Seria cômico, se não fosse lamentável e gravíssimo, que Lula decida culpar a imprensa brasileira (!) por, segundo ele, transformar na “Segunda Guerra Mundial” o que seria um processo “normal”.
Fica explícito que, quando não está em ambiente controlado, o presidente não tem nenhuma divergência em relação a seu partido, o PT, que prontamente reconheceu a vitória autoproclamada de Maduro, sem a apresentação dos boletins de urna ou de qualquer comprovação de que os números anunciados pelo cooptado Conselho Nacional Eleitoral (CNE) correspondem à realidade da população que compareceu em massa para votar.
Depois de sua vitória suada contra Jair Bolsonaro, e de denunciar, acertadamente, o 8 de Janeiro como uma tentativa de golpe no Brasil, Lula volta todas as casas no tabuleiro ao demonstrar absoluta falta de compromisso real com a defesa da democracia. Em outras palavras, essa pregação só vale quando o autoritário da vez é identificado pelo presidente e por seu partido com a direita ou a extrema direita, como é o caso de Bolsonaro ou de Donald Trump.
Ao derrapar feio mesmo no script de cautela ensaiada e tardia que o governo montou diante da pantomima chavista, Lula atrela seu mandato e, pior, o Brasil a uma ditadura sanguinária que deixa um rastro de mortes, violações de direitos e miséria na sua luta desesperada por manter o poder pelo poder, sem nenhum projeto visível para resgatar a Venezuela da crise em que ele próprio a mergulhou na sua escalada de terror.
O alinhamento incondicional a um regime que deixou de ter sequer uma plataforma social típica de governos socialistas, como Hugo Chávez e Maduro definem seu bolivarianismo militaresco, mostra quanto a ideologia turva a capacidade de discernimento de Lula e do PT, que preferem colher imenso desgaste doméstico e no front internacional a se dissociar de um tirano.
Assim, por obra e graça apenas do presidente e de sua sigla, sem que a oposição bolsonarista tenha precisado mover uma palha, Lula internaliza uma crise que de forma alguma deveria ser sua, menos ainda do Brasil diante de suas muitas carências urgentes nos campos social, econômico e ambiental.
Faz isso no momento em que sua popularidade vinha melhorando, o que mostra que mesmo o louvado tirocínio político de Lula, que o fez sobreviver a crises políticas e econômicas nos seus mandatos anteriores e, inclusive, renascer nas urnas depois de preso em 2018, está comprometido por uma certa teimosia em reafirmar posições antigas que não encontram mais qualquer respaldo na realidade.
Lula deu a declaração de que está tudo ormal na Venezuela mesmo depois da notícia de que há pelo menos 11 mortos em protestos no país, além da denúncia de perseguição a opositores e a ameaça explícita de Maduro de aprovar novas leis de exceções para se juntar ao seu extenso corolário de medidas ditatoriais.
Foi de improviso? Estava desinformado? Mas não enviou Celso Amorim ao cenário já conflagrado, mesmo com insistentes alertas de que isso seria uma fria? São perguntas simples, que deveriam ser triviais para fazer a um chefe de Estado diante de um cenário tão crítico.
Mas o Itamaraty virou um mero reprodutor de notas burocráticas, o chanceler Mauro Vieira é uma testemunha silente do que Amorim diz a um Lula bastante disposto a ouvir só que foi tudo bem, e o companheiro Maduro está reeleito. Com essa arquitetura, qualquer discurso empolado do brasileiro daqui para a frente louvando a democracia e cobrando déspotas já nasce sem credibilidade.
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