sabotagem. O negacionista conspira contra o esforço coletivo para enfrentar o apocalipse ambiental.
Comprei e estou reformando um casarão do século XVIII, que une, de forma harmoniosa, a arquitetura tradicional swahili, árabe e portuguesa (terraços magníficos, sustentados por grossas traves de madeira, imensas cisternas, frescos pátios interiores). São assim os edifícios da Ilha de Moçambique, reconhecidos pela Unesco como Patrimônio Mundial. O desafio consiste em respeitar a arquitetura tradicional, e os seus saberes, ao mesmo tempo que deixamos o casarão preparado para resistir a ventos ciclônicos e a chuvas diluvianas.
Contudo, de pouco me servirá preparar o casarão para enfrentar ciclones se o aquecimento global não for interrompido, levando a uma enorme subida do nível do mar. Nesse caso, toda a ilha acabará submersa.
É neste ponto que estamos. Ou nos unimos todos, ou naufragamos todos. Não pode haver tolerância para quem coloca os seus interesses efêmeros acima dos interesses da Humanidade.
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