sexta-feira, 23 de agosto de 2024

A Venezuela de Maduro já é comparada à ditadura de Pinochet

A jornalista venezuelana Ana Carolina Guaita Barreto, repórter do site La Patilla, foi detida há mais de uma semana na região de La Guaira, estado de Vargas, muito próximo a Caracas. Seu paradeiro foi revelado ontem pelo jornalista Vladimir Villegas, ex-embaixador da Venezuela no Brasil, em suas redes sociais. Ana Carolina está, de acordo com Villegas, na sede da Direção de Segurança do governo de La Guaira. Também de acordo com o jornalista venezuelano, o chefe dessa direção, Andrés Goncalvez, disse aos pais de Ana Carolina, ambos dirigentes políticos da oposição que colaboraram com a campanha do candidato presidencial Edmundo González Urrutia, que soltariam sua filha se eles se entregassem.


Xiomara Barreto e Carlos Guaita saíram da Venezuela logo após a eleição presidencial de 28 de julho, fugindo de uma das maiores ondas de repressão do governo de Nicolás Maduro contra opositores, categoria que hoje na Venezuela inclui dirigentes, colaboradores da campanha opositora, militantes de partidos opositores, eleitores da oposição e jornalistas que cobrem atos opositores, entre outros.

Para Maduro e seus aliados civis e militares, qualquer pessoa relacionada à oposição é um potencial risco para o governo, e, em caso de detenção, a acusação é sempre a mesma: terrorismo. Segundo a ONG Foro Penal, entre 28 de julho e 18 de agosto, cerca de 1.503 pessoas foram presas e acusadas de serem terroristas. Ana Carolina é apenas uma dessas pessoas.

A situação na Venezuela em matéria de direitos humanos é crítica. Enquanto os governos de Brasil e Colômbia tentam achar uma saída política para a crise desencadeada após a eleição — tentativa hoje em suspenso, segundo fontes oficiais — Maduro deu sinal verde a uma repressão poucas vezes vista na América Latina após as ditaduras das décadas de 1960, 1970 e 1980. Defensores dos direitos humanos como Marino Alvarado, diretor do Programa Venezuelano de Educação-Ação em Direitos Humanos (Provea), comparam a atuação do governo Maduro com a de ditaduras como a do chileno Augusto Pinochet (1973-1990).

Em entrevista ao programa de rádio de Villegas, o diretor do Provea afirmou que “há um arbitrário e excessivo uso da Lei Antiterrorista. Nenhum detido foi acusado de outro delito e, segundo o governo, temos 2.229 terroristas”. Alvarado mencionou o caso de Ana Carolina e explicou que ele se encaixa no já normalizado modus operandi do “desaparecimento forçado”. Na Venezuela, os detidos passam de dias a anos em paradeiros desconhecidos.

Hoje, ninguém está a salvo na Venezuela. O Aeroporto Internacional de Maiquetía virou, em palavras de um jornalista, “um lugar tóxico, que todos evitamos”. Qualquer venezuelano que não tenha credenciais chavistas teme passar pelo aeroporto porque sabe que, havendo razão ou não, poderá ser detido. Isso soma-se ao cancelamento arbitrário de milhares de passaportes de cidadãos venezuelanos que, caso não tenham uma segunda cidadania, têm como única alternativa sair do país na mala de um carro ou escondidos de alguma outra maneira.

Quando estive em Caracas para cobrir a eleição, conheci convidados internacionais que estavam no país para acompanhar o pleito. Um deles era um ex-ministro do governo de Salvador Allende (1970-1973), presidente chileno que Maduro costuma elogiar em discursos. A Venezuela atual se parece cada vez mais com o Chile de Pinochet, artífice do golpe que derrubou Allende em 11 de setembro de 1973.

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